Um estudo da Comissão Europeia mostra que Portugal é o terceiro país da União Europeia que mais riqueza coloca em paraísos fiscais. Assim, entre 2004 e 2016, o país perdeu mais de 1,3 mil milhões de euros em impostos. 65% da receita fiscal perdida em Portugal foi nos rendimentos de capital. Assim percebe-se melhor o altíssimo desempenho dos discípulos que Portugal deixou no MPLA.
Na União Europeia, só Chipre e Malta batem Portugal no campeonato do dinheiro desviado para offshores. Segundo um estudo da Comissão Europeia citado pelo português Jornal de Negócios, entre 2001 e 2016, cerca de um quarto do Produto Interno Bruto, à volta de 50 mil milhões de euros, em média, foi parar aos paraísos fiscais.
O Chipre comanda esta lista com 38% do seu PIB colocado em offshores, depois vem Malta com 31% e a seguir Portugal com 26%. No polo oposto está a Dinamarca com apenas 1,8%.
Isto quer dizer que o país ocupa também o terceiro lugar na lista dos países que mais perdem receita fiscal por esta razão: são mais de 1,3 mil milhões de euros entre 2004 e 2016. Estima-se que a maior fatia da receita fiscal que é perdida, 65%, está relacionada com rendimentos de capital.
O valor de dinheiro colocado em offshores foi variando ao longo dos últimos anos mas a Comissão Europeia salienta uma tendência para diminuir. Ainda assim, no último ano do período estudado, 2016, havia 1,5 bilhões de euros de habitantes europeus em offshores. Os responsáveis pelo estudo advertem contudo que os montantes serão ainda maiores, uma vez que estes valores não envolvem contratos de seguros, imobiliários e numerário.
Em Portugal, o valor chegou a ser de 37,9% do PIB em 2001 e foi descendo até atingir um mínimo de 17,3% em 2010. Seguiu-se uma tendência inversa: em 2015 o valor sobe até aos 30,6%. A partir daí nota-se uma descida que é comum à média dos restantes países da UE.
A Comissão Europeia atribui a descida às medidas recentes que tomou, nomeadamente a criação de uma lista negra e a troca automática de informação entre os países da UE e com vários outros como Andorra, Liechtenstein, Mónaco, São Marino e Suíça. Segundo a Reuteurs, contudo, “os critérios para definir os evasores fiscais foram definidos em termos tão genéricos que correntemente a lista [negra] inclui apenas nove pequenas jurisdições, a maior parte nas ilhas do Pacífico que não têm qualquer relação financeira com a UE”.
Bons mestres, bons alunos
Acabar com a corrupção em Portugal seria como acabar com as vogais na nossa língua. Essa peregrina ideia de querer pôr, em Portugal, os corruptos a lutar contra a corrupção é digna dos bons alunos do regime angolano que, aliás, aprenderam com os exímios professores portugueses.
O combate à corrupção em Portugal, tal como em Angola, apresenta “resultados mais baixos do que seria de esperar para um país desenvolvido”. Essa de chamar desenvolvido ao reino esclavagista em que os senhores feudais foram e são do PSD ou do PS, com algumas incursões do CDS, tem piada, tal como tem falar-se (nada mais do que isso) de corrupção.
Apesar dos “esforços”, traduzidos na produção de legislação, muitas das novas leis “estão viciadas à nascença, com graves defeitos de concepção e formatação”, o que as torna “ineficazes”, dizia há para aí quatro anos um documento produzido pelos Sistema Nacional de Integridade (SNI), constituído por entidades públicas e privadas e elementos da sociedade empenhadas no combate à corrupção.
Dizia o SNI que o combate à corrupção “está enfraquecido por uma série de deficiências” resultantes da “falta de uma estratégia nacional de combate a esta criminalidade complexa”.
Boa! São de facto deficiências estratégicas que permitem e que estimulam a que, à boa maneira mafiosa, a corrupção medre e domine em qualquer reino esclavagista, chame-se Portugal, Angola, Brasil ou Guiné-Bissau.
“Nenhum Governo até hoje estabeleceu, objectivamente, uma política de combate à corrupção no seu programa eleitoral, limitando-se apenas a enumerar um conjunto de considerandos vagos e de intenções simbólicas”, acrescentava o documento do SNI.
Mas do que é que estavam à espera? Que os corruptos lutassem contra a corrupção que, aliás, é uma das suas mais importantes mais-valias? E mesmo que anunciassem medidas, nunca seriam para cumprir. Por alguma coisa Portugal, por exemplo, tem tido os primeiros-ministros que mais mentem.
O relatório português inseria-se numa iniciativa da organização Transparency International, que se desenvolveu noutros 24 países europeus e que em Portugal foi realizado pela associação Transparência e Integridade, centro INTELI – Inteligência e Inovação e Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Reflectia o tratamento dado a cerca de quatro dezenas de entrevistas a personalidades de diferentes sectores de actividades, desde o Provedor de Justiça, a magistrados, juízes, dirigentes de organismos estatais, professores universitários e jornalistas, entre outros.
As iniciativas legislativas tomadas “não têm travado a corrupção, nem têm diminuído o destaque desde fenómeno na comunicação social, nem têm alterado a percepção sobre a incidência e extensão da corrupção na sociedade portuguesa”, acrescentava o texto.
Este resultado surgiu pela “fraca capacidade”, tanto da comunicação social como da sociedade civil, para acompanhar os processos de produção de legislação e “denunciar a má qualidade dos diplomas”, acabando por permitir a produção de diplomas “inócuos”.
Além de encontrar “falhas graves”, a avaliação do SNI concluiu que essas lacunas “põem em causa a legitimidade e o desempenho global das instituições”.
Na política existe “uma total irresponsabilidade dos eleitos face aos eleitores” e as promessas de combate à corrupção “são abaladas” por leis que permitem o branqueamento de capitais e por declarações de rendimentos e de interesses que “não correspondem à realidade”.
Somados, estes factores resultam na “falta de honestidade para com os cidadãos e pela falta de sancionamento” das irregularidades praticadas pelos políticos.
Para acabar com esta realidade, o SNI defendia uma maior fiscalização da parte do Parlamento (também ele alfobre da corrupção) aos registos de interesses de deputados e membros do Governo e o alargamento do regime de incompatibilidades aos membros que integram os gabinetes governamentais. Se esta medida fosse implementada em Angola seria o fim da picada. No Parlamento ficariam meia dúzia de deputados e não haveria governo por falta de candidatos que preenchessem as condições mínimas.
De vez em quando os portugueses, seja por via directa ou não, resolvem falar de corrupção. Quase sempre, neste como em outros assuntos, apenas mudam as moscas…
Os portugueses são, na generalidade e em teoria, contra a corrupção, mas no dia-a-dia “acabam por pactuar” com “cunhas” e situações de conflito de interesses. Continuamos sem saber como é que se pode ser contra algo que, em sentido lato, já é uma “instituição” secular. Falha nossa, certamente.
E os portugueses (cada vez menos) ainda têm a lata de criticar a corrupção em Angola, quase esquecendo que os poderosos donos deste país aprenderem (e se calhar até já são melhores) com os mestres portugueses…
“No nível simbólico, abstracto, toda a gente condena a corrupção, tal como no resto da Europa, mas no nível estratégico, no quotidiano, as pessoas acabam por pactuar com a corrupção, até nos casos mais graves, de suborno”, disse o politólogo Luís de Sousa, co-autor, com João Triães, do livro “Corrupção e os portugueses: Atitudes, práticas e valores”.
Luís de Sousa dava como exemplo o primeiro lugar registado por Portugal no indicador de um estudo relativo aos contactos que as pessoas assumem ter “para conseguir benefícios ou serviços a que não têm direito”.
Não sabemos o que se chamará ao facto de quando alguém se candidata a um emprego lhe perguntarem a filiação partidária. Será corrupção? E quando dizem que “se fosse filiada no partido teria mais possibilidades”? Ou quando se abrem concursos para cumprir a lei e já se sabe à partida quem vai ocupar o lugar?
Recorde-se que este livro foi apresentado por Paulo Morais, em Julho de 2011, que afirmou que a obra confirma que “os portugueses são algo permissivos” relativamente à corrupção, o que considera ser uma herança da “lógica corporativa do tempo de Salazar”.
Se o cidadão anónimo é permissivo por ter sido influenciado pela “lógica corporativa do tempo de Salazar”, quem terá influenciado os políticos, os administradores, os banqueiros, os gestores, os patrões que gerem o país?
“A estrutura de poder actual é, basicamente, a estrutura de poder do doutor Oliveira Salazar. É uma estrutura que se mantém e nos asfixia”, disse Paulo Morais, realçando que, enquanto perdurar esta lógica, “os grandes interesses ficam na mão do grande capital”.
E quem tem força para contrariar o sistema sem, quando der por isso, estar enredado dos pés à cabeça, encostado à parede, com a vida (para já não falar do emprego) em perigo?
O livro, com prefácio de Maria José Morgado, está dividido em cinco capítulos, dos quais o primeiro apresenta uma sinopse dos principais resultados do projecto “Corrupção e Ética em Democracia: o Caso de Portugal”, que visou “caracterizar o ambiente ético em que opera a democracia portuguesa”.
Nesta matéria as similitudes entre Portugal e Angola são mais do que muitas. Afirmar que os níveis de corrupção existentes em Angola superam tudo o que se passa em África, conforme relatórios de organizações internacionais e nacionais credíveis, é uma verdade que a comunidade internacional, Portugal incluído, reconhece mas sem a qual não sabe viver.
Aliás, basta ver como os políticos e as grandes empresas, portuguesas e muitas outras, investiram forte no clã Eduardo dos Santos como forma de fazerem chorudos negócios… até com a venda limpa-neves. Basta ver como continuam a fazer o mesmo com João Lourenço.
Com este cenário, ninguém se atreveu a dizer ao então dono do poder angolano, José Eduardo dos Santos, que era preciso acabar com a corrupção. Hoje ninguém se atreve a dizer o mesmo a João Lourenço.
No entanto, a corrupção pode ser uma boa saída para a crise angolana. Isto porque, como demonstraram os empresários portugueses e angolanos, é muito mais fácil negociar com regimes corruptos do que com regimes democráticos e sérios.
Ou seja, quem sai aos seus não degenera.