Existe crise nos meios de propaganda do Estado?

O Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) exige a suspensão imediata das “reformas compulsivas” e cortes salariais nos órgãos de comunicação detidos pelo Estado, atribuindo a situação financeira dessas empresas à sua utilização passada como “instrumentos de luta política”. Se fosse passada…

A posição consta das conclusões da assembleia de auscultação realizada em Luanda pelo SJA, convocada expressamente “para abordar as medidas em curso nos órgãos de comunicação social públicos”.

“Os jornalistas não são responsáveis pelo estado actual deficitário das empresas de comunicação social”, lembrou, na leitura das conclusões, o presidente do SJA, Teixeira Cândido, acrescentando que “foi o Governo” que “permitiu aos anteriores gestores a contratação de funcionários sem critérios nem transparência”, bem como “a não deposição das contribuições” para a Segurança Social.

“Foi o Governo quem fez das empresas de comunicação social instrumentos de luta política, relegando a questão da rentabilização para o segundo plano. É o Governo quem vem inibindo a expansão da imprensa, coarctando o crescimento de mais empregos”, afirma o mesmo comunicado.

O presidente do sindicato admitiu que só a reforma compulsiva estará a afectar, nesta altura, “centenas” de profissionais em todo o país.

“Não estamos contra a reforma dos trabalhadores. Estamos sim contra a forma, compulsiva, e numa altura em que as empresas não têm um instrumento de carreira. Estamos igualmente contra a reforma dos melhores profissionais, mais experimentados, quando as empresas se propõem a serem rentáveis. Como conseguir isso sem profissionais de qualidade”, questionou Teixeira Cândido.

Nas conclusões divulgadas após a assembleia, o SJA “exige a suspensão imediata das reformas compulsivas”, referindo-se igualmente à “aposentadoria e corte nos salários” que afirmam estar a decorrer nas empresas estatais de comunicação social, bem como “a definição de carreiras técnicas, com base no qualificador ocupacional”, processo que deverá ser conduzido com a participação daquele sindicato, num prazo de 30 dias.

O Presidente João Lourenço pediu, em Novembro, aos novos administradores das empresas estatais de comunicação social que definam uma linha editorial “que sirva de facto o interesse público”, recordando (para que conste mas sem ser para cumprir) que não há democracia sem liberdade de imprensa.

Observadores internacionais criticaram o excesso de cobertura dada pelos órgãos de comunicação do Estado ao MPLA e ao candidato do partido na campanha para as eleições gerais de agosto passado, que culminou com a chegada ao poder de João Lourenço.

Ou seja, João Lourenço tem uma dívida, pelo menos uma, de gratidão para com todos aqueles que engavetaram a liberdade de imprensa para o levar ao colo até à Presidência da República.

“Não há democracia sem liberdade de expressão, sem liberdade de imprensa. Direitos consagrados na nossa Constituição e que o executivo angolano, primeiro do que quaisquer outras instituições do Estado angolano, tem a obrigação de respeitar e cumprir”, afirmou o chefe de Estado, durante a cerimónia de tomada de posse dos novos conselhos de administração dos órgãos de comunicação social públicos que escolheu à medida e por medida.

João Lourenço exonerou a 9 de Novembro as administrações de todas as empresas públicas de comunicação social, tendo nomeado novos administradores para os cargos designados pelo anterior chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, casos da Televisão Pública de Angola (TPA), Rádio Nacional de Angola (RNA), Edições Novembro (proprietária do Jornal de Angola) e Agência Angola Press (Angop).

Aos novos administradores, empossados no palácio presidencial, em Luanda, João Lourenço disse que “devem procurar encontrar uma linha editorial que sirva de facto o interesse público, que dê voz, que dê espaço, aos cidadãos dos mais diferentes estratos sociais”, mas também que “dê espaço às organizações da chamada sociedade civil”.

João Lourenço defendeu que, enquanto elementos da administração destes órgãos, têm a “responsabilidade” de “encontrar o ponto de equilíbrio, no sentido de satisfazerem o interesse público”.

Brincar com os matumbos

José Ribeiro, director do “Jornal de Angola” e PCA das Edições Novembro, foi demitido mas, aparentemente, foi-lhe prometido, como prémio pelos leais serviços ao MPLA, a prebenda de uma nomeação como adido de imprensa na missão de Angola em Nova Iorque.

Contudo, como bem recordou Rafael Marques, parece que José Ribeiro se encontra envolvido em demasiadas peripécias financeiras, pelo que começará a ser difícil apanhar o avião para Nova Iorque. “É mais provável que se auto-exile no país que adorava insultar e espezinhar, e onde agora passa mais tempo: Portugal. Caso esteja em Angola, poderá passar os próximos tempos entre a Rua Amílcar Cabral, onde se situa o Tribunal Cível, que cobra dívidas, e a Cadeia de Kakila ou a do Calomboloca, que esperam a chegada dos prevaricadores financeiros”, escrevia o Maka Angola.

“José Ribeiro tem uma grande dívida contraída junto de variados credores: ultrapassa os 15 milhões de dólares. Parte dessa dívida resulta da compra de uma impressora rotativa com 15 anos de uso por quatro milhões de dólares. Os fornecedores deram-lhe dez dias para pagar 320 mil dólares da dívida.

Todavia, a situação mais grave prende-se com as averiguações em curso no Tribunal de Contas, que foi confrontado com a falta de justificação para movimentos financeiros no valor de 12 milhões de dólares na empresa proprietária do Jornal de Angola, as Edições Novembro. Para simplificar, digamos que foi encontrado um “buraco” financeiro na gestão de José Ribeiro na ordem de muitos milhões de dólares. Outros administradores que participaram na gestão de José Ribeiro já confessaram às nossas fontes a sua angústia e preocupação por terem de responder pela gestão perdulária de Ribeiro”, escrevia Moiani Matondo no Maka Angola em 29 de Março de 2018.

Moiani Matondo acrescentava que, “diante de tantas e tão graves desventuras, José Ribeiro resolveu ignorar todos os pedidos de explicação, e não atende o telefone a ninguém que pretenda obter as satisfações adequadas. E, agora, João de Melo procura encontrar uma saída para evitar a nomeação de José Ribeiro como adido de imprensa em Nova Iorque.”

“No entanto, a verdade é que Nova Iorque não é pouso seguro para nenhum dos antigos colaboradores de José Eduardo dos Santos, a partir do momento em que os norte-americanos accionem os meios legais à sua disposição para responsabilizar aqueles que participaram em actividades de corrupção ou abusos de direitos humanos. Ora, os 12 milhões de dólares desaparecidos pesarão sobre a cabeça de José Ribeiro em qualquer parte do mundo”, afirmava Moiani Matondo.

Por fim acrescentava: “Também pode acontecer que todo este barulho que se ouve contra a corrupção e os desvios financeiros dos protegidos do antigo presidente da República José Eduardo dos Santos seja fogo-de-vista. Isto é, muito barulho para nada… ou apenas para “convencer” JES a abandonar a presidência do MPLA e a entregar todo o poder a João Lourenço. Assim, todos continuarão com a sua vidinha. Neste caso, José Ribeiro acabará mesmo por tomar o avião para Nova Iorque… Veremos!”

Folha 8 com Lusa e Maka Angola

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