O Presidente angolano, João Lourenço, que tal como José Eduardo dos Santos não foi nominalmente eleito (foi-o como cabeça-de-lista do MPLA escolhido por Dos Santos) afastou pelo menos 230 governantes, administradores de empresas públicas e altas chefias militares no primeiro ano de mandato, a um ritmo de uma exoneração a cada dois dias, valendo-lhe a alcunha popular de “exonerador implacável”. Também conseguir mostrar ao mundo que os protagonistas da corrupção, do branqueamento, da roubalheira são todos do MPLA, o seu partido.
AA informação estatística resulta de uma análise da agência Lusa aos decretos presidenciais de exoneração publicados em Diário da República desde que João Lourenço tomou posse como terceiro Presidente de Angola, em 26 de Setembro de 2017.
Quase metade destas exonerações envolve altas patentes das Forças Armadas Angolanas ou das forças de segurança, o que é natural porque ao longo dos últimos 43 anos, para além de criar muitos milionários e milhões de pobres, o MPLA formou uma catrefa de generais de alto gabarito, cujo expoente máximo é Bento Kangamba.
Em paralelo, desde que chegou ao poder, João Lourenço promoveu cerca de 400 nomeações, as quais, a par das exonerações, permitiram, no espaço de um ano, afastar do poder praticamente todos os que tinham sido nomeados, alguns poucos meses antes das eleições de Agosto de 2017, por José Eduardo dos Santos, chefe de Estado desde 1979.
“Exoneração é um ato de governação normal. É evidente que houve muitas exonerações, mas houve tantas quantas necessárias”, respondeu João Lourenço, em Janeiro, numa conferência de imprensa no palácio presidencial, em Luanda, a primeira iniciativa do género em mais de 40 anos.
A sua quase patológica ânsia de exonerar levou-o mesmo, em Dezembro, a exonerar uma pessoa que já tinha morrido há dois anos (o engenheiro José Pedro Tonet, falecido a 23 de Dezembro de 2015, na África do Sul, sendo na altura da sua morte administrador não executivo da ENANA EP).
Na altura, multiplicavam-se já os títulos nas redes sociais em Angola sobre João Lourenço, um general na reserva, de 64 anos, vice-presidente do MPLA e ministro de José Eduardo dos Santos: “O exonerador implacável” angolano.
Somava pouco mais de três meses de governação, mas já tinha exonerado, em Novembro, Isabel dos Santos, a filha mais velha do ex-chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, do cargo de Presidente do Conselho de Administração da petrolífera do regime, a Sonangol.
No mesmo mês, João Lourenço ordenou a retirada da gestão do segundo canal e do canal internacional da Televisão Pública de Angola (TPA) às empresas Semba Comunicação e Westside, de outros dois filhos do ex-chefe do Estado: Welwitshea ‘Tchizé’, também deputada e membro do comité central do MPLA, partido no poder desde 1975, e José Paulino dos Santos ‘Coreon Du’ que, além de empresário, é cantor.
Em Janeiro é consumada a ruptura total com os filhos de José Eduardo dos Santos (seu patrono e proponente), avançando para a exoneração de José Filomeno dos Santos do Fundo Soberano de Angola, que gere activos públicos de 5.000 milhões de dólares.
Outrora apontado como potencial sucessor do pai, José Filomeno dos Santos está desde segunda-feira em prisão preventiva, em Luanda, a aguardar julgamento precisamente por alegados crimes cometidos na gestão do fundo soberano do país.
“Eu não mexi em filhos do ex-Presidente, mexi em cidadãos angolanos. São cidadãos angolanos, estão sujeitos, tanto como os outros, às mesmas regras. Nesses oito meses não foram exoneradas apenas duas pessoas”, responderia, quatro meses mais tarde, João Lourenço.
Nas empresas de distribuição de electricidade e água, à Imprensa Nacional, passando pelas cinco empresas públicas de comunicação social, agências e bancos estatais, Banco Nacional de Angola, houve exonerações.
As empresas estatais diamantíferas e mineiras — Endiama, Sodiam e Ferrangol — viram igualmente as administrações exoneradas, assim como as três empresas de comboios do país e as dos portos nacionais (de Luanda e Lobito).
Não escaparam ao decreto de exoneração assinado por João Lourenço históricos da liderança de José Eduardo dos Santos, como os generais António José Maria, afastado do cargo de chefe do Serviço de Inteligência e Segurança Militar, e Leopoldino Fragoso do Nascimento, de consultor do ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República.
João Lourenço afastou ainda o comandante-geral da Polícia Nacional, comissário-geral Ambrósio de Lemos Freire dos Santos, e o chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas, general Geraldo Sachipengo Nunda.
Procuradoria-Geral da República, Tribunal Constitucional, Tribunal Supremo e Tribunal de Contas também contaram, no último ano, com novas lideranças, ao fim de vários anos, tendo mexido ainda na rede diplomática, com o afastamento de cerca de duas dezenas de embaixadores.
Folha 8 com Lusa
Admiro a coragem e mérito da decisão de deter os arguidos, nomeadamente do filho do ex-presidente JES. No entanto, tal medida vai ter consequências. Não acredito que JES e seus apaniguados se quedem pela inércia. Vai dar “maka” como dizem os angolanos. Os mesmos magistrados que louvavam JES, prendem-lhe agora o seu filho. Inacreditável. Se antes eram subservientes, passaram agora a corajosos. Não acredito. A titulo de exemplo, lembre-se a bajulação feita pelo Presidente do TC. aquando da investidura de JLO. Fartou-se de elogiar JES, quando o seu papel se deveria cingir à isenção e imparcialidade e abstenção de formular considerações políticas. Um autêntico desaforo, o que leva a concluir que a magistratura está com quem está no poder. Aliás, todos ou grande parte dos detentores de cargos de direcção trabalharam com JES e eram homens da sua confiança. Temo o pior. Vai haver “maka”.