O Presidente angolano (não nominalmente eleito) João Lourenço abordou com o secretário-geral da Organização das Nações Unidas, António Guterres, a situação de segurança na Região dos Grandes Lagos, com destaque para a República Centro-Africana (RCA).
O chefe do executivo angolano, presidente em exercício da Conferência Internacional da Região dos Grandes Lagos (CIRGL), e o mais alto dirigente da Organização das Nações Unidas (ONU), que se recandidata a segundo mandato, falaram ao telefone, segundo uma nota da Secretaria para os Assuntos de Comunicação Institucional e Imprensa do Presidente da República.
A conversa entre os dois líderes surgiu um dia depois da morte de dois soldados das forças de manutenção da paz das Nações Unidas na RCA durante um ataque naquele país, informou a organização.
A República Centro-Africana, rica em minerais, enfrenta, desde 2013 uma onda de ataques inter-religiosos e intercomunitários e a violência intensificou-se, na sequência das recentes eleições presidenciais.
Portugal tem actualmente na RCA 243 militares, dos quais 188 integram a missão da ONU (Minusca) e 55 participam na missão de treino da União Europeia (EUTM), liderada por Portugal, pelo brigadeiro general Neves de Abreu, até Setembro de 2021.
Angola assumiu em Novembro do ano passado, pela segunda vez, a presidência rotativa, por dois anos, da CIRGL, mandato que será marcado por um trabalho conjunto para erradicar grupos armados, disse, na altura, o Presidente João Lourenço.
O chefe de Estado, que discursava no final da 8.ª cimeira da CIRGL, realizada por videoconferência, disse ainda que o mandato ficará marcado por fazer respeitar os acordos de paz concluídos na região e trabalhar para o levantamento das sanções impostas contra o Burundi, bem como o combate ao inimigo comum, à Covid-19.
A CIRGL é integrada por Angola, Burundi, República do Congo, República Democrática do Congo, República Centro-Africana, Ruanda, Sudão, Sudão do Sul, Tanzânia, Uganda e Zâmbia.
O actual secretário-geral da ONU, António Guterres, anunciou junto das Nações Unidas a sua candidatura para um segundo mandato de cinco anos para o período de 2022-2026, revelou no passado dia 11 o seu porta-voz, Stéphane Dujarric.
António Guterres indicou à presidência da Assembleia-Geral e do Conselho de Segurança que estava “disponível para um segundo mandato como secretário-geral das Nações Unidas, se essa for a vontade dos Estados-membros”, afirmou o porta-voz durante uma conferência de imprensa.
António Guterres, de 71 anos, assumiu o cargo de secretário-geral da ONU em Janeiro de 2017 para cumprir um mandato de cinco anos, que termina no final deste ano.
“O secretário-geral estará nas mãos dos Estados-membros durante o processo e irá ao encontro de quaisquer expectativas expressas pela Assembleia-Geral da ONU, aberto a sessões de perguntas”, referiu Stéphane Dujarric, acrescentando: “António Guterres é o candidato, mas quem organiza o processo deverá prestar mais declarações”.
Foi, entretanto, divulgado que o presidente da Assembleia-Geral da ONU, o diplomata turco Volkan Bozkir, falou com o presidente do Conselho de Segurança (cuja presidência rotativa é assegurada este mês pela Tunísia) sobre os próximos passos para a eleição.
Segundo o porta-voz do presidente da Assembleia-Geral, Brenden Varma, ainda “é prematuro falar sobre o processo”, porque falta saber se existirão outras candidaturas ao cargo.
Brenden Varma referiu que existiram alterações no processo de selecção do secretário-geral, no sentido de uma maior abertura e transparência, e que este ano será a primeira vez em que um secretário-geral incumbente participa neste novo processo de transparência.
De acordo com os dois diplomatas citados pela Bloomberg, Guterres transmitiu aos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (o órgão máximo das Nações Unidas por ter a capacidade de fazer aprovar resoluções com carácter vinculativo) – Estados Unidos, Rússia, França, Reino Unido e China -, que gostaria de cumprir um segundo mandato no cargo.
Segundo os mesmos diplomatas, Guterres, que conseguiu evitar a intolerância do Presidente norte-americano cessante, Donald Trump, abstendo-se de o criticar em público, quis esperar pelos resultados das eleições presidenciais dos Estados Unidos, em Novembro passado, que deram a vitória ao democrata Joe Biden, antes de tomar uma decisão.
A administração Trump entrou várias vezes em confronto com a ONU e as suas organizações, renunciando mesmo à Organização Mundial da Saúde (OMS) e irritando os membros do Conselho de Segurança quando se retirou unilateralmente e tentou acabar com o acordo nuclear assinado em 2015 com o Irão.
O Presidente eleito, que hoje toma posse, Joe Biden, prometeu, no entanto, reverter a abordagem dos Estados Unidos, regressando à OMS e ao acordo com o Irão, bem como ao Acordo de Paris sobre as Alterações Climáticas.
Durante o seu mandato, Guterres fez da questão das alterações climáticas a sua prioridade, pressionando os países a aumentar os compromissos para reduzir as emissões de carbono.
A administração de Biden sinalizou que o clima será uma das principais prioridades e o nome escolhido para ser a nova embaixadora dos EUA junto da ONU, Linda Thomas-Greenfield, é uma diplomata experiente.
Em 24 de Novembro, a futura embaixadora afirmou que “o multilateralismo estava de volta”, prometendo reverter o isolacionismo da administração de Donald Trump.
Guterres, ex-primeiro-ministro português e ex-Alto Comissário da ONU para os Refugiados, foi aclamado pelos 193 Estados-membros da Assembleia-Geral para o cargo de secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) a 13 de Outubro de 2016, após uma importante e determinante recomendação do Conselho de Segurança adoptada a 6 de Outubro.
Poucos meses depois, em Janeiro de 2017, Guterres, o primeiro português a alcançar um cargo desta dimensão mundial, sucedia ao sul-coreano Ban Ki-moon (2007-2016) e tornava-se no nono secretário-geral da ONU para um mandato de cinco anos, até 31 de Dezembro de 2021.
Todos os dias são de… corrupção
No dia 9 de Dezembro, Dia Internacional contra a Corrupção, em mensagem sobre a data, o secretário-geral da ONU, António Guterres, lembrou que, nos últimos anos, “a raiva e a frustração explodiram contra líderes e governos corruptos.” Estaria, eventualmente, a incluir nesses líderes os que o apoiaram na candidatura ao cargo que ocupa e que o apoiarão na recandidatura?
Em alguns países, as pessoas têm exigido justiça social e responsabilização. Segundo o chefe da ONU, “no meio dessas profundas preocupações, a crise da Covid-19 cria oportunidades adicionais para a corrupção.” E quando não é a Covid-19 é o petróleo, os diamantes, a ambição desmedida dos governantes que não ocupam os cargos para servir mas, isso sim, para se servirem.
António Guterres diz que os governos estão a fazer o que deviam para colocar as economias de volta aos trilhos, prestar apoio de emergência e adquirir suprimentos médicos, mas avisou que “a supervisão pode ser mais fraca.”
Respostas urgentes levaram alguns Estados a comprometer a conformidade, a supervisão e a responsabilização para obter um impacto rápido. Além disso, o desenvolvimento de vacinas e tratamentos aumenta o risco de suborno e lucros abusivos. E se isto é mesmo verdade, Angola (MPLA) estará na primeira linha.
Segundo o secretário-geral da ONU, a corrupção drena os recursos das pessoas, mina a confiança nas instituições, agrava as vastas desigualdades expostas pelo vírus e impede uma recuperação forte, acrescentando que o mundo não pode “permitir que fundos de estímulo e recursos vitais de emergência sejam desviados.”
Para o secretário-geral da ONU, a recuperação da pandemia deve incluir medidas para prevenir e combater a corrupção e o suborno. Por cá isso não é exequível. A pandemia é uma coisa, a corrupção e subornos são outra. E o Governo não consegue fazer duas coisas ao mesmo tempo. Já para fazer uma só é o que se sabe…
Também são necessárias amplas parcerias para fortalecer a supervisão, responsabilização e transparência, com base nas ferramentas globais anticorrupção fornecidas pelas Convenções das Nações Unidas contra a Corrupção.
António Guterres afirmou que a acção contra este problema deve fazer parte de reformas e iniciativas nacionais e internacionais mais amplas para fortalecer a boa governança, combater fluxos financeiros ilícitos e paraísos fiscais e devolver activos roubados, de acordo com os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.
António Guterres enfatiza que a redução dos riscos de má gestão e corrupção durante a pandemia requer o envolvimento de órgãos anticorrupção fortes. Outras medidas são melhor supervisão dos pacotes de apoio de emergência, contratos públicos mais abertos e transparentes e maior conformidade anticorrupção no sector privado. Ou seja, tudo o que Angola faz ao contrário.
Além disso, os países também precisam “garantir o apoio e a protecção para denunciantes e jornalistas que descobrirem corrupção durante a pandemia”. Como em Angola o Governo só considera que são jornalistas os que assinam os comunicados do MPLA…
Segundo o secretário-geral da ONU, a comunidade internacional também deve aproveitar a oportunidade para realizar reformas e iniciativas ambiciosas na sequência da primeira sessão especial da Assembleia Geral contra a corrupção em 2021.
Para terminar, o secretário-geral pediu que todos, governos, empresas, sociedade civil e partes interessadas, trabalhem juntos para “promover a responsabilização e acabar com a corrupção e o suborno por um mundo mais justo e equilibrado”.
No dia 21 de Setembro de 2016, o antigo primeiro-ministro de Portugal agradeceu o apoio de Angola à sua candidatura ao cargo de secretário-geral das Nações Unidas, elogiando (era uma parte do preço a pagar pelo apoio) o papel do país no contexto internacional. Presume-se que, nessa altura, o país nada tinha a ver com corrupção…
António Guterres, que foi igualmente alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados, falava na altura à rádio pública angolana, sobre o apoio de Angola, salientando que tem sido “um instrumento muito importante” para que tenha possibilidades de vencer.
“Gostaria de exprimir toda a minha gratidão e o meu apreço pelo que tem sido a posição do Presidente José Eduardo dos Santos, do Governo e povo de Angola, a solidariedade angolana tem calado muito fundo no meu coração”, referiu Guterres mostrando que, afinal, bajular é uma questão genética em (quase) todos os socialistas – e não só – portugueses.
Em Março desse ano, o Presidente José Eduardo dos Santos recebeu em audiência, em Luanda, o candidato português à sucessão de Ban Ki-moon.
“Agora compete aos Estados-membros, entre os quais Angola, decidir, mas não queria deixar de exprimir esta grande gratidão em relação à posição angolana, que calou muito fundo no meu coração”, realçou Guterres.
Pela voz do então ministro dos Negócios Estrangeiros, Georges Chikoti, Angola disse que “esta eleição é muito importante para África, para a CPLP, para Angola e para a comunidade internacional em geral. O engenheiro Guterres tem sido um lutador incansável pelas causas importantes da comunidade internacional, em particular dos refugiados”.
Chikoti acrescentou: “Temos a certeza que nessa qualidade (secretário-geral) ele vai olhar muito para África e para Angola em particular, queremos esperar que ele consiga promover alguns quadros importantes do continente africano, particularmente da lusofonia”.
Enquanto candidato e por necessidade material de recolher apoios, António Guterres confundiu deliberadamente Angola com o regime, parecendo (sejamos optimistas) esquecer que, por cá, existiam (como continuam a existir) angolanos a morrer todos os dias de fome, que ainda temos um dos regimes mais corruptos do mundo e que somos um dos países com um dos maiores índices mundial de mortalidade infantil.
Na sua última visita a Angola, António Guterres disse que, “por Angola estar envolvida em actividades internacionais extremamente relevantes, vejo-me na obrigação de transmitir pessoalmente essa pretensão às autoridades angolanas”.
Pois é. Esteve até no Conselho de Segurança da ONU. E, pelos vistos, isso basta. O facto – repita-se todas as vezes que for preciso – de ter na altura desde 1979 um Presidente da República nunca nominalmente eleito, de ser um dos países mais corruptos do mundo, de ser o país onde morrem mais crianças… foi irrelevante.
“Naturalmente como velho amigo deste país, senti que era meu dever, no momento em que anunciei a minha candidatura a secretário-geral das Nações Unidas, vir o mais depressa possível para poder transmitir essa intenção as autoridades angolanas”, sublinhou António Guterres.
Guterres tinha razão. É um velho amigo do regime. Mas confundir isso com ser amigo de Angola e dos angolanos é, mais ou menos, como confundir o Oceanário de Lisboa com o oceano Atlântico. Seja como for, confirmou-se que a bajulação continua a ser uma boa estratégia. Nesse sentido, António Guterres não se importou de continuar a considerar José Eduardo dos Santos como um ditador… bom.
António Guterres sabe que todos os dias, a todas as horas, a todos os minutos há angolanos que morrem de barriga vazia e que 70% da população passa fome; que 45% das crianças angolanas sofrem de má nutrição crónica, e que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos; que no “ranking” que analisa a corrupção, Angola está entre os primeiros, tal como sabe que a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos e que o silêncio de muitos, ou omissão, deve-se à coacção e às ameaças do partido que está no poder desde 1975.
António Guterres também sabe que o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder; que ser amigo de quem está no poder é fácil e por norma rende muito.
Seja como for, António Guterres não deve gozar com a nossa chipala nem fazer de todos nós uns matumbos.