Taxistas angolanos queixaram-se hoje de “excessos e extorsão” por parte de alguns agentes da Polícia por “má interpretação” do decreto presidencial sobre o estado de emergência, devido à Covid-19, principalmente das administrações e comandos municipais, em Luanda. Excessos? É preciso que todos, taxistas incluídos, entendamos que – como diz o ministro Eugénio Laborinho – as forças de segurança não andam aí para distribuir rebuçados e chocolates…
Segundo o presidente da Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola (ANATA), Francisco Paciente, prevalecem na via pública divergências entre os seus associados, autoridades administrativas e efectivos da Polícia na percepção do seu trabalho em estado de emergência.
“Aproveitamos o encontro para apresentar as divergências que estamos a ter na via pública na interpretação do estado de emergência por parte das administrações municipais e dos comandos de polícia”, disse Francisco Paciente em Luanda.
Convenhamos, caros taxistas, que querer que as administrações municipais e (alguns) comandos da polícia saibam ao mesmo tempo ler, entender e agir em conformidade é exigir muito. Se “haver” necessidade o melhor mesmo é estabelecer (sem “gralhas técnicas”) um… “compromíssio”.
Falando no final de um encontro sobre o sobre o impacto económico da Covid-19 nas empresas do sector dos transportes, promovido pelo Ministério dos Transportes angolano, o responsável observou que os taxistas “conhecem os seus limites”. É pena que muitos agentes de segurança (polícias e militares) não conheçam os seus limites. Mas é preciso perceber que, afinal, o MPLA só chegou ao Governo há… 45 anos.
O presidente da ANATA recordou que a actividade dos seus associados insere-se no âmbito das excepções, com o “respeito ao distanciamento social e a higiene das viaturas e passageiros”.
“Mas, o que verificamos é algum excesso por parte das administrações municipais e de comandos de polícia”, apontou Francisco Paciente.
Em estado de excepção temporária, os transportes públicos devem usar apenas um terço da sua capacidade de lotação, está proibida o serviço de moto-táxi, sendo que a circulação e permanência de pessoas na via pública obedece a certos limites. Essa questão do “um terço” deve fundir os neurónios de alguns polícias e militares. Como é que eles vão fazer as contas?
Francisco Paciente realçou, no entanto, que neste momento estão apreendidas centenas de viaturas que fazem o serviço de táxi, sobretudo nos municípios de Talatona, Belas, Kilamba e Cuacuaco “onde há muita arrogância por parte da polícia”. Importa, todavia, reconhecer e salientar que se trata de arrogância fardada que, só por si, tem muito mais encanto.
“Apresentamos essas preocupações aqui ao ministro que garantiu, no âmbito da Comissão Interministerial de Controlo e Combate à Pandemia, abordar os ministérios do Interior e Administrações para que se ultrapasse esse diferendo”, notou.
Não digam que o ministro não avisou
O ministro do Interior, Eugénio Laborinho (que em 1973, com 18 anos, fez o curso de professores do Posto), avisou no dia 3 de Abril que a polícia iria reagir de forma adequada ao comportamento dos cidadãos, mas não ia “distribuir chocolates e rebuçados” perante os actos de desobediência ao estado de emergência.
Eugénio Laborinho, que falava numa conferência de imprensa em Luanda, após a primeira semana de estado de emergência, decretado em Angola para (supostamente) combater a pandemia provocada pelo novo coronavírus, explicou de forma muito clara e assertiva como, aliás, é seu timbre: “Estamos a aplicar multas, estamos a deter pessoas”.
Por alguma razão o ministro que aos 23 anos já era 1º tenente das FAPLA, não teve problemas em que no seu curriculum, apresentado no site do Ministério do Interior, se leia: “Com o vasto currículo, no domínio de defesa e segurança, foi a aposta certa para assumir os desígnios do Ministério do Interior”.
Entre a acção musculada que é típica do ministro registe-se que té esse dia 1.007 pessoas foram detidas por violação de fronteiras, 183 por desobediência às medidas do estado de excepção, nove por especulação, oito por corrupção e dois por posse ilegal de armas de fogo.
Os detidos por situações de desobediência ou incumprimento do decreto que determina o estado de emergência ficaram em celas “de quarentena” próprias, criadas para o efeito. Presume-se que, nessa quarentena sejam alimentados, o que sempre é melhor do que ser “livre” e estar preso dentro de casa sem… comida.
“Temos estado a actuar em conformidade com a lei e as próprias medidas que vamos tomando dependem do grau de intervenção de cada caso e somos criticados [por isso]”, disse o governante, acrescentando: “A polícia não está no terreno para servir rebuçados, nem para dar chocolates, ela vai actuar conforme o comportamento de cada cidadão ou de cada aglomerado”.
Nem mais senhor ministro. Recordemos as prioridades do seu mandato, por si anunciadas no dia 26 de Julho de 2019. Desde logo o “combate à droga pesada e contra os barões da droga”. “A primeira tarefa é o combate à criminalidade, em matéria de trazer segurança à população. Segundo, ainda no âmbito da criminalidade, é o combate à droga pesada e contra os barões da droga”, referiu.
Na cerimónia de passagem de pasta, Eugénio Laborinho disse que iria analisar e procurar soluções profícuas e breves para os problemas como criminalidade em geral e, em particular, a violenta, o combate ao consumo e tráfico de drogas, a sinistralidade rodoviária, de modos a “cada vez mais garantir ou mesmo devolver aos cidadãos o sentimento de estabilidade, segurança e tranquilidade”.
“A Polícia Nacional, deve continuar a garantir a manutenção da ordem e da segurança pública através da melhoria e da ampliação da rede policial em todo o território nacional, aperfeiçoar e alargar o policiamento de proximidade, estreitando-se a relação de confiança com os cidadãos, devolvendo assim, o sentimento de segurança pública”, referiu Eugénio Laborinho.
Sim. É o mesmo Eugénio Laborinho que, enquanto secretário de Estado do Interior, disse no dia 24 de Fevereiro de 2015 (lembram-se de quem era o Presidente da República?) que o país estava atento ao fenómeno do terrorismo, apesar de não constituir uma preocupação real.
Na altura, o governante de José Eduardo dos Santos falava à imprensa à margem da cerimónia de abertura de um seminário de peritos sobre o Desenvolvimento da Estratégia Integrada de Combate ao Terrorismo e Não Proliferação de Armas Ligeiras e de Pequeno Calibre para África Central, que decorreu em Luanda.
Fazendo referência à vulnerabilidade da fronteira no norte, com as vizinhas República Democrática do Congo (RD Congo) e República do Congo, o então secretário de Estado afirmou que o Governo estava a trabalhar com as forças de segurança angolanas e com as da região de forma preventiva.
“Temos fronteiras vulneráveis com a RD Congo e com a República do Congo, não temos grande preocupação na fronteira com a Namíbia e a Zâmbia [sul], mas temos que estar atentos em todo o limite que é fronteira”, frisou.
“Por isso não há nenhuma preocupação, não há nada que atrapalhe ou que venha a preocupar com relação ao terrorismo no nosso país. Temos estado a trabalhar, as nossas forças estão cada vez mais vigilantes, temos estado a pedir a colaboração da sociedade, sobretudo dos residentes fronteiriços”, acrescentou.
Segundo Eugénio Laborinho, a imigração ilegal era o grande problema do Governo angolano, que “tudo tem estado a fazer para que este fenómeno seja banido”.
Agora, Eugénio Laborinho destaca que as autoridades têm estado a trabalhar no sentido de fazer uma acção pedagógica (certamente na linguagem internacionalmente conhecida por todos e que tem como instrumente basilar o cassetete ou a pistola) e tentar educar de forma a não haver confrontos entre a população e a polícia, mas notou que “a polícia também é filha do povo e precisa de ser acarinhada”.
O governante sublinhou que tem sido observado o comportamento de desobediência ao estado de emergência, que impõe restrições à movimentação de pessoas e proíbe grandes aglomerações, sobretudo na província de Luanda. “Luanda, para nós, é um quebra-cabeças, mas tudo faremos para que a situação se normalize”, sublinhou.
Eugénio Laborinho admitiu um endurecimento das medidas que têm estado a ser tomadas “porque as pessoas continuam teimosas” e “têm de ficar em casa”. Mesmo que seja de barriga vazia, dizemos nós.
Folha 8 com Lusa