As eleições previstas para Agosto estão a provocar uma epidemia de anedotas protagonizadas por altos dirigentes do regime/MPLA. São cada vez mais os candidatos ao anedotário nacional de Angola, sabido que é que a grande maioria não tem qualidade para entrar na edição internacional.
Agora foi a vez de o governador da província do Bié, Álvaro Manuel de Boavida Neto, apresentar publicamente a sua candidatura, apelando à necessidade dos eleitores “demonstrarem o espírito de cidadania, civismo e democracia nas eleições gerais de modo que o pleito possa servir de exemplo ao continente africano”.
Nem mesmo a modéstia diminuiu o impacto da anedota. Como acontece há 41 anos, o MPLA é o paradigma da cidadania, do civismo e da democracia, pelo que o seu exemplo será mais uma vez crucial para as principais democracias do mundo, sejam africanas ou não, como é o caso da Guiné Equatorial e da Coreia do Norte.
O governante exprimiu o sentimento hoje, quarta-feira, no Cuito (Bié), na cerimónia alusivo ao dia Internacional da Mulher (8 de Março) ao sublinhar que os angolanos devem respeito à convivência pela diversidade de opiniões. Mais uma anedota. Partindo e um partido que não respeita a diversidade de opiniões e que quer os angolanos formados e formatados à medida do MPLA, só mesmo para rir.
“A República de Angola realiza, este ano, as quartas eleições (1992, 2008, 2012 e 2017), num ambiente de paz e consolidação democrática que exigirá de toda a Nação patriotismo e ampla mobilização do eleitorado”, disse Álvaro Manuel de Boavida Neto, desta feita não só continuando a dar largas à sua veia histriónica como passando, como timbre do MPLA, um atestado de menoridade intelectual e de matumbez a todos quantos pensam fora do pensamento único.
Álvaro Manuel de Boavida Neto explicou ainda que, as eleições são uma festa, um acto de cidadania, um compromisso que envolve pessoas de todos os grupos sociais, comprometidas com o bem-estar da Pátria. Vá, pessoal. Vamos rir, ok? Vinte milhões de angolanos vivem na pobreza, mas podem rir. O riso não enche barriga, mas se calhar alimenta o espírito.
O governador do Bié esclareceu, por outro lado, que participar nas eleições é a forma mais elementar e democrática de expressar sentimento individual ou colectivo de confiança, renovação ou até de “repulsa” a quem detém o poder. E acrescentou que, nalguns casos, é a “chave” para transferir a outrem o direito legítimo de governar.
Esta parte da intervenção de Álvaro Manuel de Boavida Neto não estava no guião. Vai, aliás, ser chamado a explicar-se junto dos detentores das “ordens superiores” porque, como se sabe, nenhum discurso do MPLA pode falar de renovação ou repulsa em relação ao poder que nos (des)governa há 41 anos.
A província do Bié, centro de Angola, 1.455.225 habitantes, sendo 763. 632 mulheres.
Apesar destas novas tentativas, o cabeça-de-lista do MPLA às próximas eleições gerais em Angola, previstas para Agosto, general João Lourenço, lidera as candidaturas ao anedotário mundial. O seu principal contributo foi quando, no dia 28 de Fevereiro, prometeu um “cerco apertado” à corrupção, que está a “corroer a sociedade”, e o fim da “impunidade” no país.
O vice-presidente do MPLA e ministro da Defesa Nacional discursava no Lubango no primeiro acto oficial de massas da pré-campanha às eleições gerais.
Perante mais de 100.000 apoiantes, segundo números da organização, João Lourenço foi fortemente aplaudido ao destacar aquilo que o regime sempre negou ou minimizou: que a corrupção em Angola é um “mal que corrói a sociedade”, prometendo combatê-la.
Embora saiba que Angola é um dos países mais corruptos do mundo, suavizou a questão dizendo que a corrupção é um fenómeno que afecta todos os países. João Lourenço advertiu que o problema é a “forma” como Angola encara o problema: “Não podemos é aceitar a impunidade perante a corrupção”. Como anedota passou a ser séria candidata a figurar no top da enciclopédia mundial que reúne as melhores piadas do mundo onde, aliás, figuram muitas outras protagonizadas por excelsos correligionários de João Lourenço, com destaque para sua majestade o rei José Eduardo dos Santos.
Segundo a Constituição do MPLA (dita angolana nos aspectos que mais interessam ao regime), o Presidente da República é o cabeça-de-lista do partido mais votado nas eleições gerais no círculo nacional, lista que será liderada em 2017 por João Lourenço.
Falando a partir de um palco com duas fotografias de grande dimensão de José Eduardo dos Santos – chefe de Estado, Titular do Poder Executivo e presidente do MPLA (cargo em que se manterá até 2021, pelo menos) – e do cabeça-de-lista do partido, João Lourenço prometeu um “cerco apertado” ao “grande mal” da corrupção e apoio aos empresários que trabalham de forma honesta.
João Lourenço recordou que os empresários têm “apenas três obrigações fundamentais”, nomeadamente licenciar a empresa, pagar “atempadamente” os salários e os impostos ao Estado. Coisas novas, portanto. Uma importante inovação do programa de João Lourenço.
“De resto, deixem-nos trabalhar. Não ponham mais dificuldades”, sublinhou João Lourenço, referindo-se aos problemas que os empresários enfrentam para investir em Angola devido, disse, ao conhecido pagamento de “gasosas” para ultrapassar as “pedras no caminho”.
“Se conseguirmos combater a corrupção, até os corruptos vão ganhar com isso”, ironizou, num discurso transmitido em directo (tudo está na mesma a favor dos mesmos) pela Televisão Pública de Angola (TPA) e pela Zimbo.
“Que sejamos nós, que não seja a oposição, a tomar a dianteira no combate a este mal”, apelou, sobre o combate ao ADN do regime e que dá, desde 1975, pelo nome de corrupção.
Num discurso de uma hora, João Lourenço prometeu a descentralização e municipalização do país, mas sem se referir às primeiras eleições autárquicas em Angola, ainda por agendar.
A saúde é outra das vertentes prioritárias (tão prioritária quanto velhinha a nível de promessas do MPLA) da candidatura de João Lourenço, bem como o aumento da produção nacional, para travar as importações.
“É uma vergonha que a carne para o nosso cidadão tenha que ser importada, quando podemos produzir o gado cá na terra”, disse, prometendo fazer de Angola “um verdadeiro celeiro”. Estará João Lourenço a passar um atestado de incompetência a José Eduardo dos Santos? Não. Nada disso. Está apenas a repetir o rol de promessas que o MPLA tem feito há 41 anos.
Em termos de investimento, e num momento em que Angola enfrenta ainda uma crise económica e financeira devido à quebra nas receitas do petróleo, o candidato voltou a falar no envolvimento dos privados na reconstrução nacional.
“Vamos criar parcerias público-privadas para recuperar as infra-estruturas (…). Não precisa de ser o Estado sozinho a construir”, apontou, aludindo à intenção de atribuir “concessões” por vários anos a privados (envolvendo construção e gestão), mas sem especificar em que áreas.
Na intervenção, a primeira pública como cabeça-de-lista do MPLA, João Lourenço prometeu ainda uma revisão na política de imigração, tornando “mais fácil e simplificado” o processo de concessão de vistos a estrangeiros.
“Vamos abrir a política de vistos e fazer um controlo muito mais cerrado à entrada de ilegais. Vamos combater seriamente os ilegais, aqueles que pulam a janela e nos surpreendem no quarto. E abrir mais a porta da frente da nossa casa, para os legais”, enfatizou, acusando os imigrantes ilegais de estarem a levar para fora de Angola, ilicitamente, recursos minerais, como diamantes. Não, não estava a falar de Sindika Dokolo.
“Precisamos de ganhar as eleições. Temos a vitória nas nossas mãos, não a deixemos fugir”, apelou João Lourenço. Não. não fugirá. Esta foi, aliás, uma humorística alusão a uma vitória que há muito está garantida.