O gabinete de estudos económicos do Banco Fomento Angola (BFA) alertou hoje que a situação financeira do país é “tão desastrosa” que vai obrigar à reestruturação da dívida, a mais consolidação orçamental e a depreciação adicional da moeda. O cenário é de tsunami e as vítimas vão ser, como sempre foram ao longos dos últimos 45 anos, os escravos autóctones do regime do MPLA que só se preocupa com os poucos que têm milhões, esquecendo os milhões que têm pouco ou… nada.
“O s problemas de Angola em 2020 são tão desastrosos que nenhuma das soluções [financeiras] será suficiente individualmente; uma consolidação adicional da despesa é necessária, mas a retirada de 1,5 mil milhões de dólares [1,3 mil milhões de euros] do Fundo Soberano é fundamental para a liquidez este ano”, lê-se numa análise à economia angolana.
“Mais empréstimos multilaterais podem garantir mais 1,5 mil milhões de dólares este ano, mas a diferença a ser coberta ainda é muito maior, por isso uma parte significativa da dívida externa a ser paga este ano (8 mil milhões de dólares, 7,1 mil milhões de euros) tem de ser reestruturada”, defende-se na análise.
No documento, que aponta as graves fragilidades das finanças públicas (para não se dizer o estado moribundo ) no seguimento da descida dos preços do petróleo e do impacto da pandemia da Covid-19, os analistas do BFA vincam que “a queda nas importações resultante da enorme descida na actividade económica vai ajudar a equilibrar as contas, mas uma depreciação adicional da moeda será necessária”.
O documento detalha que “o impacto na balança de pagamentos, se nenhuma medida tivesse sido tomada, podia ser superior a 8 mil milhões de dólares, em queda de receitas petrolíferas, dívida não emitida e queda das importações”.
Isto traduz-se, apontam, “numa verdadeira crise da balança de pagamentos”, alertando ainda que “as reservas internacionais podem possivelmente ser anuladas num período relativamente curto, ou então acontecerá o ‘default’ [Incumprimento Financeiro]”.
Na análise, o gabinete de estudos económicos do BFA pormenoriza que “uma parte significativa do problema continua por resolver”, mas ressalva que “o país não vai necessariamente ter de alcançar um equilíbrio nas contas externas este ano”.
Ainda assim, salienta, “é preciso suavizar o choque o mais possível”, pelo que “parte da solução pode vir da renegociação da dívida externa, o que está certamente em curso, pelo menos relativamente aos credores a quem são devidos pagamentos este ano”.
Além da renegociação da dívida, que o Presidente João Lourenço confirmou na semana passada estar em curso, o BFA diz que “há uma grande probabilidade de obtenção de fundos adicionais por parte de instituições multilaterais com o Banco Africano de Desenvolvimento, o Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional, para um total de entre 1 e 1,5 mil milhões de dólares”.
Certo é que, concluem, “quanto maior for o desequilíbrio das contas externas, maior o ajustamento terá de ser, seja através da depreciação livre da moeda, seja através da imposição de maiores restrições nas importações e na saída de moeda externa”.
Governo não faz nem deixa fazer
Na altura da terceira tranche de apoio do FMI, o fantasma do incumprimento financeiro devido ao elevado nível de pagamentos de dívida e à forte dependência das receitas petrolíferas, estacionou com armas e bagagens em Luanda.
Depois de Angola não ter conseguido cumprir vários das metas do Programa de Financiamento Ampliado (PFI) do Fundo Monetário Internacional, o FMI concordou com novos objectivos. O calendário foi alterado e novas metas foram definidas, destinadas a apoiar a consolidação e a transparência, e para apoiar a reestruturação do sector financeiro.
O nível de dívida pública estava na altura nos 90,1% do PIB, quando foi de 35% em 2013, e o serviço da dívida representava 56,8% da despesa total prevista no Orçamento para 2020. Chegaram então diversos avisos ao governo: “Uma gestão cuidadosa deste portefólio e dos futuros financiamentos da dívida serão críticos se Angola quiser evitar um nível ainda mais oneroso de dívida ou o risco de incumprimento financeiro”.
No princípio de Dezembro de 2019, o FMI alertou que “a dívida de Angola permanece sustentável, mas o rácio da dívida pública face ao Produto Interno Bruto aumentou substancialmente, e os já de si elevados riscos subiram ainda mais”, estimando um rácio de 111% face ao PIB, que deveria descer para cerca de 70% até final do programa de ajustamento, em 2024.
A dívida angolana continua altamente vulnerável a choques macroeconómicos e orçamentais, com os principais riscos para a sustentabilidade da divida a virem de uma depreciação da taxa de câmbio mais rápida que o previsto, mais declínios nos preços ou na produção petrolífera, deterioração no acesso aos mercados financeiros e materialização de riscos vários, incluindo de dívida garantida pelo Estado.
Até chegar ao Poder, João Lourenço (como todo o MPLA) tinha um inimigo que lhe tirava o sono, mesmo não passando de um fantasma: Jonas Savimbi. No entanto, descobriu que – pelo sim e pelo não – era urgente encontrar um (ou mais) bode expiatório vivo para os sucessivos fracassos, para a descoberta de muitos dos seus telhados de vidro, para justificar junto do Povo, mas sobretudo da comunidade internacional que lhe empresta milhões, a razão pela qual a montanha só pare ratos.
E então quem melhor do que a família Dos Santos (que ele próprio reverenciava num paradigmático culto canino) para “desempenhar” esse papel? Sendo o patriarca já um ancião, João Lourenço elegeu os seus filhos, dando especial relevo a Isabel dos Santos que, mais a nível internacional, tem demonstrado que o rei vai nu e que quem nasce lussengue nunca chegará a ser jacaré… por muitos esteróides anabolizantes que lhe injectem.
João Lourenço passou a contar com novos aliados na sua suposta senda de justiceiro. Todos (ou quase) os que criticaram (desculpem a imodéstia, mas nesta matéria de críticas o Folha 8 está no pódio e mantém-se onde sempre esteve) José Eduardo dos Santos por décadas de actividades cleptocráticas estão agora rendidos a João Lourenço. Para estes, quem roubou uma vez é ladrão para sempre, e quem ficou a proteger o ladrão é um herói. E no rol de crimes figuram todos os roubos, mesmo os que não cometeu, mesmo os que o não foram por estarem respaldados na lei.
Isabel (dos Santos) passou a ser sinónimo de crime pela mão do “juiz” João Lourenço. “Juiz” que antes foi vice-presidente do MPLA, ministro de Dos Santos, propagandista da capacidade do “arquitecto da paz” e do “escolhido de Deus”.
Por fim, eis que uma pandemia internacional (Covid-19) veio mostrar que João Lourenço e a sua equipa ainda não perceberam que o Governo está em cima de um tapete rolante que anda para trás. Assim, continua a caminhar e propagandear os seus progressos governativos. Mas como o tapete anda para trás, afinal não saíram do mesmo sítio.
Folha 8 com Lusa