Balas e assassinatos não acabam com as manifestações

O rastilho está aí. Manifestações juvenis! Intermitentes! Vieram para durar, uma vez que o fio, neste momento, está embebido em pólvora, de um lado, “rebuçadamente” falando e, de outro, em “combustível sonhador” de uma juventude inconformada com a incompetência, má gestão da coisa pública, intolerância e discriminação.

Por William Tonet

Os jovens não pretendem reinventar a roda, conformam-se com ela, logo têm ciência das marcas por ela cunhada no passado colonial, no caminho da independência.

Hoje distante do fascismo de Salazar e Caetano, que matou na Baixa de Kassanje, no levantamento do 4 de Fevereiro, os jovens da época de 80/90, “repristinam” a coragem dos seus antecessores, combatendo a ditadura e totalitarismo instalado que cerceia liberdades.

O grito está aí. Esteve lá!

Nós testemunhamos, ao vivo e a cores.

As mesmas cores brancas de PAZ, que amedrontam o regime do MPLA, medroso, tal como o diabo da cruz… de tal monta que decidiram refrescar o art.º 333.º CP (Código Penal novo), para calar a voz da liberdade de expressão, opinião, informação e democracia, constitucionalmente, consagradas. Logo a sua adopção crua, não havendo alteração da Constituição, estaremos sempre diante de uma inconstitucionalidade, derivada desta lei.

Os corações juvenis, envoltos em veias de indignação, calcorrearam as ruelas, os carreiros, as ruas e avenidas com as cruzes do pacifismo, clamando por justiça, liberdade, eleições livres, justas e fim de autoritarismo.

Infelizmente, em sentido contrário, emergiu, mais uma vez, no 11.11.20, a intolerância, a brutalidade, a discriminação e a força dos bastões, balas, cães e cavalos, de quem não consegue dialogar em pé de igualdade contra frágeis corpos indefesos.

O desemprego, que alimenta a fome e vitamina a miséria, foram as legítimas bandeiras, hasteadas no 11 de Novembro de 2020, que atemorizaram o regime, numa clara demonstração do “gigante de pés de barro”, apenas amparado pelo diálogo dos covardes, resumido em canhões, bombas e armas, manuseados por mãos assassinas que disparam contra o corpo de jovens, crianças, velhos e mulheres, inocentes. SEMPRE!

Nesta bifurcação os autores: moral (Executivo) e material (Polícia), poderão ser, harmoniosamente, considerados assassinos pelo cometimento de mais um crime imprescritível e insusceptível de amnistia, como preceitua o art.º 61.º (Crimes hediondos) da CRA (Constituição da República de Angola), ao dispararem contra um jovem inocente, estudante universitário (terceiro ano de Engenharia da UAN), cultivador de sonhos: um país mais igual, plural e democrático…

Por esta razão, com outro que teve igual destino (assassinato), fez parte do grupo, que momentos antes, de joelhos, numa das milhões de ruelas esburacadas (cartões de visita do regime), paralelas ao hospital Américo Boavida, entoavam com os punhos desarmados, no ar, um hino, comunista, exclusivista e discriminador da República do MPLA: “Angola avante Revolução (…) Pelo poder Popular (…) Um só Povo, uma só Nação (…)”, mas, ainda assim, não sensibilizou a mente assassina de agentes policiais, “caninamente” vinculados à partidocracia: “Ordens Superiores”, que manda disparar, balas reais, desmentindo a coragem deslavada, insensível e malvada do comandante provincial da Polícia de Luanda de utilização de balas de borracha.

Felizmente o estatelamento, pelas balas traiçoeiras da Polícia anti-republicana, contra a cabeça de mais um jovem cidadão, nascido pobre/discriminado; crescido pobre/discriminado e morto pobre/discriminado, pelo regime do MPLA, que transformou o sangue vertido em herói das MANIFESTAÇÕES PELA MUDANÇA, foi relatado em directo pelo jornalista Queiroz Chuvila: “Neste momento, alguns jovens movimentam-se em direcção ao Largo 1.º de Maio, tentando contornar as barreiras da Polícia, na zona do Hospital Américo Boavida, outros, ajoelhados cantam o hino nacional e…e …agora ouvem-se tiros disparados pela Polícia… e um jovem parece ter caído…oh…vou aproximar-me, um pouco, sim, caiu, com uma bala…oh…na cabeça. Alguns jovens começam a fugir, mas outros aproximam-se e seguram o corpo da vítima, levantam-no”, relatou o jornalista da Despertar.

E foi neste testemunhar que, heroicamente, tombou o filho de um ex-militar das FAPLA que jamais esquecerá o dia em que perdeu um dos primogénitos, questionando-se se foi mesmo por este regime que lutou e defendeu para negando-lhe uma pensão condigna, entregar-lhe o filho: Inocêncio de Matos, de 26 anos de idade, na eterna horizontalidade, com sinais visíveis do crânio perfurado, com bala letal.

Mas, na covardia congénita do regime, depois do policial, um médico foi, qual membro do CAP-MPLA, colocado a desempenhar um papel abjecto, traindo a classe médica, mais uma vez, como sujamente, já antes, um destes covardes, havia feito, na morte do colega (médico) Sílvio Dala, assassinado numa das masmorras da Polícia, cada vez mais partidocrata, afirmando ter sido a mesma causada por “patologia prévia”, uma revoltante e boçal justificativa para ilibar os assassinos. Agora o médico Augusto Manuel (nome a reter), qual comediante do diabo, foi aos ecrãs da televisão partidária do MPLA (TPA), no 12.11, MENTIR, descaradamente, quiçá, cumprindo “Ordens Superiores”, esperando eventual promoção, com a maior cara de pau disse ter o jovem morrido por ferimentos na cabeça provocados por objecto contundente, eventualmente, “um pau, um pedaço de metal, de ferro”, etc., quando a realidade, testemunhada por centenas e centenas de olhos, confirmam o contrário: assassínio por disparo de arma de fogo.

Infelizmente, Augusto Manuel não parece conhecer o juramento de Hipócrates, a que todos profissionais de Medicina estão vinculados, pela conduta ética requerida aos médicos: “(…) Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém. A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda (…) Conservarei imaculada minha vida e minha arte. Não praticarei a talha, mesmo sobre um calculoso confirmado; deixarei essa operação aos práticos que disso cuidam (…) Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça”. Como se pode constatar, este juramento ético, não faz, morada no acervo mental do médico Augusto Manuel.

Danos de João superam os de Dos Santos

Pela primeira vez, em 45 anos, o MPLA, mesmo discriminatoriamente, foi incompetente em festejar a data, não por culpa da COVID-19, mas fruto da raiva estampada, primeiro nos milionários painéis publicitários que, retiraram a imagem de quem, ilicitamente, enriqueceu o MPLA com fundos públicos, para o perpetuar no poder, bem como os seus dirigentes, igualmente, através de fundos públicos e se manteve por 38 anos no poder, período compatível com o de ditador.

A oposição interna no MPLA cresce, silenciosa e numerosa, ante o carácter musculado e arrogante de João Lourenço, “que pretende esconder a sua insuficiência e temor a competência de outros, por isso através da força, utiliza mal os estatutos do partido e da Constituição, fazendo tudo sozinho e muita coisa mal feita, não ouvindo os outros. Nas últimas reuniões, quer do bureau político, quer do comité central, já ninguém fala, com medo de retaliação, é o monólogo: o chefe fala sozinho, com as consequências dos danos que está a causar ao partido”, denuncia, ao F8, M.A.P., membro do comité central do MPLA, mas, alerta, “ainda assim, de mansinho, uma ala, nos últimos dias, sem dar nas vistas, denunciou a tentativa de agigantar, como se estivéssemos diante de um Messias, a imagem de um Presidente do MPLA e da República, com três anos e no primeiro mandato, que faz da consolidação do seu poder, a humilhação, maltrato e espezinhamento dos outros, esquecendo-se estar a afastar camaradas importantes, para a campanha da sua reeleição, que não está garantida e podemos ser todos surpreendidos, porque o quadro no interior do partido, está muito mau, o camarada presidente fala de corrupção, mas o seu secretário-geral e a vice presidente, têm as mãos igualmente, manchadas e nada acontece, mas em contrapartida, prende outros seus camaradas”, denuncia.

Por seu lado, este membro do comité central, diante das repercussões negativas das manifestações juvenis, diz: “Ninguém sabe qual a estratégia do camarada João Lourenço, nem sabemos, qual o programa económico, capaz de combater a fome, o desemprego, sem colocar-se como moço de recados do FMI”, acusa, acrescentando, ter o actual presidente “transformado os órgãos de direcção do partido, numa espécie de OPA (Organização dos Pioneiros Agostinho Neto), crescida, mas jardim infantil, com camaradas que dizem amém a tudo, espezinhando os demais, numa clara demonstração de ódio e inveja, principalmente, perseguindo numa espécie de vingança pessoal, o camarada Eduardo dos Santos, que liderou o partido por mais de três décadas. Por esta razão, assistimos às crises com a oposição, com a sociedade civil, com os desmobilizados militares e com estes jovens que, legitimamente, se manifestam, porque ele quando subiu, foi o estimulador, ao posicionar-se acima de todos, como se estivesse ao lado de Deus e não tivesse, também, riqueza e empresas, que não pode justificar a origem do dinheiro, salvo a ilícita”.

Na opinião de M.A.P., o que “estamos a assistir é o princípio do desmoronamento do partido e de uma luta dos jovens que poderão não parar mais se a oposição partidária, que não tem aproximação com o camarada presidente, entrar nessas reclamações face ao aumento do desemprego, da fome, miséria, impostos e inflação, que a todos sufoca”.

É confrangedor, ouvir este retrato vindo do interior de um partido da dimensão do MPLA, pois quem se vangloria ter mais de cinco milhões de militantes, não pode agir como robot, covardes, que não pensam, não agem e não falam, com medo de sevícias de quem, como nas dinastias comunistas, recebeu “o bastão do poder absoluto, apenas com a confiança livre e espontânea do camarada José Eduardo dos Santos, o único que apostou nele e, chegado ao poder, o acusou, em Lisboa, caindo muito mal, como marimbondo. Havendo problema, roupa suja, lava-se em casa e não no estrangeiro, que deu início a nossa divisão interna, agravado pelo afastamento de camaradas maduros, substituídos por meninos do jardim infantil”.

Questionado como é que o MPLA reagiu à retirada da imagem de José Eduardo da moeda e das fotos nas sedes do MPLA, foi peremptório: “Uma estratégia estúpida, descabida, infantil, sem sentido e despesista, gastar dinheiro para tirar uma figura, quando o melhor seria, a saída dos dois, veja agora com o escândalo da filha e genro de Agostinho Neto? São todos do MPLA e é o líder do MPLA que está a desgastar a imagem do MPLA, levando a esta imagem de sangue juvenil, nas comemorações dos 45 anos de independência, como se nós, no MPLA, não tivéssemos memória, quando a UNITA faz diferente, mesmo Savimbi tendo cometido mais erros”.

Hoje, João Lourenço fruto de uma cordilheira de erros é criticado por um círculo maior, integrando, camaradas de partido (afastados e punidos selectivamente, podendo, estes, comprometer a sua reeleição), a oposição verdadeira, sob a liderança de Adalberto da Costa Júnior, presidente da UNITA, pela juventude revolucionária, patriótica e nacionalista, por Abel Chivukuvuku, que já foi seu aliado, mas cada vez mais decepcionado depois de ver chumbado por duas vezes, sem justificação legal, dois projectos de partido político: PODEMOS JA e PRA-JA – SERVIR ANGOLA.

Finalmente, ainda com o rescaldo das manifestações, Manuel Simeão do projecto de Abel Chivukuvu acusa: “Temos sido julgados, no consulado de João Lourenço, não por duas juízas-relatoras, mas dignas dirigentes do MPLA; Júlia Ferreira e Vitória Izata, sem experiência como juízas dos tribunais comuns ou docência académica, mas reputada e irrepreensível fidelidade canina, ao MPLA”.

A primeira, “a senhora da água”, Júlia Ferreira, que tanto batotou, nas eleições de 2017, na CNE, a favor do cabeça-de- lista do MPLA, João Lourenço, que perdeu no voto, mas ganhou na secretaria, retribuindo com a indicação, ao Tribunal Constitucional e, quando aí chegou, logo tratou de mentir, falsear dados, para chumbar o PODEMOS JA. Mais recentemente, ocorreu o mesmo, também, com juíza inexperiente, caloira, directora do comité central do MPLA, Victória Yzata, através de argumentos falsos, tendenciosos, incoerentes e caluniosos, que envergonham qualquer Tribunal Constitucional, chumbou o PRA-JA Servir Angola e, quem lê o Acórdão (actualmente, em fase de recurso extraordinário de inconstitucionalidade), nota haver ódio, raiva e discriminação, contra um grupo de cidadãos, impedidos, pelo regime de João Lourenço, de constituírem partido político. Estamos pior que no tempo de José Eduardo, que não impedia a criação de partidos políticos”, concluiu Simeão.

Resta agora esperar pelos próximos capítulos, numa altura que anda na lama a imagem do Presidente da República, João Lourenço, muito por culpa de alguns assessores e bajuladores de todas as latitudes.

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