O procurador-geral da República de Angola, Hélder Pitta Grós, disse hoje, em Luanda, que a empresária Isabel dos Santos foi notificada para prestar esclarecimentos em dois processos-crimes, um em que é acusada e outro em que é a queixosa.
Em causa está o envio de uma notificação da PGR à Isabel dos Santos, para prestar esclarecimentos sobre a sua gestão enquanto responsável máxima da Sonangol, concessionária angolana de hidrocarbonetos, e de um outro processo em que a mesma acusa o seu substituto, Carlos Saturnino, de difamação.
Questionado pela agência Lusa, Hélder Pitta Grós afirmou que Isabel dos Santos “foi de facto notificada”, mas “não é de grande relevância o facto de ela não ter comparecido”.
“Porque isso tem acontecido com outros cidadãos que não têm comparecido e que têm justificado as suas ausências, a questão dela é que não se fez presente, não apresentou nenhuma justificação e vamos voltar a notificá-la, como temos feito noutros casos”, explicou o Procurador-Geral da República.
Quanto à data da próxima notificação, Pitta Grós disse que isso depende do magistrado do processo, que tem outros casos em mãos.
“Há dois processos. Há um processo-crime em que ela é que é a queixosa, portanto, ia ser ouvida como queixosa, e outro processo, que é de inquérito, que ela ia ser ouvida também”, salientando o PGR que a notificação era para prestar esclarecimentos em ambos os processos.
Segundo o Procurador-Geral da República, os dois processos estão “parados, aguardando somente que ela seja ouvida”.
Isabel dos Santos “por poucas vezes está no país, [por vezes] está fora, nunca se sabe”, explicou Pitta Grós, que justificou a acção da justiça angolana: “Queríamos aproveitar o momento, em que sabíamos que ela estava no país, para notificá-la e resolvermos as duas questões, porque ambos os processos estão parados, aguardando somente que ela seja ouvida”.
A primeira, das três notificações possíveis, foi entregue a 17 de Julho, para que a empresária fosse ouvida no dia seguinte, o que não aconteceu.
A 28 de Fevereiro deste ano, o actual presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Carlos Saturnino, acusou a empresária de ter gasto 135 milhões de dólares com consultoria e de ter autorizado uma transferência de outros 38 milhões de dólares, um dia depois da sua exoneração.
O gestor denunciou, igualmente, entre outras alegadas irregularidades, a existência de um suposto “caixa dois”, para o processamento de salários fora do circuito normal de pagamentos.
Isabel dos Santos foi exonerada do cargo de presidente do Conselho de Administração da Sonangol, em 15 de Novembro de 2017, depois de ter assumido as funções em Junho de 2016.
Sobre o assunto, a empresária fez sair uma nota distribuída aos órgãos de comunicação social, na qual negava ter sido notificada pela PGR, sublinhando que foi com “surpresa” que soube das informações veiculadas pela imprensa.
“No seguimento de notícias publicadas a engenheira Isabel dos Santos vem por este meio esclarecer que não recebeu qualquer notificação da Procuradoria-Geral da República de Angola. Foi com surpresa que a engenheira Isabel dos Santos tomou conhecimento através da comunicação social que teria sido notificada para responder sobre actos da sua gestão na Sonangol, onde assumiu funções de Presidente do Conselho de Administração”, referia o referido comunicado.
Recorde-se, entretanto, o que Patrick Pouyanné, CEO da Total, disse sobre a liderança de Isabel dos Santos na petrolífera nacional: “A Sonangol está a fazer exactamente aquilo que nós fizemos. Quando o preço do petróleo caiu todos sentimos dificuldades. A sua prioridade tem sido a transformação e equilíbrio das contas, o que tem sido positivo e permite voltar a pensar no desenvolvimento”.
Por sua vez, Eldar Saetre, CEO da Statoil disse: “Estamos em Angola há 26 anos e por isso temos uma grande experiência neste mercado que tem sido muito importante para a nossa empresa. Sempre tivemos uma relação muito próxima com a Sonangol e queremos mantê-la por muito tempo. Por isso estamos para ficar e encontrar novas oportunidades de colaboração com a Sonangol”.
Também Clay Neff, presidente da Chevron África afirmou: “Vemos as mudanças que a Sonangol está a fazer com muitos bons olhos. Existe uma colaboração muito positiva entre a Sonangol, a Chevron e os outros membros da indústria para melhorar as condições de investimento em Angola”.
Em Setembro de 2015, o director da maior petrolífera estrangeira em Angola, a Total, avisou o governo angolano de que se os custos de investimento não descessem significativamente, o país arriscava-se a ficar sem indústria do petróleo.
“Se não houver uma significativa redução dos custos, tudo vai parar”, disse o director-geral da Total em Angola, Jean-Michel Lavergne, em declarações à agência financeira Bloomberg, nas quais explicou que caso as condições não melhorem, a indústria petrolífera angolana “vai desaparecer”, partindo do princípio que o preço do barril de petróleo se mantém nos 60 dólares.
Em causa estavam as várias medidas que o Governo angolano tomou nos últimos anos, que fizeram os custos de produção aumentar em 500 milhões de dólares por ano, disse Jean-Michel Lavergne durante um fórum empresarial em Luanda.
Em Junho desse ano Angola ultrapassou pela primeira vez a Nigéria enquanto maior produtora subsariana, tendo bombeado 1,77 milhões de barris por ano, contra 1,9 milhões da Nigéria, embora no total de 2014 a média de produção tenha sido de 1,66 milhões, comparado com os 1,9 milhões da Nigéria.
Os poços de petróleo em águas profundas na costa de Angola têm um desenvolvimento muito caro, e a indústria precisa de preços entre 60 a 80 dólares por barril “para a operação fazer sentido”, disse Jean-Michel Lavergne.
As novas normas sobre as emissões o desperdício, aliadas aos preços baratos, significam que algumas companhias estão a pensar em sair do país, que se tornou o mais recente membro da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), em 2007, disse na altura o director da câmara de comércio EUA – Angola, Pedro Godinho.
“Há muitas petrolíferas que estão a ponderar sair do país se o cenário mundial não mudar”, disse o responsável durante o evento em que participou também o director da Total em Angola, concluindo que a solução para a quebra nas receitas fiscais e consequentes dificuldades orçamentais “não é matar a galinha que põe os ovos de ouro”.
Folha 8 com Lusa