O corpo do agente Ermiro Jamba Calima, em vida afecto à 10ª unidade da Polícia de Guarda Fronteiras, continua a revolver-se na campa clamando por justiça. A família desdobra-se diariamente à busca da mesma, com o propósito de poder, depois, compreender como e porquê foi morto e assim dar uma explicação completa aos filhos órfãos do agente.
Por Sedrick de Carvalho
Com parcos recursos, a família constituiu um advogado. Luís Nascimento, o exímio e destemido defensor dos 15+2, logo, meu também, é o advogado da família. A sua reputação dispensa apresentações.
Mas os responsáveis pela morte de Ermiro estão acobertados pelas forças estatais, das quais fazem parte, nomeadamente, o Serviço de Investigação Criminal (SIC), Polícia Nacional e a Assembleia Nacional. Nesta última instituição, um órgão de soberania, é onde está alcandorado o deputado Mário Salomão, apontado como o mandante, executado por funcionários do SIC e PN às ordens do comandante provincial e delegado do Ministério do Interior no Moxico, o infame comissário Dias do Nascimento.
Entretanto temos descurado outra relação de influência de Mário Salomão. E se praticamente é impossível colocar nas barras do tribunal um deputado, então é ainda mais quando se trata de alguém com ligações estreitas com o governo.
Mário Salomão, para além de deputado pelo MPLA, tem a total protecção de um ministro de João Lourenço, o ex-governador-dono do Moxico, João Ernesto dos Santos «Liberdade». Este actualmente controla o Ministério dos Antigos Combatentes e Veteranos de Guerra, ou seja, um ministério que mais serve os dirigentes por não estar rigorosamente ao serviço dos antigos combatentes.
A relação de «Liberdade», conhecido como Saquinta no Moxico, e Mário Salomão é longa, ambos naturais do Moxico, onde o deputado foi subordinado directo por vários anos do agora ministro, ocupando o cargo de vice-governador para a Organização e Serviços Comunitários, de 1993 a 2010, ano em que passou para o Parlamento.
Tão logo Mário Salomão se tornou adjunto do «Liberdade» criou, com este e mais onze sócios, a empresa Luaxi. Enquanto o registo oficial aponta que tem a sua sede no Luena, desconhece-se as suas instalações e qualquer actividade na província. Dentre as actividades que pode exercer destacam-se a exploração mineira e “quaisquer outros ramos” que os sócios decidam realizar. Como vender pão, desde que queiram.
Porém, a Luaxi tem actividade nas Lundas, onde tem operado em minas de diamantes, explorando a mão-de-obra barata de congoleses, principalmente, estes mesmo que estão a ser expulsos do território sem se respeitar os direitos humanos, enquanto os manda-chuvas, como Mário Salomão e «Liberdade», são intocáveis e impronunciáveis.
Se não bastava o ministro-empresário como suporte, tem ainda outro sócio no mesmo ministério. Manuel Gouveia foi director de gabinete de «Liberdade» quando era governador do Moxico, e quando Saquinta mudou-se para o governo central, em 2017, levou o seu sócio, passando a ocupar igualmente o cargo de director de gabinete do ministro dos Antigos Combatentes e Veteranos da Pátria.
Como se nota, Mário Salomão tem uma muralha fortíssima como protecção, daí o envolvimento directo do Ministério do Interior, que chegou a emitir uma declaração negando o assassinato do agente Calima, alegando que a morte ocorreu quando Ermiro “pendurou-se no gradeamento de uma das janelas de onde caiu, acabando por embater intensamente com o crânio no chão”. As imagens mostram o contrário, evidenciando-se as marcas de tortura física.
As fontes policiais contactadas desmentiram essa versão, sob anonimato, e reforçaram que tudo foi feito mediante orientação directa do comandante provincial, e este agiu depois da queixa feita pelo deputado, como escrevemos em dois artigos aqui publicados.
É este o cenário que enfrentará o advogado Luís Nascimento e o seu escritório, numa peleja profundamente desigual. Restará saber de que lado se posicionará o tribunal, se estará ao serviço da justiça sem olhar para a qualidade dos sujeitos, com os olhos vendados e a balança equilibrada, ou manter-se-á fiel à protecção leonina dos poderosos.