O Presidente da República, João Lourenço, saudou “vivamente” hoje o Acordo de Paz assinado entre o Governo moçambicano e a Renamo, para pôr termo o conflito de várias anos, em Moçambique. Na mensagem, escreve o órgão oficial do regime (Jornal de Angola), augura que o Acordo de Paz “sirva os interesses nacionais dos moçambicanos, os da África Austral e os do nosso continente”.
Numa mensagem endereçada ao seu homólogo moçambicano, Filipe Jacinto Nyusi, o Presidente da República e do MPLA e Titular do Poder Executivo diz ter recebido “com bastante satisfação” a notícia sobre a assinatura deste Acordo, que vai permitir edificar as bases do desenvolvimento e de “um futuro de prosperidade para os povos africanos”.
“Este importante acontecimento dá-nos fortes razões para saudar vivamente, em nome do Executivo, do Povo angolano e no meu próprio, o entendimento alcançado entre moçambicanos que acreditaram na via do diálogo construtivo para pôr termo a um conflito que durante anos dividiu e separou-vos das questões centrais do desenvolvimento e da construção do bem-estar e da felicidade do povo de Moçambique”, realça o Chefe de Estado angolano.
João Lourenço exprimiu, igualmente, “plena convicção” de que este entendimento devolve definitivamente a Moçambique e ao seu povo, em primeiro lugar, e também à sub-região e à África, em geral, a paz ansiada por todos, para que o grande potencial de Moçambique “sirva os interesses nacionais dos moçambicanos, os da África Austral e os do nosso continente”.
O Acordo de Paz foi assinado, na quinta-feira, pelo presidente Filipe Nyusi e pelo líder da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), Ossufo Momade, com vista à “cessação das hostilidades militares”, em Moçambique.
O entendimento entre os dois líderes acontece depois do início, segunda-feira, do processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração dos membros do braço armado da Renamo e a ddesignação por esta última dos oficiais que vão integrar a Polícia da República de Moçambique (PRM).
FRELIMO e MPLA, UNITA e Renamo
No dia 8 de Agosto de 2017 o ex-chefe dos negociadores da Renamo no Acordo Geral de Paz de 1992, Raul Domingos, disse que Moçambique continuará a passar por ciclos de violência militar, caso persista a manipulação dos resultados eleitorais. Em Angola foi (é) diferente. Ao contrário da Renamo, que continua a ter alguma força militar, a UNITA limita-se a comer o que o MPLA lhe dá e a fingir que faz oposição.
“Não tenho dúvidas de que a falta de transparência dos processos eleitorais, a manipulação dos resultados, é a principal causa da instabilidade política e militar”, afirmou Raul Domingos. Por cá, a manipulação eleitoral continua a ser uma instituição nacional por força do MPLA, e ninguém fala da instabilidade militar. E não fala porque as Forças Armadas (sempre em “prontidão combativa elevada”) não são de Angola mas, apenas e só, do governo… do MPLA.
Raul Domingos, expulso da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana) em 2000 após divergências com o então líder do partido, Afonso Dhlakama, comentava o encontro entre o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, e o presidente do principal partido da oposição.
Descrevendo a reunião entre os dois líderes como “surpresa agradável” no caminho para uma paz duradoura em Moçambique, Raul Domingos considerou, contudo, que será necessário remover a raiz da instabilidade em Moçambique.
“As eleições em Moçambique foram sempre manipuladas pela Frelimo que nunca ganhou os escrutínios, apesar de o contrário nunca ter sido provado”, defendeu Raul Domingos, referindo-se à Frente de Libertação de Moçambique, partido no poder (tal como o MPLA), desde a independência do país em 1975.
A partidarização do Estado pela Frelimo (tal como o MPLA), prosseguiu, e o recurso às Forças de Defesa e Segurança (FDS) para a promoção da intolerância política são também as principais causas da violência politica e militar no país.
“Nesse sentido, o Governo e a Renamo devem resolver as referidas matérias por forma a que depois das eleições autárquicas de 2018 e gerais de 2019 o país não volte a resvalar para a violência”, perspectivava Raul Domingos.
Na qualidade de um dos quadros mais importantes da Renamo, Raul Domingos chefiou a delegação do movimento nas negociações que levaram à assinatura do Acordo Geral de Paz com o Governo da Frelimo, em 1992.
Nas primeiras eleições gerais e multipartidárias em Moçambique, em 1994, Raul Domingos chefiou a bancada da Renamo até ser expulso do partido em 2000, na sequência de divergências com Afonso Dhlakama, no contexto da recusa do partido em reconhecer a derrota nas eleições gerais de 1999.
O Presidente moçambicano e o então líder da Renamo (já falecido) encontraram-se, em reunião não anunciada antes, na serra da Gorongosa, centro de Moçambique, dando impulso às negociações para a restauração da estabilidade política.
Apesar do Acordo Geral de Paz de 1992, Moçambique tem conhecido surtos de violência politica e militar despoletados pela recusa da Renamo em reconhecer a vitória da Frelimo nas eleições.
A Renamo, principal partido de oposição de Moçambique, acusou no dia 25 de Novembro de 2015 o Governo da Frelimo de pretender “imitar a solução angolana”, por tencionar eliminar o líder do movimento, Afonso Dhlakama, tal como aconteceu com Jonas Savimbi, presidente da UNITA.
“Manter a paz será através da imitação do modelo angolano, como o [Presidente moçambicano] Filipe Nyusi fez saber, quando manifestou a sua admiração pela solução angolana?”, questionou José Cruz, deputado e relator da bancada da Renamo, numa pergunta do seu grupo parlamentar ao Governo.
Quando visitou Luanda, Filipe Nyusi apontou Angola como exemplo pelo facto de o principal partido do país não estar armado, uma situação que não se verifica em Moçambique, dado que a Renamo mantém um contingente armado desde a assinatura do Acordo Geral de Paz em 1992.
O relator da bancada da Renamo repetiu as acusações anteriormente feitas pelo principal partido de oposição moçambicana de que o Governo pretendia eliminar o líder do movimento, tal como aconteceu com Jonas Savimbi, líder da UNITA, que morreu em combate em Fevereiro de 2002, num cerco montado por alguns dos seus antigos generais.
“O Governo declarou guerra ao anunciar o desarmamento da Renamo e tem vindo a adquirir armamento numa estratégia que inclui a morte de Afonso Dhlakama”, frisou o relator da bancada da Renamo.
Nyusi defendeu ponderação no desarmamento compulsivo da Renamo, como forma de dar espaço ao diálogo, alguns dias após o ministro do Interior, Basílio Monteiro, ter afirmado que as forças de defesa e segurança iriam tirar as armas de “mãos ilegítimas”.
Recorde-se que o também anterior presidente moçambicano, Armando Guebuza, defendeu no dia 4 de Outubro de 2014 a desmilitarização urgente da Renamo e pediu às confissões religiosas para ajudarem na “implementação efectiva” do acordo de paz. Ou seja, fazer com o líder da Renamo o mesmo que, em Angola, o MPLA fez com o líder da UNITA.
O apelo de Armando Guebuza foi feito num comício realizado na Praça da Paz, em Maputo, por ocasião do 22º Aniversário do Acordo de Roma, que pôs fim à guerra civil de 16 anos entre o Governo e a Renamo.
Armando Guebuza sublinhou que a sua aspiração é “um desafio que tem subjacente o processo de desmilitarização, desmobilização e reintegração das forças residuais da Renamo, por um lado, na vida civil, em actividades económicas e sociais, e, por outro lado, nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique e na Polícia da República de Moçambique, para que este partido político se conforme com os ditames da Constituição da República de Moçambique”.
“Temos agora a grande responsabilidade de assegurar a implementação deste Acordo, no seu espírito e letra, sem subterfúgios nem delongas. O nosso Governo tem estado a fazer a sua parte neste sentido”, nomeadamente “incutindo o valor da paz e de reconciliação nacional no seio do nosso povo, liderando e mobilizando mais vontades e actores para a reflexão sobre o estabelecimento, estruturação, funcionamento e financiamento de um Fundo da Paz e Reconciliação Nacional, e continuando com o diálogo com a Renamo e facilitando o trabalho dos observadores militares internacionais”.