Angola gastou (a fonte é o Governo) 451 milhões de dólares (414 milhões de euros) com importações de bens da cesta básica, entre Janeiro e Março, garantindo (diz a mesma fonte) um stock de produtos essenciais para os próximos seis meses. Segundo o ministro da Indústria e Comércio, Victor Fernandes, este valor representa um “esforço que o país não consegue aguentar” caso a produção nacional não seja aumentada.
“P orque, continuamos ainda assim a ter muita importação vinda de outros destinos e essa importação dá-nos a tranquilidade de que os produtos existem em stock, porque o mapa provisional para os próximos meses aponta para as mesmas quantidades”, disse o governante, em Luanda.
Há pouco menos de um mês no cargo, o novo ministro da Indústria e Comércio reforçou a necessidade da aposta na produção nacional, referindo que a medida “faz parte da política do executivo”. Repetiu, aliás, a tese de todos os seus antecessores que ocuparam o cargo desde 1975.
“Inverter o quadro que temos, priorizar a produção nacional e garantir que a balança de importação e o que produzimos penda mais para a produção nacional” são prioridades, sustentou.
Em relação ao processo de licenciamento das importações, o governante assumiu atrasos, originados, sobretudo, pelo grande “volume de solicitações” por parte dos importadores por força da desburocratização imposta pelo estado de emergência.
Essa desburocratização, explicou, “fez com que o sistema que temos recebesse uma quantidade muito grande de pedidos com um pico” e, observou, “um sistema não está preparado para trabalhar com tanta solicitação”.
“Por isso ele próprio (o Sistema Integrado de Comércio Externo – SICOEX) teve que entrar em manutenção para aguentar a avalanche de pedidos”, reconheceu. É uma chatice. Era impossível prever que a afluência seria grande. No entanto houve progressos. É que, por regra, os sistemas entram em manutenção mesmo antes de entrarem em… funcionamento.
Apesar do SICOEX estar em manutenção, adiantou, o processo de licenciamento de importações não parou: “Vamos continuar a licenciar, mas queremos introduzir critérios como olhar o que é produzido localmente e decidirmos o que vale a pena importar”, realçou. E, depois de olhar, vão fazer a manutenção dos… óculos.
Na ocasião, Victor Fernandes garantiu que serão disponibilizadas informações periódicas sobre as importações e o stock de produtos essenciais em Angola, referindo que mensalmente será publicado um boletim informativo.
Pelo menos 120 pedidos de licenciamento de importações por hora foram submetidos ao SICOEX durante o estado de emergência devido à Covid-19, situação que originou “atrasos no processo”.
Segundo a directora nacional do Comércio Externo de Angola, Augusta Fortes, por força da desburocratização e simplificação do processo de licenciamento de importações determinado pelo decreto de estado de emergência, o SICOEX registava dois pedidos por minuto.
“Como compreendem 120 pedidos submetidos por hora, se multiplicarmos pelas horas, estamos a falar de 2.880 pedidos por dia e por semana estamos a falar de 20.000 pedidos”, afirmou hoje, em Luanda, durante uma conferência de imprensa. E então por mês…
Augusta Fortes assinalou igualmente que a pressão sobre o Sistema Integrado de Comércio Externo, afecto ao Ministério da Indústria e Comércio, foi o “único motivo dos atrasos de licenciamento que se têm reclamado nos últimos dias”. Porque, justificou, “o nosso sistema SICOEX não estava parametrizado para tanta solicitação”. Seria de estranhar, reconhecemos, se tivesse os parâmetros bem calculados. Mas foi, estamos em crer, apenas uma “gralha técnica”.
A não-obrigatoriedade de uma licença prévia também concorreu para a situação, disse Augusta Fortes, argumentando que, “com a desburocratização e a simplificação com base no decreto sobre o estado de emergência, simplificamos os processos, porque antes tínhamos a obrigatoriedade de avaliar processo a processo”.
Entretanto, o Presidente João Lourenço juntou-se aos outros 17 chefes de Estado e de Governo de países africanos e europeus que apelam a uma moratória urgente da dívida e pacotes de assistência económica e sanitária.
Um comunicado do Ministério das Relações Exteriores (MIREX), distribuído hoje à imprensa, refere que João Lourenço é (presumindo-se que não houve nenhuma “gralha técnica”) o 18º chefe de Estado a subscrever a iniciativa denominada “Apelo para Acção”.
A Etiópia, Itália, Portugal, Ruanda, Mali, Quénia, França, Alemanha, Angola, África do Sul, Holanda, Senegal, Espanha, Egipto e República Democrática do Congo, são os países signatários do documento, com apoio ainda da Comissão da União Africana, da Comissão Europeia e do Conselho Europeu.
No documento, os signatários referem que o surto da Covid-19 e a sua rápida propagação alargaram os sistemas globais de saúde pública para além dos seus limites e causaram danos económicos, sociais e humanitários generalizados, salientando que “este vírus não conhece fronteiras”. É verdade. Isto porque, no nosso caso, não existe (de facto) nenhum sistema de saúde pública.
O apelo sublinha que o combate ao novo coronavírus requer forte liderança internacional, guiada por um sentido de responsabilidade e solidariedade compartilhadas.
“Apenas uma vitória global que englobe totalmente o continente africano pode acabar com essa pandemia. Podemos vencer esta batalha, mas para isso precisamos de agir agora, com a racionalização do tempo e dos recursos disponíveis. Caso contrário, a pandemia afectará, de forma severa, particularmente África, prolongando a crise globalmente”, realça o documento.
De modo particular, os signatários instaram o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, o Banco Africano de Desenvolvimento, o Novo Banco de Desenvolvimento e outras instituições regionais a fazer uso de todos os instrumentos disponíveis e a revisão das políticas de acesso e as limitações de quotas, para que os países de baixa renda possam se beneficiar totalmente do seu apoio.
“Devemos conceder uma moratória imediata em todos os pagamentos de dívida bilateral e multilateral, quer pública ou privada, até que a pandemia termine. Para apoiar esse processo e fornecer liquidez adicional para a compra de produtos básicos e materiais médicos essenciais, o FMI deve decidir imediatamente sobre a alocação de direitos de saque especiais”, salienta o apelo.
Os chefes de Estado e de Governos exortam ainda que todos os parceiros de desenvolvimento do continente africano circunscrevam os seus orçamentos de ajuda ao desenvolvimento.
“Devemos responder ao apelo do secretário-geral da ONU, António Guterres, por uma iniciativa humanitária à Covid-19, e fornecer alimentos vitais e materiais logísticos às comunidades mais afectadas por confinamentos, distanciamento social e altas taxas de contaminação”, adianta a iniciativa.
Angola regista actualmente 19 casos positivos da Covid-19, dos quais dois óbitos e a recuperação de cinco pacientes.
O país, que já cumpriu os seus primeiros 15 dias de Estado de Emergência e observa agora a segunda fase, por igual período, está a atravessar uma crise económica e financeira, devido a baixa do preço do barril de petróleo no mercado internacional, a sua principal fonte de receita, bem como à criminosa incompetência revelada nas últimas quatro décadas quanto à diversificação da economia.
Folha 8 com Lusa