O Presidente angolano defendeu hoje que a indústria pesqueira nacional deve estar ao serviço do “combate da fome, pobreza e criação de postos de emprego”, pedindo “melhor organização do sector” para o “aumento do volume de capturas”. João Lourenço passou com certeza um bom Natal, tal é o sentido de humor que revela neste início do ano.
João Lourenço que falava, hoje, na cerimónia de tomada de posse dos novos membros do Governo central, provincial e do Conselho da República, que teve lugar no Palácio Presidencial, em Luanda, disse que quer “melhores políticas” para “atracção do investimento” no sector pesqueiro.
Também não seria despiciendo que João Lourenço levasse em contra, no âmbito das suas escolhas e nomeações, “melhores políticas” para atracção de competências, evitando assim ter de recorrer ao baú do MPLA para substituir ministros e governadores, sendo apenas líquido nas suas remodelações que a condição “sine qua non” é ser membro do partido, colocando o primado da competência logo a seguir ao… último.
Para o Presidente da República, sendo o peixe e os produtos do mar, uma fonte de proteína animal “é preciso que o sector se organize no sentido de aumentar o volume de capturas, aumentar o emprego”.
Como muito bem lembrou João Lourenço, não se esqueçam os nossos 20 milhões de pobres que, paralelamente à mandioca, o peixe e os produtos do mar, uma fonte de proteína animal. Isto já para não falar da tese, celebrizada por Kundi Paihama, que os pobres também podem comer farelo porque “os porcos também o comem e não morrem”.
Nesse sentido, salientou João Lourenço, “as pescas a exemplo da agricultura pode ser uma importante fonte de emprego dos cidadãos nacionais”, referiu. Quem diria? As pescas e a agricultura, para além dos alimentos, também podem gerar postos de trabalho. Porque será que só ao fim de 43 anos de Poder é que o MPLA descobriu esta verdade?
O Presidente empossou hoje Maria Antonieta Batista no cargo de Ministra dos Pescas e do Mar, Faustina Fernandes de Almeida no cargo de Ministra da Acção Social, Família e Promoção da Mulher e José Carlos Lopes Bettencourt no cargo de secretário de Estado da Agricultura e Pecuária.
Na sua intervenção, João Lourenço exortou a nova ministra das Pescas e do Mar a “utilizar a política de concessão de licenças” como forma de “atrair investimento, sobretudo nas infra-estruturas em terra, em frio e em processamento do pescado”.
“Para que ele (o peixe) possa chegar com qualidade à mesa dos consumidores quer nacionais quer daquela parte dedica à exportação”, indicou.
Os polos de desenvolvimento pesqueiro do Tômbua, província angolana do Namibe, e da Baía Farta, província de Benguela, foram assinalados pelo Presidente como exemplos que devem ser replicados na extensa consta marítima do país.
“Como forma de luta contra a pobreza e contra a fome, daí a razão de nós termos apostado na ministra que acaba de ser empossada, confiamos que seja capaz de fazer isso, evidentemente, não será num dia, mas o importante é ir dando passos corajosos”, apontou.
Segundo João Lourenço, para o sucesso dessa empreitada, “o segredo é privilegiar aqueles que invistam, não só, nas embarcações, mas sobretudo nas infra-estruturas em terra”.
Em declarações aos jornalistas, a nova ministra das Pescas e do Mar, Maria Antonieta Batista, que substitui no cargo, Vitória de Barros Neto, garantiu que fará um diagnóstico do sector para ir de encontro aos desígnios do Presidente.
A governante, que decidiu não fazer promessas, assumiu que pela frente vai “enfrentar muito trabalho para o controlo da extensa costa marítima” angolana, garantido “trabalhar em equipa” para “fazer chegar com regularidade o peixe” à mesa dos angolanos.
Em relação ao sector da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, agora a cargo de Faustina Fernandes de Almeida, também empossada hoje, João Lourenço pediu “maior empenho e engajamento para o resgate dos valores” morais, éticos e cívicos.
E a nova ministra do sector, Faustina Fernandes Inglês de Almeida, que substituiu, Vitória de Barros Neto, assegurou que vai dar prioridade à educação das famílias e da sociedade para o efectivo resgate dos valores morais e cívicos.
Para o sector da agricultura, João Lourenço realçou o incremento da verba no Orçamento Geral do Estado (OGE) 2019 argumentando que o sector “deve contribuir também para a redução da pobreza”, particularizando a agricultura familiar que “deve ocupar o lugar que ela merece”.
Mais do mesmo, como (lhes) convém
A anterior ministra das Pescas e do Mar, Victória de Barros Neto, afirmou na cidade do Soyo, em Julho do ano passado, que o seu sector continuaria a potenciar os pescadores artesanais da província do Zaire com meios técnicos, de modo a aumentarem os níveis de captura do pescado.
A promessa foi feita durante um encontro que a então governante manteve com um grupo de pescadores artesanais residentes ao longo das margens do canal do rio Zaire, no âmbito da sua visita ao Soyo, onde presidiu ao primeiro conselho consultivo alargado do seu pelouro.
Victória de Barros Neto reconheceu a elevada qualidade do pescado produzido no Zaire, com destaque para o seu potencial em mariscos e outras espécies de muita procura no mercado nacional e internacional, tendo aconselhado os pescadores a aumentarem as quotas de captura para permitir a exportação do excedente.
“Reitero que o pescado do Zaire tem qualidade, não só para consumo interno, mas também para exportar”, reforçou (e bem) Victória de Barros Neto, manifestando-se solidária e sensível às dificuldades na conservação do pescado, tendo tranquilizado os pescadores de que o seu sector estava a criar algumas facilidades para que o peixe da região chegasse em melhores condições aos potenciais mercados de consumo internos e externos.
Referiu-se também aos constrangimentos na aquisição de artefactos e outros meios de pesca por parte dos seus assistidos, frisando estar em curso um plano que visava dar resposta a essas inquietações.
Falou, por outro lado, da problemática da fiscalização marítima, para quem os técnicos da área do seu Ministério, integrados numa comissão multi-sectorial trabalham para desencorajar todas as actividades ilícitas ao longo da costa marítima e fluvial do país.
A ex-ministra entendia que a fiscalização marítima não devia ser encarada como apenas responsabilidade do sector que dirige, apelando para a conjugação de esforços entre todos os organismos que velam pela segurança marítima, frisando que para além da pesca ilegal existem outros crimes como a poluição, contrabando, fuga ao fisco, imigração ilegal que devem ser combatidos.
Num outro desenvolvimento, minimizou o problema de arrastões de artefactos dos pequenos pescadores por navios de grande porte, frisando ser um conflito entre segmentos da mesma actividade.
Segundo disse, existiam acusações mútuas entre os pescadores artesanais e os armadores semi-industriais e industriais, com os primeiros a queixarem-se do arrasto dos seus artefactos, ao passo que os restantes segmentos justificam dizendo que os pescadores artesanais exercem a sua actividade em locais impróprios.
No entanto, a então titular da pasta das Pescas e do Mar assegurou mais empenho dos fiscais no sentido de irem dirimindo essas desavenças, para quem a actividade pesqueira deve ser exercida de forma harmoniosa, onde todos os segmentos tenham o seu espaço para trabalhar, evitando-se assim o conflito de interesses.
A ex-ministra procedeu nessa altura à entrega de duas embarcações artesanais a igual número de cooperativas de pescadores locais, acto a que se seguiu um passeio turístico ao longo do canal fluvial do rio Zaire.
Promessas de investimento
Em Outubro de 2015, duas organizações internacionais prometeram apoiar o desenvolvimento da pesca artesanal no país, através de um investimento superior a 35 milhões de euros num sector que envolve meio milhão de famílias, segundo dados oficiais.
Em causa estava um acordo rubricado pelo Governo, através do Ministério das Pescas, com o Fundo da Organização das Nações Unidas para a Agricultura (FAO) e o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), prevendo nomeadamente a construção de centros de apoio à pesca artesanal.
Previa, segundo informação tornada pública no dia 8 de Outubro de 2015, o apoio directo da FAO à formação de quadros angolanos e à gestão de centros de apoio de pesca artesanal, entre outras medidas.
O Ministério das Pescas autorizara para 2015 um máximo de 361.402 toneladas de captura de pescado, ano em que só na pesca artesanal estavam autorizadas a operar 5.500 embarcações, estimando-se que envolvendo cerca de 500 mil famílias.
“Dos quais 80% são mulheres, intermediárias e processadoras de pescado”, sublinhara anteriormente Victoria de Barros Neto.
O sector das pescas e derivados representou 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014, com mais de 400.000 toneladas pescadas.
Angola conta com uma linha de costa de 1.650 quilómetros e uma Zona Económica Exclusiva de 330 mil quilómetros quadrados.
De acordo com o regulamento da actividade de pesca em Angola durante o ano de 2018 foi recomendado, para a pesca de cerco, o “licenciamento de 90 embarcações no máximo”, com até 250 toneladas.
Para a pesca industrial foram autorizadas 40 embarcações e outras 25 para a pesca de camarão de profundidade, ainda 15 para a pesca da gamba costeira e mais 100, no limite, para a pesca do atum do alto (no limite de 10 embarcações por empresa).
Contudo, ficou definido que “até à realização de novos estudos era proibida a exportação de espécies de lagosta e do carapau”.
Além disso, só para a pesca de Atum do Alto, o diploma, do Ministério das Pescas, referia que o esforço de pesca total “é limitado ao licenciamento de 100 embarcações”, podendo cada empresa operar com até 10 embarcações, no máximo.
Ficou ainda proibida a utilização de carapau, cavala e sardinha do reino para a produção de farinha de peixe, bem como a captura de fêmeas de lagostas ou de moluscos e bivalves em áreas fechadas como as baías de Luanda, Lobito e Tômbwa, bem como “outras áreas comprovadas de risco”.
O regulamento sobre as medidas de gestão das pescarias marinhas, da pesca continental e da aquicultura para 2018 estabeleceu um Total Admissível de Captura (TAC) de 319.232 toneladas pescado, liderado pelas espécies pelágicas (neste caso no máximo de 254.869 toneladas), como carapau ou sardinha, entre outros.
Permitia ainda a captura de roncadores (12.787 toneladas), corvinas (8.657 toneladas), caranguejo de profundidade (1.200 toneladas) ou camarão (1.200 toneladas).
Totalizava desta forma um limite de pesca idêntico a 2017, mas longe das 361.402 toneladas autorizadas, quer em 2016, como em 2015.
O documento estipula igualmente prazos em que alguns tipos de pesca ficam vedados, ao longo do ano, em diferentes zonas do país, como medida de protecção.
Foi estabelecida uma área reservada de pesca equivalente à extensão do mar territorial até às quatro milhas náuticas, bem como as águas continentais, para a pesca artesanal, podendo estender-se até oito milhas náuticas na zona norte, entre Ambriz e o enclave de Cabinda.
Folha 8 com Lusa