O posto de saúde do sector de Mussusso, comuna de Camame, município de Ngonguembo, Cuanza Norte, está encerrado há mais de cinco meses por falta de enfermeiros. Quando se vive num país pobre… é mesmo assim. É isso, não é senhor Titular do Poder Executivo?
O facto foi dado a conhecer à Angop pelo coordenador adjunto da comissão de gestão da direcção municipal do Ngonguembo da Saúde, Francisco Velho, informando que o único enfermeiro que assegurava a assistência sanitária dos cerca de 800 habitantes da localidade foi transferido para a sede municipal.
Francisco Velho adiantou que para prestar a assistência à comunidade, as autoridades sanitárias do município têm promovido consultas ambulatórias à população, através de equipas móveis e, em alguns casos, a população percorre cerca de 10 quilómetros em busca de assistência médica na sede comunal ou ainda no vizinho município do Golungo Alto.
Mas há mais. De acordo com Francisco Velho, além do posto de saúde do sector de Mussusso, uma outra unidade similar encontra-se igualmente encerrada para obras de restauro, há mais de três meses.
O sector da saúde no município do Ngonguembo conta com um hospital municipal e oito postos de saúde, assegurados por 47 técnicos, entre os quais, uma médica.
De Julho a Agosto, o sector de saúde no Ngonguembo diagnosticou 675 casos de malária, 116 filária e 50 de febre tifóide.
Com uma população estimada em 7.576 habitantes, o município de Ngonguembo dista a 90 quilómetros de Ndalatando, capital da província e conta com uma extensão de 1.402 quilómetros quadrados.
Angola conta actualmente com 6.400 médicos para uma população de cerca de 28 milhões de habitantes, número que a ministra da Saúde, Sílvia Lutucuta, considera insuficiente, defendendo por isso uma maior aposta na formação de quadros.
Sílvia Lutucuta recordou a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS), que para cada mil habitantes exista um médico. Pois é. Mas o país é pobre e, em 43 anos de independência sob a gerência do mesmo partido, o MPLA, ainda só conseguiu criar milionários e “prestigiar” a corrupção e a roubalheira…
Nessa estatística, Angola deveria ter 28.000 médicos ao serviço, quando no quadro actual existe apenas um para cerca de 4.400 habitantes. No entanto, reconheça-se, para ter os médicos e enfermeiros necessários era preciso que o país fosse aquilo que ainda não conseguiu ser: Um Estado de Direito.
“Ainda só temos 6.000, isso significa que temos que continuar a formar, mas formar com qualidade e diferenciar os médicos nas várias áreas de saber”, diz a ministra num diagnóstico correcto. O problema está na medicação do “doente”. É que para curar o “doente” era preciso que o Estado roubasse um pouquinho menos. Mas como ele rouba cada vez mais…
Questionada sobre o facto de em Angola enfermeiros exercerem o papel de médicos, para colmatar essa deficiência, Sílvia Lutucuta defende que o problema precisa de ser visto noutra vertente, ou seja, é preciso mais trabalho para que diminuam as enchentes nas unidades centrais.
“Nós precisamos de trabalhar mais nos nossos cuidados primários de saúde, para evitarmos as enchentes nas unidades centrais. Claro que os enfermeiros também têm o seu papel dentro dos padrões existentes, de acordo com a lei, e nós temos que valorizar o seu trabalho”, referiu.
Segundo a ministra, desde logo porque conhece o que é feito noutros países onde as pessoas têm direito à saúde, ao contrário de Angola, é necessário que se alie a prática da medicina à investigação, contudo são necessários mais recursos para a sua realização.
As promessas dos governos
O Governo angolano aprovou legislação (e isso é coisa que faz sem grandes problemas) para enquadrar médicos no Serviço Nacional de Saúde, num processo “célere” e “menos burocrático” face à “necessidade de aumentar a cobertura médica urgente no país” e a assistência sanitária às comunidades.
Esta informação consta de um decreto presidencial que entrou em vigor no final de Abril de… 2016, e que lembra o investimento na formação e capacitação de médicos que já estão “disponíveis para trabalhar”, numa altura em que só a capital angolana estava a braços com epidemias de febre-amarela e malária, com mais de 400.000 pessoas afectadas.
O mesmo decreto define que o ingresso na categoria de interno “faz-se mediante concurso documental” para licenciados em medicina, à parte das normas sobre a entrada no funcionalismo público.
O Governo anunciara em Abril desse 2016 que iria recrutar 2.000 médicos e paramédicos, angolanos, recentemente formados no país e no estrangeiro, para reforçar o combate às epidemias, que deixaram os hospitais de Luanda sobrelotados.
O ingresso como médico interno geral é feito agora por contrato individual de trabalho celebrado com o Ministério de Saúde, pelo período de um ano, renovável automaticamente.
“A renovação do contrato individual de trabalho fica condicionada ao bom desempenho profissional e comportamental”, lê-se no mesmo decreto, assinado pelo então Presidente José Eduardo dos Santos.
No início de Abril de 2016 foi noticiado que o Estado iria avançar com a admissão excepcional de novos funcionários públicos para a saúde, educação e ensino superior em 2016, segundo uma autorização presidencial.
A informação consta de um decreto assinado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, no qual é “aprovada a abertura de crédito adicional” ao Orçamento Geral do Estado (OGE) de 2016, no montante de 31.445.389.464 kwanzas (166 milhões de euros), “para pagamento de despesas relacionadas com novas admissões”.
O Governo previa gastar o equivalente a mais de 10% da riqueza produzida no país com o pagamento de vencimentos da Função Pública em 2016, mas as admissões, pelo segundo ano consecutivo, voltavam a ficar congeladas, segundo o OGE para esse ano.
Para 2016 estava prevista uma verba de 1,497 biliões de kwanzas (cerca de 7,9 mil milhões de euros) com o pagamento de vencimentos e contribuições sociais da Função Pública.
E no terreno como é?
O médico angolano Maurílio Luyela considerava em 2016 que o colapso do Serviço Nacional de Saúde em Angola é o resultado da má gestão dos recursos financeiros e humanos por parte do Ministério da Saúde.
O especialista em saúde pública disse à VOA que o sector debatia-se com a falta de pessoal qualificado porque, por alegada falta de verbas, não abriu qualquer concurso público para a admissão de especialistas angolanos que se formam nas faculdades do país.
Maurílio Luyele acusava os gestores do Ministério da Saúde de acharem mais importante comprar carros de luxo para directores em detrimento de equipamentos hospitalares.
“É mais fácil comprar carros de luxo para directores ao invés de materiais hospitalares e não há técnicos suficientes para atender a demanda, mas temos médicos angolanos que saem das faculdades que não são admitidos na função pública porque não há como pagá-los”, acusou.