Os angolanos, sobretudo os 20 milhões de pobres, continuam a sofrer do Síndroma de Estocolmo que, durante 38 anos, lhes foi violentamente “injectado” por José Eduardo dos Santos? Continuam. Mas agora pensam que não. Há sete meses que estão a tomar um placebo chamado João Lourenço e, só por isso, já se sentem melhor…
O Síndroma de Estocolmo é um estado psicológico em que uma pessoa, submetida durante muito tempo a um processo violento de intimidação, passa a ter simpatia e até mesmo sentimento de amor, admiração, culto e amizade perante o seu agressor. Embora de barriga vazia, os angolanos diziam que José Eduardo dos Santos era o “escolhido de Deus”. Amavam o seu carrasco.
E se, apesar do seu distanciamento e sobranceria perante o Povo, Eduardo dos Santos era idolatrado pelos seus escravos, a João Lourenço é muito mais fácil manter esse estado de coisas, embora maquilhando-o. Está mais perto do Povo, é mais popular e acessível. O Povo continua a comer peixe podre e fuba podre, mas como o novo Presidente lhe permite que arrote sonoramente, acreditam que ele não é o seu carrasco.
Assim, continuam a manter o Síndroma de Estocolmo e a desenvolver sentimentos de afecto para com o seu carrasco.
A população angolana deverá duplicar a actual, passando dos actuais cerca de 28 milhões para quase 65 milhões, em 2050, segundo uma projecção do Governo de Angola. A fazer fé nas previsões do MPLA, que está no poder desde 1975, tudo se resolverá desde que, nessa altura, Angola continue a ser o MPLA e o MPLA continue a ser Angola.
A Projecção da População 2014-2050 elaborada pelo Instituto Nacional de Estatística de Angola teve como principal fonte de dados as informações recolhidas no recenseamento Geral da População e Habitação de 2014, dados do Inquérito de Indicadores Múltiplos de Saúde (IIMS) de 2015-2016 e do Serviço de Migração de Estrangeiros de 2013.
África, e por inerência Angola, é uma região riquíssima que, apesar de ter nos seus autóctones os líderes formais, continua a gerar riquezas para os outros, ricos internos, e uma crescente população pobre.
Como alguém disse, quem estiver sempre a falar do passado deve perder um olho. Mas também é verdade que esse alguém acrescentou que, quem esquecer o passado, deve perder os dois.
Já lá vão 16 anos. Foi a 24 de Fevereiro de 2002 que alguém disse: «Sekulu wafa, kalye wendi k’ondalatu! v’ukanoli o café k’imbo lyamale!». Ou seja, morreu o mais velho, agora ireis apanhar café em terras do norte como contratados. E fomos. E, tal como no tempo colonial, voltamos a desenvolver o Síndroma de Estocolmo.
Tirando os conhecidos exemplos da elite partidária, a maioria do Povo angolano têm estado deste então a apanhar café, ou algo que o valha. E continua a idolatrar os seus carrascos.
No rescaldo da guerra imediatamente a seguir à Independência, entre 1976 a 1978, houve uma brutal escassez de alimentos e a paralisação dos campos de algodão e café do norte de Angola.nPara fazer face a esse desafio, o governo do MPLA reeditou a guerra do Kwata-Kwata, obrigando pela força das armas os contratados ovimbundos e ou bailundos (que outros poderiam ser?) a ir para as roças, sobretudo do norte.
Com a independência, os camponeses do planalto e sul de Angola sonharam com o fim do seu recrutamento forçado para aquelas roças. Finalmente, pensavam, o Síndroma iria morrer. A reedição da estratégia colonial por um governo independente foi um golpe duríssimo na sua ilusória liberdade.
O líder da UNITA, Jonas Savimbi, agastado com a fraqueza e quase exaustão das forças que conseguiram sobreviver à retirada das cidades, em direcção às matas do leste (Jamba), onde reorganizou a luta de resistência, aproveitou esse facto, bem como a presença de estrangeiros, para mobilizar os angolanos.
«Ise okufa, etombo livala» (Prefiro antes a morte, do que a escravatura ), dizia Savimbi aos seus homens, militares ou não.
E agora? Agora os seus discípulos preferem, talvez porque eles próprios sofram do Síndroma de Estocolmo, a escravatura com alguma (embora pouca) coisa na barriga, renegando a liberdade com ela vazia. O Síndroma de Estocolmo evoluiu para Síndroma do MPLA. Os escravos nutrem admiração, ou até mesmo amor, pelo carrasco.
Num cenário em que os poucos que têm milhões continuam a ter cada vez mais milhões e em que, no mesmo país, muitos milhões não têm sequer o que comer, que futuro terão os angolanos? Livramo-nos do carrasco colonial português mas, em troca, temos de aceitar um carrasco colonial angolano.
Mal por mal, antes a morte do que a escravatura? E se antes foi o tempo dos contratados e escravos ovimbundus ou bailundos irem para as roças do Norte, agora é o enxovalho de transportar pedras à cabeça para ter “peixe podre, fuba podre… e porrada se refilarmos”. Mesmo assim, o tal Síndroma do MPLA existe e, por falta de alternativas válidas, os angolanos vão aceitando como normal e correcto o facto de a maioria ter apenas mandioca e farelo, enquanto os seus donos têm todas as mordomias de uma elite anafada. Ao menos, dizem, o carrasco agora é outro.
Agora, para além de irem apanhar café em terras do norte como contratados, os 20 milhões de angolanos pobres aceitam passivamente ser escravos na terra que ajudaram a, supostamente, libertar.
Foi um síndroma que, pelos vistos, veio para ficar… e ficou mesmo.