A falhada recuperação económica e a não conseguida diversificação da economia, entre a continuada crise petrolífera que tudo justifica, centraram em 2018 a atenção dos angolanos, tal como continuarão a centrar durante os próximos anos. João Lourenço está no comando e até agora a “parra” está bonita e medra que nem a… fome de 20 milhões de pobres. As uvas é que ainda não se vêem. Mas é preciso ter calma…
Empossado como terceiro Presidente da República de Angola a 26 de Setembro de 2017, sucedendo a José Eduardo dos Santos e à sua liderança de 38 anos, João Lourenço admitiu em Novembro desse ano as dificuldades que tem pela frente, desde logo ao colocar a tónica (e a tónica continua viva) no combate à corrupção, uma enfermidade instituída pelo MPLA desde 1975.
“Sei que existem inúmeros obstáculos no caminho que pretendemos percorrer, mas temos de reagir e mobilizar todas as energias para que esse cumprimento se efective nos prazos definidos”, apontou João Lourenço, há muitos anos figura de grande relevo no partido e até ex-ministro de José Eduardo dos Santos.
Seguiram-se dezenas de exonerações de quadros ligados a Eduardo dos Santos, substituídos por quadros ligados a João Lourenço. A mais expressiva exoneração, até agora permanecem as dúvidas quanto ao critério (político-familiar ou técnico), que terminaram com o legado do ex-chefe de Estado, incluindo a própria filha, Isabel dos Santos, que José Eduardo dos Santos tinha colocado, 17 meses antes, na presidência do Conselho de Administração da petrolífera do regime, a estratégica Sonangol.
A decisão, juntamente a outras sempre associadas a uma ruptura com o legado governativo do anterior Presidente, deu a João Lourenço uma popularidade que não tinha antes de ir a votos não nominais mas como cabeça-de-lista do MPLA.
Em Março de 2016, José Eduardo dos Santos, Presidente da República e líder do MPLA, anunciou que se retirava da vida política em 2018, mas sem nunca esclarecer em que moldes. Antes, entre Março de 2016 e Fevereiro de 2017, alimentou o tabu sobre a sua recandidatura ao cargo de Presidente da República.
Já com João Lourenço como chefe de Estado, José Eduardo dos Santos viu o ‘bureau’ político do MPLA homenageá-lo, recordando-o como “arquitecto da paz” e “de quem os angolanos herdaram um país unido”.
Antes, no final de Outubro, foi a vez do comité central proferir uma declaração de apoio a José Eduardo dos Santos: “Exorta os militantes, os simpatizantes e os amigos do MPLA a cerrarem fileiras em torno do MPLA e do seu Líder, o camarada presidente José Eduardo dos Santos”, pode ler-se no comunicado final da primeira reunião ordinária do comité central realizada após as eleições gerais.
É neste cenário, entre aparentes, reais e constantes ameaças aos interesses da família de José Eduardo dos Santos e de um regime de quase quatro décadas, que João Lourenço assume a Presidência do partido.
Nessa altura, como ainda hoje, há muito boa gente a perguntar onde andou nas últimas décadas o general João Lourenço. Perguntam mas acrescentam que ele sempre foi um homem do sistema, do regime. 1984 – 1987: 1º Secretário do Comité Provincial do MPLA e Governador Provincial do Moxico; 1987 – 1990: 1º Secretário do Comité Provincial do MPLA e Governador Provincial de Benguela; 1984 – 1992: Deputado na Assembleia do Povo; 1990 – 1992: Chefe da Direcção Politica Nacional das FAPLA; 1992 – 1997: Secretário da Informação do MPLA; 1993 – 1998: Presidente do Grupo Parlamentar do MPLA; 1998 – 2003: Secretário-geral do MPLA; 1998 – 2003: Presidente da Comissão Constitucional; Membro da Comissão Permanente; Presidente da Bancada Parlamentar; 2003 – 2014: 1º Vice-presidente da Assembleia Nacional.
João Lourenço diz, ou baixa ordens para que alguém diga, que está a fazer o que está previsto na Constituição. Não estava, recorde-se e presuma-se, previsto exonerar um administrador não executivo que já tinha morrido há dois anos. Mas o Presidente corta a direito a não esteve com meias medidas. Exonerou-o mesta estando morto.
No plano económico, com um crescimento insignificante em 2016 e pouco melhor em 2017 e 2018, João Lourenço já fez saber que este ano, como o próximo (e como os próximos) não é de facilidades. Refere-se, obviamente, aos milhões que têm pouco ou nada e não aos poucos que têm milhões.
Pois é. Recorde-se que na pré-campanha eleitoral, em Benguela, João Lourenço afirmou que o governador provincial, Rui Falcão, seria “obrigado” a ‘’transformar a região numa Califórnia em Angola’’, capaz de mexer com a economia e gerar empregos. Isto porque João Lourenço considera que o agro-negócio, a pesca, a indústria e o turismo podem elevar Benguela à categoria de uma região norte-americana, a Califórnia.
No plano político, a forte (embora cada vez menos forte) popularidade que João Lourenço garantiu ao substituir a estrutura que recebeu de José Eduardo dos Santos por uma estrutura de incondicionais acólitos, continua a ser um teste à oposição. Um teste que a coloca entre a barriga cheia de lagosta mas escrava, ou vazia mas livre. A opção é clara. Saco vazio não se aguente de pé.
Ainda no capítulo da impunidade e luta contra a corrupção, o novo Procurador-Geral da República, general Hélder Fernando Pitta Grós, sucedeu a 10 anos polémicos no cargo pelo general João Maria de Sousa, que transformou a PGR em mais uma sucursal do MPLA. E assim continua. É a mesma lógica que amarra a Oposição.