Por ser de relevante interesse público, se para tal entendermos que Angola é um Estado de Direito, divulgamos a Carta Aberta que o cidadão Aníbal Costa endereçou “ao juiz Presidente do Conselho Superior de Magistratura”, venerando juiz Rui Ferreira. A transcrição é “ipsis verbis” não tendo, por isso, o texto sofrido qualquer intervenção ortográfica ou contextual do Folha 8.
«D esde 27 de Julho de 2016, na 4ª Secção da Sala do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial de Luanda, decorre o Processo nº 1495/16-ODR-B, do qual sou o autor e tem como juiz, a Dr.ª Ana Raquel Pitra, Meritíssima Juíza de Direito.
Em 8 de Março e em 16 de Julho do corrente ano, enderecei à V. Ex.ª, uma Petição e um Pedido de Audiência, ambas com o título “VIOLAÇÃO DOS MEUS DIREITOS FUNDAMENTAIS”; em que, na Petição manifestava a minha indignação pelo facto de volvidos cerca de 4 anos o processo continuar sem desfecho e, o Pedido de Audiência com a finalidade de pedir esclarecimentos sobre o despacho que a petição mereceu assim como apresentar-lhe inusitados elementos então surgidos. Dest’arte ambos documentos mereceram de V. Exª o mesmo despacho (como se “copy e paste” se tratasse), cito: A Juíza da causa foi instada a dar celeridade ao processo – fim de citação; sem que me tivesse sido facultada cópia da carta dirigida pro V. Ex.ª a Juíza em questão, ou recebido em audiência como era e ainda a é a minha pretensão.
Em detrimento de toda a pressão exercida pessoalmente bem como pelo meu advogado, o certo é que até a data ainda não recebi nenhum pronunciamento por parte da Meritíssima Juíza Ana Pitra, ou do Juiz responsável da 4ª Secção aquém também manifestei o meu descontentamento e alerta sobre a violação de um dos meus direitos fundamentais salvaguardados pela nossa Constituição (acesso a justiça sem qualquer tipo de discriminação).
Em complemento ao já exposto, esta carta aberta, surge não só para mais uma vez apresentar-lhe os meus protestos pela demora do processo, mas particularmente, pelo facto de através do Jornal de Angola do passado dia 11, ter confirmado que dentre os 68 Juízes Desembargadores, para os Tribunais da Relação de Luanda e Benguela aprovados pelo Conselho Superior da Magistratura na sua sessão Plenária do dia cinco de Setembro de 2019, em Luanda, consta o nome da Juíza Ana Raquel Piedade José Pitra Juíza responsável pelo meu processo.
Depois de contactar o Meritíssimo Juiz responsável da 4ª Secção, a minha inquietação e descontentamento com o nosso sistema jurídico aumentaram; tal acontece porque para além de encontrar o processo estagnado, fiquei com a impressão de que pelo menos mais dois ou três anos serão necessários para que a justiça que tanto almejo seja feita, pelas seguintes razões:
– O processo encontra-se estagnado porque os últimos seis meses a esta parte, a Juíza esteve em formação no CEJ, assim como encontra-se em fase de gestação;
– Não se sabe se é condição sine qua non para que antes dela iniciar a nova função tenha que concluir os processos que tem a seu cargo ou se simplesmente transferi-los-á a outro magistrado, que certamente terá de proceder à sua revisão completa;
– Aproximam-se as ferias Judicias, que são praticamente quatro meses.
Através do Vosso comunicado no JA, pude aperceber-me que os factores que tiveram em consideração para a seleção dos Juízes Desembargadores, foram a valorização do tempo de judicatura e avaliação periódica obtida nos últimos anos.
Quanto ao tempo de judicatura da Juiza Ana, não questiono. Mas em relação a avaliação periódica torna-se bastante questionável, porque se se tiver em consideração que os processos que foram para às mãos deste Juíza, tiveram igual tratamento i.e se não foram alvo de nenhuma forma de segregação processual; então conclui-se que nesta data a senhora Juíza ainda esta a julgar processos que antecederam ao meu, isto é, por ela recebidos até Julho de 2016.
Estou ciente de que os juízes presidem a um órgão de soberania: os tribunais. Por esta razão são venerados pela sociedade e soe dizer-se, que o “O juiz é o direito feito homem”. Homem esse que aplica na vida prática, o que de forma abstrata a lei tutela. Portanto, entidade de importância imprescindível à sociedade. Por isso, de acordo com a lei 7/94 – Estatutos dos Magistrados, estes, devem possuir idoneidade moral e cívica e, sujeitos a avaliações periódicas do mérito profissional nos seguintes critérios (dentre outros constantes nos Artigos 57º e 58º): a) Eficiência na administração da Justiça; c) Observância dos prazos e demais normas de procedimento processual; d) Assiduidade; e) Comportamento cívico e moral…
E mister a eficácia da gestão processual assim como a decisão judicial, a qual se pretenda que seja justa e imparcial, devendo ainda a condução de todo processo ser útil, isto é, a decisão seja tomada antes do falecimento do autor.
É com frequência que ouvimos dizer que os tribunais não estão devidamente apetrechados, que os Juízes estão atolados de processos, que existem leis que não se adaptam a realidade Angolana; sendo por isso culpa do Governo que não cria condições de trabalho nos tribunais, ou do legislador que não faz leis atualizadas. Nunca é culpa do juiz. Portanto, é quem administra os tribunais e faz a lei, que tem que responder pelos seus efeitos sociais, positivos ou negativos. Isso não deixa de ser verdade. Mas até que ponto isso exclui a responsabilidade do Juiz? individualidade que gere o processo a seu bel prazer e que aplica o direito? Quem gere o processo com ou sem condições e aplica a lei de forma justa ou injusta?
O resultado pratico e concreto do desfecho de um processo judicial só se verifica com a decisão final do Juiz e não do Governo ou do legislador. Penso que isso não tem sido tarefa do Governo muito menos do legislador. Se o processo for gerido com ou sem lisura e a sentença aplicada com justiça ou sem justiça, isso não é problema do Governo ou do legislador, mas sim de responsabilidade ética do Juiz.
No vertente caso, a 4ª Secção da Sala do Cível e Administrativo do Tribunal Provincial de Luanda, esta localizada em edifício novo, com parque de estacionamento e gabinetes privado para os Juízes, instalações climatizadas e, área administrativa devidamente apetrechada. Em complemento, a meu processo foi apresentado com todas a provas a corroborarem o explanado na Petição Inicial.
Ante todo o exposto, resta-me apelar aos bons ofícios de Vossa Excelência a fim de responder-me às seguintes perguntas:
1. Quanto tempo ainda terei que esperar para que o meu processo seja julgado e concluído na primeira instância?
2. Os Juízes recém-promovidos a Desembargadores serão ou não compelidos a concluírem os processos sob sua responsabilidade antes de iniciarem as suas novas funções?
3. É aceitável que uma Juíza que fica quatro anos sem dar desfecho a um processo com grau de complexidade mediana?
4. Para mitigar o risco de dano decorrente da demora processual, que medidas existem ou serão adoptadas?
5. Por fim, concorda ou não com o jurista Brasileiro Ruy Barbosa (1849-1923), quando este diz que “Justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada”?»