Todos devem, mas (claro!)
nem todos querem pagar

O Governo angolano indicou esta quinta-feira que vai dar uma moratória de nove meses às empresas contribuintes para regularização voluntária da dívida com a segurança social, sob pena de a Segurança Social proceder à execução. Novidade? Nenhuma, em rigor. O que o Executivo hoje diz é que consta do artigo 17 da proposta de lei que aprova o Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2019.

Segundo o secretário de Estado para o Trabalho e Segurança Social, Manuel Moreira, para regularizar ou amortizar as dívidas, as empresas podem fazer um acordo de até 60 prestações, prevendo a lei que, dependendo da situação financeira da empresa, o acordo poderá ser alargado.

Numa nota de imprensa divulgada esta quinta-feira, Manuel Moreira esclareceu que, nos casos em que a regularização da dívida for feita de forma voluntária, a lei prevê a isenção do pagamento de todos os juros vencidos, bem como a prescrição ou inspecção dos procedimentos contravencionais e das multas referidas na dívida.

A Segurança Social está a trabalhar na dívida de mais de 70 empresas públicas, que são também as mais devedoras, acrescentou, sem as apontar. A proposta está contida no Projecto de Lei de Autorização Legislativa que autoriza o Presidente da República a legislar sobre o Regime Jurídico de Regularização e Cobrança da Dívida à Protecção Social Obrigatória.

Manuel Moreira adiantou que, em caso de incumprimento, após o fim do prazo de regularização voluntária, as empresas incumpridoras entram no processo de execução, liderado pelo Instituto Nacional de Segurança Social (INSS).

O secretário de Estado do Trabalho e Segurança Social reconheceu a existência de várias pessoas singulares beneficiárias ou participantes da Segurança Social que recebem pensão indevida ou fraudulenta, bem como empresas ou contribuintes que são incumpridores em relação à obrigação de pagar as contribuições: “As empresas incumpridoras são dos mais variados sectores e a Segurança Social está a fazer um trabalho exaustivo para se calcular as dívidas”.

Não solicitando a regularização de forma voluntária, acrescentou, a lei prevê que o INSS deve executar a dívida. “Vai produzir uma certidão executiva da dívida, que será executada com os vários elementos que a lei concede ao INSS, que vão desde a penhora dos móveis e imóveis à hipoteca, no sentido de fazer com que a obrigação da empresa seja liquidada por meios financeiros ou não financeiros”, disse.

O projecto foi aprovado já nas comissões de especialidade da Assembleia Nacional, devendo ser discutido e aprovado na generalidade na plenária marcada para 21 deste mês.

O secretário de Estado assegurou que está a ser feito um trabalho de sensibilização para que as empresas tomem consciência da necessidade da contribuição social. “É isso que dá equilíbrio à Segurança Social. Precisamos de ter a relação do pagamento da pensão com a equilibrada. As que não procederem desta maneira, o executivo tem mecanismos para poder executar as empresas”, salientou.

Manuel Moreira referiu que a proposta de lei estabelece que a execução da dívida é abrangente até aos sócios e gestores das empresas. A ideia, precisou, é ter uma segurança social “mais digna, equilibrada e tranquila” para os seus beneficiários.

Repetir, repetir até à exaustão

Em tempos a Assembleia Nacional de Angola já tinha aprovado perdão fiscal para os contribuintes com dívidas ao Estado anteriores a… 2013.

A medida abrangia, recorde-se, dívidas relativas ao Imposto Industrial, Imposto sobre os Rendimentos do Trabalho por conta própria, Imposto do Selo, Imposto sobre a Aplicação de Capitais e Imposto Predial, explicitou na altura o director-adjunto da Unidade Técnica Executiva para a Reforma Tributária.

A medida envolvia o perdão das dívidas, juros e multas resultantes de incumprimentos praticados por contribuintes individuais e empresas “até 31 de Dezembro de 2012″, precisou aquele responsável.

Mas o perdão não era geral. “Não são beneficiadas por esta medida as empresas públicas ou as empresas privadas cujo capital seja maioritariamente público, nem as empresas do sector petrolífero e mineiro – sujeitas aos regimes especiais de tributação – e também as empresas cujo objecto social esteja na periferia desses sectores”, adiantou Gilberto Luther.

Apesar de admitir que este perdão fiscal representa uma “eventual perda de receita” para o Estado, também funcionará, disse, como um “estímulo à economia e ao consumo das famílias”, constituindo-se como uma “recapitalização das empresas.”

O perdão da dívida fiscal confere benefícios aos contribuintes, bem como baliza o início da Reforma Tributária no país, afirmou no dia 11 de Dezembro de 2014, em Luanda, o técnico da Direcção Nacional de Impostos, Cláudio Santos.

Segundo Cláudio Santos, que falava no “workshop” sobre “As Implicações do Novo Pacote Tributário na Execução Orçamental”, com esse perdão, pretende-se que os contribuintes tomem consciência das suas obrigações fiscais, porque, a partir do próximo ano, a administração será mais rígida na sua actuação.

Acrescentou que o perdão fiscal incluído na Reforma Tributária, em curso no país, abrange, entre outros, os impostos industrial, de rendimento de trabalho, de selo e sobre a aplicação de capital.

Cláudio Santos explicou que não estão abrangidos pelo perdão fiscal as contribuições da segurança social e as dívidas aduaneiras.

“O perdão fiscal compreende, em termos concretos, o perdão de impostos de si mesmo, quer estejam ou não apurados, as multas que resultam de impostos apurados ou não e também os juros, quer os compensatórios, quer os de mora, que são calculados sobre os impostos na eventualidade do contribuinte não ter cumprido com as suas obrigações fiscais”, sublinhou.

Os beneficiários do perdão de dívidas fiscais, continuou, são todos os contribuintes, exceptuando aqueles que são classificadas como empresas públicas ou com o capital maioritariamente público, ou seja, àquelas em que o Estado participa com um capital superior a 50 por cento.

“Não estão também abrangidas no perdão de dívidas, as empresas que são tributadas no regime especial de tributação (empresas do sector petrolífero e diamantífero), nem aquelas cujo objecto social inclui actividades petrolíferas”, explicou.

O técnico fez igualmente saber que o perdão de dívidas também não se implica aos processos que já tenham tramitado em tribunal.

Dívidas do próprio Estado

Angola vai ter de desembolsar oito biliões de kwanzas (30.000 milhões de euros) no resgate da dívida interna e externa entre 2019 e 2022.

A informação resulta de uma análise ao Plano Anual de Endividamento (PAE) para 2018, do Ministério das Finanças, que aponta para um pico de desembolsos em 2020, ano em que o total de resgates a pagar pelo Estado ascenderá a 2,6 biliões de kwanzas (9.800 milhões de euros).

Em 2019 estão previstos resgates, entre dívida interna e contraída externamente, na ordem dos 2,2 biliões de kwanzas (8.400 milhões de euros), em 2021 no valor de 1,5 biliões de kwanzas (5.700 milhões de euros) e em 2022 de 1,7 biliões de kwanzas (6.500 milhões de euros), seguindo-se depois numa curva fortemente descendente de desembolsos.

O documento reconhece que em termos de dívida interna, a maturidade média residual da carteira da dívida é de aproximadamente 5,12 anos, que desce para 2,16 anos quando retiradas as emissões especiais.

Já na dívida externa, a maturidade média situa-se em cinco anos, “sendo que apenas 7% vence entre 1,5 a 2 anos”, lê-se no documento.

O Governo angolano prevê captar 6,721 biliões de kwanzas (23.800 milhões de euros) de dívida pública em 2018, totalizando 54.500 milhões de euros de endividamento até final do ano, para “colmatar as necessidades de financiamento” do Orçamento Geral do Estado (OGE), igualmente de acordo com o PAE.

“O stock de dívida governamental deverá permanecer com a tendência de crescimento verificada nos anos anteriores, que se fundamenta numa maior participação da dívida titulada”, refere o documento, apontando um crescimento de 18% face a 2017.

A cumprir-se, por outro lado, a previsão governamental de crescimento económico de 4,9% em 2018, o rácio da dívida pública angolana deverá ascender no final do ano a 60% do Produto Interno Bruto (PIB).

Desta forma, Angola deverá chegar ao final de 2018 com um volume de dívida pública governamental (excepto empresas públicas) de aproximadamente 14,302 biliões de kwanzas (54.500 milhões de euros).

O serviço da dívida governamental totalizará em 2018 cerca de 5,665 biliões de kwanzas (21.500 milhões de euros), dos quais cerca de 65% corresponderão aos encargos com a dívida interna e 35% com a divida externa.

O ministro das Finanças de Angola alertou que o peso da dívida pública ameaça “hipotecar as gerações futuras”, defendo por isso que o eventual diferencial entre as receitas do petróleo, com a subida da cotação, seja utilizado na amortização.

Em causa está o preço de referência de 50 dólares por barril utilizado pelo Governo angolano para elaborar o OGE para 2018, quando o valor no mercado internacional tem estado acima dos 60 dólares, tendo mesmo chegado a tocar nos 70 dólares.

“O melhor é continuarmos a pensar no preço de referência definido no Orçamento Geral do Estado para 2018. Logicamente que se ao longo do exercício fomos verificando os aumentos que estamos a verificar até agora, isso significará para nós, em termos de gestão das finanças públicas, menor pressão sobre a dívida pública”, admitiu o ministro Archer Mangueira.

O petróleo representa um peso de 95% sobre o total das exportações angolanas, tendo o Governo angolano estimado no OGE para 2018 – aprovado quarta-feira na Assembleia Nacional -, encaixar 2,399 biliões de kwanzas (9.150 milhões de euros) com impostos decorrentes das vendas de crude ao exterior.

“Temos de alterar a actual trajectória da dívida, sob pena de estarmos a hipotecar as gerações futuras. Portanto, o objectivo deve ser usar a folga que for obtida pelo diferencial do preço do petróleo, comparativamente ao preço de referência definido no Orçamento Geral do Estado, para reduzir a pressão sobre a dívida”, disse Archer Mangueira.

Folha 8 com Lusa

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