O conjunto dos partidos independentistas da Catalunha reforçaram nas eleições a maioria que já tinham nesta região, apesar de o Partido dos Socialistas da Catalunha ter sido o mais votado. Na Europa é assim. Em África, nomeadamente em Angola, não há independentistas. Os que falam disso (ou de simples autonomia) para Cabinda e para as Lundas são “estrangeiros” e são “suicidados”.
O conjunto dos partidos independentistas da Catalunha reforçaram nas eleições de ontem a maioria que já tinham nesta região espanhola, apesar de o Partido dos Socialistas da Catalunha (PSC-PSOE) ter sido o mais votado. O PSC é o partido mais votado com 23% e 33 deputados eleitos para o parlamento regional.
No entanto, o conjunto dos partidos separatistas que apoiam a actual solução governativa na região conseguem mais do que a metade dos 135 lugares na assembleia.
O segundo partido mais votado é a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC, independentista) que tem 21,3% dos votos e 33 deputados, ficando desta vez à frente do Juntos pela Catalunha (JxC, independentista), do antigo presidente Carles Puigdemont, fugido actualmente na Bélgica, que obteve 20% e 32 lugares.
A extrema-direita espanhola do Vox aparece em quarto lugar com 7,6% e 11 deputados, seguida dos independentistas da Candidatura de Unidade Popular (CUP, extrema-esquerda) com 6,7% e nove deputados e o partido de extrema-esquerda En Comú Podem (associado ao Podemos) com 6,9% e oito deputados.
O grande perdedor das eleições é o Cidadãos (direita-liberal), que nas eleições de 2017 concentrou o voto útil dos constitucionalistas (pela união de Espanha) que agora fugiu para o PSC, e desceu de 25,3% para de 5,5% e de 36 para apenas seis deputados. Por último, o Partido Popular (PP, direita) obteve 3,8% e três lugares no novo parlamento regional.
A taxa de participação nestas eleições baixou mais de 25 pontos percentuais tendo sido agora cerca de 53% dos votos.
Catalunha, Cabinda e muito mais
O ex-primeiro-ministro espanhol, Felipe González, dividiu o PSOE depois de se ter mostrado a favor de uma reformulação na Constituição que permita que a Catalunha seja reconhecida como uma nação independente.
Mas terá Cabinda similitudes com a Catalunha, com Timor-Leste ou com o Kosovo? Claro que tem.
Embora a comunidade internacional (CPLP, União Europeia, ONU, União Africana) assobie para o lado, o problema de Cabinda (assim como o das Lundas) existe e não é por não se falar dele que ele deixa de existir. Muito menos deixa de existir porque o regime do MPLA diz que ele não existe.
Cabinda é um território ocupado por Angola e nem o potência ocupante como a que o administrou pensaram, ou pensam, em fazer um referendo para saber o que os cabindas querem. Seja como for, o direito de escolha do povo não prescreve, não pode prescrever, mesmo quando o importante é apenas o petróleo.
É claro que tanto Angola como Portugal apenas olham para Cabinda como um negócio altamente rentável. Se o território fosse um deserto, certamente já seria independente. Mas, ao contrário das teses de Luanda e Lisboa, Cabinda não é só petróleo. É sobretudo gente, pessoas, povo, história e cultura.
Quando o governo português reconheceu formalmente a independência do Kosovo, o seu então ministro dos Negócios Estrangeiros, o socialista Luís Amado, justificou que “é do interesse do Estado português proceder ao reconhecimento do Kosovo”.
E se é no interesse do Estado português… está tudo dito. Esperemos que, neste contexto, Cabinda continue a dizer da forma que achar mais apropriada ao governo das ocidentais praias lusitanas que fazem fronteira com um país onde existe o País Basco, onde existe a Catalunha, que, se calhar, era do seu interesse olhar para este território ocupado por Angola e onde, recordam-se?, já estiveram norte-americanos a explorar petróleo guardados por cubanos.
O ministro português apontou então quatro razões que levaram à tomada de decisão sobre o Kosovo: a primeira das quais foi “a situação de facto”, uma vez que, depois da independência ter sido reconhecida por um total de 47 países, 21 deles membros da União Europeia e 21 membros da NATO, “é convicção do governo português que a independência do Kosovo se tornou um facto irreversível e não se vislumbra qualquer outro tipo de solução realista”.
Deve ter sido o mesmo princípio que, em 1975, levou o Governo de Lisboa a reconhecer o MPLA como legítimo e único governo de Angola, embora tenha assinado acordos com a FNLA e a UNITA.
Como segunda razão, Luís Amado referiu que “o problema é político e não jurídico”, afirmando que “o direito não pode por si só resolver uma questão com a densidade histórica e política desta”. Luís Amado sublinhou, no entanto, que “não sendo um problema jurídico tem uma dimensão jurídica de enorme complexidade”, pelo que “o governo português sempre apoiou a intenção sérvia de apresentar a questão ao Tribunal Internacional de Justiça das Nações Unidas”.
Ora aí está. Cabinda (se é que os governantes portugueses sabem alguma coisa sobre o assunto) também é um problema político e não jurídico, “embora tenha uma dimensão jurídica de enorme complexidade”.
“O reforço da responsabilidade da União Europeia”, foi a terceira razão apontada pelo chefe da diplomacia portuguesa. Luís Amado considerou que a situação nos Balcãs “é um problema europeu e a UE tem de assumir um papel muito destacado”, referindo igualmente que a assinatura de acordos de associação com a Bósnia, o Montenegro e a Sérvia “acentuou muito nos últimos meses a perspectiva europeia de toda a região”.
No caso de Cabinda, a União Europeia nada tem a ver. Tem, no entanto, a CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa) onde – desculpem se é engano – Portugal desempenha um papel importante.
O ministro português frisou ainda que Portugal, ao contrário dos restantes países da UE que não reconheceram o Kosovo, não tem problemas internos que justificassem as reticências. Pois. Os que tinha (Cabinda é, pelo menos de jure, um problema português) varreu-os para debaixo do tapete.
Como última razão, indicou a “mudança de contexto geopolítico que entretanto se verificou” com o conflito entre a Rússia e a Geórgia e a declaração de independência das regiões georgianas separatistas da Abkházia e da Ossétia do Sul que Moscovo reconheceu entretanto.
Isto quer dizer que, segundo Lisboa, no actual contexto geopolítico, Cabinda é Angola. Amanhã, mudando o contexto geopolítico, Portugal pensará de forma diferente. Ou seja, a coerência é feita ao sabor do acaso, dos interesses unilaterais.
Comparativamente a Timor-Leste que, depois do abandono de Portugal se tornou numa província indonésia, o regime angolano nunca aceitará de livre vontade um referendo, similar – por exemplo – ao timorense porque sabe que a opção “independência” também teria de ser colocada e que, nesse caso, certamente seria a opção escolhida.
Tal como nunca o regime de Salazar aceitou referendar o futuro de Angola, colónia ou província, porque sabia que maioritariamente os naturais e residentes optariam pela independência.
Folha 8 com Lusa