Paz das armas não
é paz dos corações

PAZ. O que és? Do latim “Pax” tem dois sentidos: um positivo e outro negativo. O primeiro é um estado de tranquilidade e bem-estar social, já o segundo é a ausência de guerra ou violência bélica generalizada ou regular.

Por William Tonet

Este é o estado em que melhor se enquadra a situação angolana, levando à existência de muitas perguntas sobre a grandeza hercúlea de três letras sexualizadas, numa que deve(ria) ser solene e perene, quando evocada como marco importante na vida de povos e de um país.

A eficácia não deve repousar num texto mas, antes, na realidade de cada respirar quotidiano do cidadão. Verificando-se o inverso, este incrimina, para tristeza geral desta sublime palavra.

Paz, porque te tornaram andarilha?

PAZ, porque a maioria te aguarda, em Angola?

PAZ, Paz, paz… deste trinómio, qual te teremos?

Hoje, em Angola, és a paz do calar das armas. As que se recolheram nas chanas do Leste, em 22 de Fevereiro de 2002, com a morte de Jonas Savimbi e a desistência do seu exército guerrilheiro.

Pese este facto, a PAZ, infelizmente, ainda não é, neste 4 de Abril de 2018, a tão ansiada pela maioria dos autóctones angolanos, enquadrados na estatística dos 20 milhões de pobres.

Ela é a paz de uns poucos membros e dirigentes do regime partidocrata, que festejou, à época, com fartas grades de champanhe, qual masoquismo, o fim da vida de um inimigo (nunca foi considerado adversário), Jonas Savimbi.

É esta paz, umbilicalmente privatizada pelo regime no poder, que não consegue apontar o caminho diferente do que levou, no passado, os angolanos de pensamento diferente: esquerda e direita, a um conflito atroz, sem precedentes na história de Angola…

No conflito militar não houve uma virgem inocente capaz de atirar a primeira pedra, pois todos excluíam nos confrontos bombas de rebuçado, optando pelas letais, que matavam, na maioria, inocentes e indefensáveis cidadãos.

Ambos navegaram, anos a fio, no “egoísmo moco”, empunhando armas, bombas e obtusas posições ideológicas, atentatórias dos direitos fundamentais, consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Dezasseis anos depois, o calar das armas, entre as tropas governamentais e o ex-braço armado da UNITA, não consegue harmonizar os povos, os cidadãos, a sociedade, fruto do emergir de uma vaidade barroca, do regime que exclusivamente privatizou o que deveria ser denominado de paz, enquanto instituto solene e perene, na vida de povos civilizados.

Fazer do calar das armas, como vem acontecendo desde Fevereiro de 2002, um troféu exclusivo de uma força política partidária, a pequena a abrangência e a importância da PAZ dos justos, pondo em risco os pequenos ganhos. Uma verdadeira PAZ deve ser partilhada, nos limites dos gemidos e dos sentires dos cidadãos: A VOZ DE UM É A VOZ DE TODOS E A VOZ DE TODOS É A VOZ DE UM!

Para desgraça colectiva, a cada ano, o celebrar do 4 de Abril, repousa na exclusividade do alegado vencedor, que fala sobre a data, na base do unanimismo, apartando até mesmo os demais actores políticos e intelectuais pacifistas da sociedade, por falta de humildade intelectual, como se o país fosse coutada partidocrata.

A retórica é a de ter vergado o exército guerrilheiro da UNITA, com uma “pseudo arquitectura e arquitecto da paz”, principalmente depois da morte do seu líder, esquecendo-se do facto dos “lugares-tenentes” destes, terem e, bem, preferido encurtar caminhos, a prosseguir a guerrilha, que o podiam. Transformaram a morte do líder em pragmatismo, sentando-se à mesa com o exército que tinha não só o apoio da força das armas, concedido pelo controlo do petróleo e demais riquezas, mas também de uma comunidade internacional, alheia à idiossincrasia do regime.

Impossibilitada de exigir mais, ingenuamente, a UNITA acreditou num texto inócuo, quando deveria vingar um novo projecto país, uma nova convicção, uma vontade natural, um genuíno acordo, com Angola e os Angolanos, no centro das opções, ao invés dos partidos.

Hoje haveria o comemorar, pela maioria dos cidadãos, de uma verdadeira PAZ, se fosse cunhado, no texto do acordo, não a subserviência de uma das partes, mas a visão de um verdadeiro Estado de direito e democrático, que Angola teima em não ser, por culpa partidocrata.

Não tendo havido essa elevação de colocar Angola acima dos interesses partidários, vimos emergir um governo que, vorazmente, privatizou o Estado, as suas riquezas, os seus órgãos judiciais e judiciários, discriminando a maioria, transformando-os em milhões de pobres.

E, quando um Estado deixa de ser de TODOS, representar TODOS, distribuir oportunidades a TODOS, concentrando, ilicitamente, a riqueza nacional, na mão de uns poucos dirigentes do Estado, legitimamente, a maioria dos cidadãos, passa a considerá-los, como uma quadrilha.

Chegados a esta esquina, que não é primeira, nem última, os angolanos estão diante de uma “pax romana”, que ocorre quando um governo exerce o poder de forma unilateral, absoluto e desmedido, sem nenhum órgão, legislativo, judicial ou judiciário de controlo, permitindo-se ainda desrespeitar e espezinhar os direitos fundamentais do cidadão.

Finalmente, quando a democracia é residual, a batota eleitoral, institucional, a paz reinante, não tendo sabor de liberdade é uma autêntica FRAUDE!

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