O ministro da Comunicação Social de Angola, Nuno Caldas Albino “Carnaval”, afirmou hoje à Lusa que o Governo angolano está a estender aos media um “paradigma de transparência” que permite maior democracia no acesso de todos os sectores da sociedade. O anterior ministro, João Melo, está com as orelhas a arder, mas é preciso ter calma. Carnaval é sempre que o MPLA quer e, para azar dos angolanos, quer que seja quase todos os dias.
“Não podemos dizer que não ocorra um outro constrangimento em relação a um ou outro jornalista, mas o ambiente de relacionamento que existe entre o Estado angolano com jornalistas melhorou de forma substancial”, afirmou Nuno Caldas Albino, considerando que existe mais pluralidade de opiniões nos próprios órgãos. Só faltou dar o exemplo da condecoração a Rafael Marques.
Hoje, “há mais abertura, mais integração, de todas as esferas da vida política e da sociedade civil nos órgãos de comunicação públicos angolanos, quer em televisão, quer em rádio”, defendeu Nuno “Carnaval”.
Sim, é o mesmo Nuno “Carnaval” que, enquanto deputado do MPLA, declarou no dia 14 de Fevereiro de 2016, no município de Katchiungo, província do Huambo, que “exaltar a conquista e a consolidação da paz da unidade e reconciliação nacional em Angola é a melhor maneira de exprimir o justo reconhecimento ao Camarada José Eduardo dos Santos, o Presidente de todos os angolanos”.
Nomeado em Outubro, Nuno Caldas Albino “Carnaval” disse que o Governo tem dado importância à abertura na relação com os media, principalmente num contexto de um “novo paradigma de governação” que assenta nos “pilares da transparência e da boa governação”.
Para isso, é necessário que a comunicação social permita uma “maior proximidade” entre a “classe governante” e “uma sociedade civil forte que tem contribuído também de forma construtiva” para o crescimento democrático, explicou o ministro, que está esta semana em Portugal acompanhado dos principais responsáveis dos órgãos públicos de media angolanos.
Para o ministro, a luta pela transparência governativa por parte do executivo de João Lourenço contempla também “uma maior expressão da comunicação social” que contribua para “a renovação do Estado democrático e de direito”.
No entanto, Nuno Caldas Albino “Carnaval” alertou para a necessidade de cada jornalista “cumprir o seu papel nos trâmites da lei e da Constituição”.
“Os jornalistas devem cumprir a lei, devem cumprir as normas estabelecidas pelos órgãos do Estado, os órgãos autónomos para que de facto possamos caminhar juntos de forma correcta e transparente”, avisou.
Na visita a Lisboa, a comitiva do MPLA quer “reforçar e fortalecer as relações de cooperação com Portugal, mais no essencial com os órgãos de comunicação social públicos e alguns privados”, em particular na área da “comunicação digital”.
Nas reuniões que já teve, o ministro destacou que a “abertura tem sido tem sido bastante favorável” para aumentar a cooperação.
Na era (que já era) de João Melo, o Ministério da Comunicação Social era «o órgão do Governo encarregue de organizar e controlar a execução da política nacional do domínio da informação, e tem as seguintes atribuições:
a) auxiliar o Governo da realização da política nacional da informação;
b) organizar e manter um serviço informativo de interesse público;
c) tutelar a actividade da área da comunicação social;
d) licenciar o exercício da actividade de radiodifusão e televisão;
e) proceder ao registo das empresas jornalísticas e de publicidade, bem como dos programas de radiodifusão sonora e televisão, para efeitos estatísticos, de defesa da concorrência e direitos de autor;
f) autorizar o exercício, em território nacional da actividade de correspondente de imprensa estrangeira e informar o Governo sobre a forma como a profissão é exercida;
g) promover a divulgação das actividades oficiais utilizando para tal a imprensa, conferências, radiodifusão, televisão e outros meios disponíveis;
h) desempenhar outras tarefas superiormente acometidas decorrentes da actividade própria que lhe é inerente.»
Será diferente agora na era de “Nuno Carnaval”? Não, mesmo considerando que ele, como todos os deputados do MPLA, é um perito em quase tudo, ou em tudo quase.
Em Novembro de 2018, segundo “Nuno Carnaval”, o Executivo estava a adoptar um conjunto de medidas para reduzir a inflação, diminuir o impacto da crise económica e financeira e propiciar o desenvolvimento do país.
“Nuno Carnaval” falava durante um debate sobre “Angola 2017-2022, desafios e perspectivas políticas, económicas e sociais”, promovido pela Oficina do Conhecimento, na Mediateca Zé Dú, em Luanda.
Referiu que existe uma “visão, serenidade e atitude” para que o Executivo reduza o nível de inflação e, com ela, minimizar a crise, com base nos programas e acções em curso, nos mais variados domínios. O deputado disse que as medidas estendem-se, entre outras, no aumento da produção interna não petrolífera, gerando mais emprego para os jovens.
Como mentiu bem, a recompensa chegou com a passagem para ministro da Comunicação Social. Aí o vamos ter a dizer que jornais diários são publicados todos os dias, que os hebdomadários têm uma periodicidade semanal, que os jornais se lêem da esquerda para a direita etc..
A comprovar a acertada escolha de João Lourenço, recorde-se que em 7 de Maio de 2016, o deputado “Nuno Carnaval” afirmou no Bailundo que a consolidação da paz depende da participação patriótica e construtiva dos angolanos, independentemente das convicções partidárias e do credo religioso.
“A nação não se constrói de um dia para o outro e nem tão pouco é um fenómeno, faz-se com espírito patriótico, cívico e amor ao próximo”, enfatizou “Nuno Carnaval”, quando falava na campanha de exaltação e divulgação dos feitos – registe-se – do Presidente da República, José Eduardo dos Santos, promovida pelo Movimento Nacional Espontâneo (MNE), na vila municipal do Bailundo.
“Nuno Carnaval” instou, por esta razão, a população do Bailundo a cerrar fileiras em torno da preservação da paz, visando a promoção do desenvolvimento sustentável da localidade e do país, em geral, tendo em conta as orientações do Presidente João Lour…, perdão, José Eduardo dos Santos, baseadas na melhoria da qualidade de vida e do bem-estar dos angolanos.
Referiu também que a paz constitui um direito do povo angolano, que, por sua vez, merece viver num país com estabilidade política (MPLA no poder há 44 anos), para prosseguir com o desenvolvimento e seu bem-estar económico e social, aproveitando a criatividade dos jovens para factos positivos que possam contribuir e dar continuidade as aspirações do povo angolano.
Mas, na verdade, há muito que “Nuno Carnaval” queria fazer a cama a João Melo. Também não era difícil. Em declarações ao Jornal de Angola, o então presidente da Comissão de Cultura, Assuntos Religiosos, Comunicação Social, Juventude e Desportos, assegurou que o Parlamento ia continuar a trabalhar para a melhoria da comunicação social no país.
“Nuno Carnaval” adiantou que o Parlamento tinha um programa específico para o referido sector. “Vamos visitar os órgãos públicos e privados e o Ministério da Comunicação Social. Vamos priorizar os órgãos públicos por serem estes que têm mais problemas”, afirmou.
Se um dia destes “Nuno Carnaval” disser que o MPLA vai proibir que os agricultores plantem as couves com a raiz para cima, Lá vamos ver João Lourenço a nomeá-lo ministro da Agricultura.
Lembram-se os nossos leitores que a lei que estabelece a deferência do uso da bandeira nacional, insígnia e hino nacional de Angola (leia-se do MPLA) foi aprovada no dia 9 de Agosto de 2018 pelo Parlamento, com 131 votos favoráveis do MPLA e de parte da oposição constituída pelos sipaios do MPLA, contando ainda com 56 abstenções dos sipaios assimilados da UNITA?
A proposta do Governo visava, entre outras mais-valias de um regime da único partido, “promover o conhecimento massivo, o respeito e a utilização uniforme dos símbolos nacionais”.
Em sede de votação final global do diploma legal, que tem ainda como fundamento densificar os dispositivos constitucionais sobre os símbolos nacionais, o MPLA (no poder desde 1975), considerou o documento como um “factor positivo sobre a valorização e reconhecimento histórico do país”.
“A aprovação da presente lei é o factor positivo desse esforço colectivo e só assim teremos a certeza da elevação da consciência patriótica dos cidadãos, da valorização e reconhecimento da nossa história e da nossa identidade cultural”, afirmou na altura um deputado do MPLA. Quem? Nem mais. “Nuno Carnaval”.
Aliás, essa sessão parlamentar, como quase todas, foi um autêntico Carnaval. Apesar de “discordar” de um dos símbolos, a “bandeira nacional de Angola semelhante à bandeira do MPLA”, a CASA-CE votou favoravelmente o documento de acordo, aliás, com as ordens superiores recebidas do… MPLA.
“Votamos a favor porque entendemos que o que se traz aqui não é aprovarmos novos símbolos, mas é estabelecer um conjunto de regras no sentido da utilização e respeitabilidade dos símbolos nacionais. O Estado angolano tem símbolos nacionais e, enquanto existirem, temos a obrigação de os respeitar”, fundamentou o deputado Lindo Tito com, reconheça-se, um brilhantismo de raciocínio e de coerência política digna de ombrear com os mais célebres sipaios de era colonial.
No seio da UNITA, o maior partido na oposição que o MPLA (ainda) permite, o deputado Adalberto Costa Júnior argumentou que a actual bandeira de Angola, a insígnia e o hino “não são factores de consenso por carregarem representatividade partidária”.
“Por isso, não simbolizam a unidade nacional que todos permanentemente apelamos. Os símbolos nacionais não devem acarretar vantagens e privilégios para uns e penalidades para outros”, apontou.
Aquando da discussão na generalidade a oposição (isto é, a UNITA) centrou o debate na necessidade de alterar a bandeira do país, adoptada a 11 de Novembro de 1975… pelo MPLA, dada a semelhança à do partido no poder desde a mesma data, o MPLA, mas também do hino nacional, que “apenas reconhece heróis do 4 de Fevereiro”, data histórica do início da luta armada para a independência de Angola.
No relatório de fundamentação, o MPLA/Estado/executivo sublinhou que os símbolos nacionais são sinais distintivos de importante valor histórico que, para além de expressarem a dimensão patriótica mais profunda de Angola (a Angola do MPLA, entenda-se), representam a soberania, a independência nacional, a unidade nacional e a integridade do Estado.
Segundo o documento, o objectivo principal deste diploma, entre outros associados ou complementares, é “densificar os dispositivos constitucionais sobre os símbolos nacionais, bem como promover o conhecimento massivo, o respeito e a utilização uniforme dos símbolos nacionais”.
No final do debate, o presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos “Nandó” (do MPLA), chamou a atenção para o facto de “a maioria” ter estado “deslocada” do assunto, sublinhando que análise da proposta era para a “deferência aos símbolos nacionais, quaisquer que eles sejam, os actuais ou os futuros”.
“Qualquer que seja o teor da bandeira, nós vamos ter que respeitá-la, vamos ter que hasteá-la nos palácios, nos órgãos de soberania nacional. Nós vamos no fim, mesmo depois das discussões na especialidade, com uma nova bandeira ou um novo hino, nós vamos aprovar as deferências, os actos de respeito, de homenagem, pelos símbolos”, disse o presidente do Parlamento do MPLA, certo que está que – nesta como em todas as outras questões – o MPLA é Angola e Angola é o MPLA.
O MPLA e a sua liderança, enquistada nos ensinamentos perenes e nobres dos tempos de partido único (que se mantêm), engravidada pelas não menos nobres qualidades da ditadura, corrupção, branqueamento e exploração de escravos, continua a mostrar que se está nas tintas para a democracia. E tem razão.
A democracia foi imposta. E para derrotar tudo o que é imposto, dizem que a luta continua e a que a vitória é certa. E essa luta faz-se contra um Povo que, consideram, por ser ignorante continua a não perceber o que verdadeiramente é relevante: que o MPLA é Angola e Angola é o MPLA.
Aliás, o MPLA não tem a mínima noção do que é o país. Para ele, Angola é tão-somente o que o partido e os seus dirigentes entenderem que deve ser. E nessa equação não entra a opinião das pessoas pois, como se sabe, para pensar por elas é que existe o partido.
Por alguma razão, como todos sabemos, os símbolos ditos nacionais são iguais, ou até os mesmos, aos do MPLA. As personalidades relevantes da sociedade são as do MPLA, os heróis são os do MPLA, tudo é do MPLA.
Nem mesmo a moeda, dita nacional, escapa a essa visão mesquinha, retrógrada e tumoral do guia supremo do Povo, o MPLA. Lá estão as esfinges de Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos. Mais uma vez, aquela que poderia, e deveria, ser uma moeda nacional nada mais é do que um instrumento partidarizado que perpetua, ou tenta perpetuar, a supremacia dos dirigentes do MPLA, como se pertencessem a uma casta superior, como se se vivesse (como eles julgam que vivem) ainda nos tempos da escravatura em que todos os não servos do MPLA nada mais fossem do que escravos.
A bandeira Nacional não é mais do que uma cópia da do MPLA, não representa todas as matizes da sociedade. Mas isso é irrelevante no contexto das democracias mais avançadas e nas quais se inspira o MPLA. São os casos da Coreia do Norte e da Guiné Equatorial. Aliás, basta dar uma volta pelo mundo para ver que as bandeiras de quase todos os países reflectem a imagem do partido dominante…
Recorde-se que em 2003, a Comissão Constitucional ficou de propor novos símbolos nacionais, acabando por apresentar em 28 de Agosto de 2003 uma proposta para a nova bandeira de Angola.
Recordam-se? Seria uma bandeira dividida em cinco faixas horizontais. As faixas inferior e superior azuis escuras, representariam a liberdade, a justiça e a solidariedade. As duas faixas intermédias, de cor branca, representariam a paz a unidade e a harmonia. A faixa central de cor vermelha, representaria o sacrifício, tenacidade e heroísmo. No meio da faixa vermelha ficaria um sol amarelo com 15 raios, composto de três círculos irregulares concêntricos. A imagem era inspirada nas pinturas rupestres de Tchitundo-Hulu, na província do Namibe. O sol simbolizaria a identidade histórica e cultural e a riqueza de Angola.
O Hino Nacional é também do tempo de partido único e a letra é de visão socialista e, como seria inevitável, é da autoria de dois militantes do… MPLA (Manuel Rui Monteiro e Rui Mingas): “Angola, avante! Revolução, pelo Poder Popular! Pátria Unida, Liberdade, Um só povo, uma só Nação!”
Depois surge a bestialidade, a mediocridade, o anacronismo do Bilhete de Identidade. Mais uma vez o reverencial canino, o culto da personalidade, levaram o regime a nele colocar as fotos de Eduardo dos Santos e Agostinho Neto, uma clara postura ditatorial monárquica.
Folha 8 com Lusa