Vários amigos perguntaram-nos, na passa terça-feira (dia 7), se era verdade que o nosso Director, William Tonet, sofrera um atentado e que estaria gravemente ferido. Não era totalmente verdade. Ou seja, sofreu um atentado mas foi no dia seguinte e saiu ileso. Coincidências.
Por Orlando Castro
A pergunta desses nossos amigos baseava-se no que, em Luanda e em círculos próximos do regime, se comentava à boca pequena. Foi um mal-entendido, concluímos nesse dia, terça-feira. No entanto, habituados a estas coisas, ficamos a pensar que por regra não há fumo sem fogo.
Eis senão quando, no dia seguinte (quarta-feira), William Tonet viajava para Benguela, e na zona de Kikombo, antes da Canjala, na estrada Luanda-Benguela, um “camionista” chinês, ao serviço da Casa de Segurança da Presidência da República, resolveu – certamente cumprindo “ordens superiores”- abalroar a viatura em que o nosso Director seguia, atirando-a por uma ribanceira abaixo.
O carro capotou várias vezes mas, mais uma vez, William Tonet e os seus acompanhantes saíram (mais ou menos) ilesos. No meio da confusão gerada, e antes de se porem em fuga, os ocupantes da viatura pesada que originou o acidente foram ver “in loco” se tinham consumado a missão. Pelo sim e pelo não, até porque era já noite (19,30 horas) brindaram as vítimas com uns tiros.
De acordo com os agentes da Brigada Especial de Trânsito, que mais tarde tomaram conta (isto é, tomaram conhecimento) do acidente, o camião assassino estava a ser tripulado por um chinês, ao serviço da Casa de Segurança da Presidência da República, sendo que a “tripulação” destes monstros da estrada inclui sempre, para além de um motorista por regre chinês, militares da UGP (Unidade da Guarda Presidencial).
Também foi possível apurar que esta ”unidade especial” que domina as nossas estradas e que se presta a todos os serviços, goza de total impunidade. Quando, por um mero acaso, são abordados pela Polícia, a resposta chega pelos seus co-pilotos (os militares da UGP) que apenas dizem estar ao serviço do general Kopelipa, o que significa luz verdade para fazerem tudo o que quiserem, até mesmo assassinar.
Aliás, ainda nos recordamos que em Setembro de 2013, a UGP protagonizou igualmente uma tentativa de assassinato de William Tonet. Quando saía da Faculdade onde lecciona, no Morro Bento, em Luanda, a sua viatura foi abalroada de frente por um veículo da UGP, tendo os militares saído da viatura e apontado as armas a William Tonet e fazendo diversas ameaças verbais.
Recordemos o que se passou nesse Setembro de 2013, recorrendo a um trabalho da Deutsche Welle:
“William Tonet viu o seu carro ser abalroado, na noite passada (24.09), pela Unidade de Guarda Presidencial da República de Angola, em Luanda. O visado é o director do “Folha 8”, o único jornal considerado independente no país.
Na noite de terça-feira (24.09), cerca das 22:50 horas em Angola, o jornalista e advogado angolano, William Tonet, que saía da Faculdade onde lecciona, situada no Morro Bento, em Luanda, numa rua estreita deparou-se com uma coluna de três viaturas da Unidade de Guarda Presidencial da República de Angola (UPG) em sentido contrário.
William Tonet é director do “Folha 8”, um dos mais antigos jornais independentes de Angola e já tem nas costas mais de 80 processos-crimes, na sua maioria movidos por pessoas próximas do poder, sobre alegadas calúnias, difamação e injúria. Contudo, o jornalista nunca cumpriu pena de cadeia por crimes jornalísticos.
Aos microfones da DW África, Tonet, que é também dirigente da Coligação Ampla de Salvação de Angola-Coligação Eleitoral (CASA-CE), desvendou mais pormenores do sucedido.
DW África: O que é que na realidade aconteceu?
William Tonet (WT): Abalroaram a minha viatura na parte frontal esquerda, no lado do condutor, e depois puseram-se em fuga como se nada tivesse acontecido. Tentei, depois do susto, fazer uma perseguição para tirar satisfações, mas fui dissuadido por outros automobilistas que, por precaução, me aconselharam a não o fazer porque poderiam mesmo disparar, perante a ameaça prévia que havia sido feito na sua retirada.
DW África – Foi um acidente ou algo mais sério?
WT: Eu não quero ainda especular. Acho que eles tinham possibilidade de consumar se fosse algo premeditado. O que é real é uma série de factos que vêm acontecendo contra a minha pessoa. Pode ser mera coincidência. O facto de ontem também pode ser mais uma mera coincidência, mas que está ligado a determinados sectores e isso naturalmente levanta sempre suspeição. Pode ser que seja um mero incidente por desrespeito às leis de trânsito do condutor ou do seu chefe de equipa.
É verdade também que não se justifica sempre que essa unidade presidencial ande em sentido contrário, mesmo quando nada o justifique e com a violência com que o fazem. Por outro lado, eu já tive também um sobrinho que morreu assim. Foi alvejado em plena luz do dia na zona do Prenda e quando lá fomos não houve consequências de nenhuma espécie.
Ontem aconteceu a mesma coisa. Abordámos a unidade policial mais próxima e disseram-nos que, em relação à UGP, eram incompetentes para o tratamento de qualquer ocorrência. Abordada a própria UGP, dizem que não podem confirmar porque não tinham viaturas sem matrículas, quando se sabe que as suas viaturas não têm matrículas quando andam na rua.
DW África: Vai apresentar queixa ou levar o caso mais avante?
WT: Por mais provas que nós tenhamos, como em todos os casos em que temos vindo a ser acusados, a ser impedidos de trabalhar, pesadas todas as provas e evidências, o regime mostra-se insensível quando se trata do nosso caso. Portanto, nós vamos continuar a resistir, a rezar.
Esperamos que, efectivamente, não tenha mão do senhor Presidente da República [José Eduardo dos Santos], dos serviços de inteligência ou da Procuradoria-Geral da República que, de forma recorrente, têm acções inamistosas em relação à nossa independência de pensamento. Se se comprovar que houve mão deste órgão será muito mau para o próprio regime, mas eu quero entender que qualquer acção que possamos fazer, com as instituições partidocratas que temos, redundará em nada.”
É caso para, mais uma vez, se perguntar: Senhor general Kopelipa qual é a sua intenção?
Se é mesmo a de consumar um assassinato através de agentes da Casa de Segurança da Presidência ou apenas destruir as viaturas, já vai na segunda e a culpa morre sempre solteira?
A nossa missão é informar e abordar, quando questionados os temas com frontalidade, fruto da manutenção da nossa independência. Estamos, aliás, convictos de só a verdade pode curar, por muito dolorosa que seja. Não somos, corrobore-se, responsáveis pelo facto de o Presidente José Eduardo dos Santos preferir ser assassinado pelo elogio do que salvo pela crítica.
Como o nosso compromisso sagrado é apenas com o que pensamos ser a verdade, a luta é contínua e a (nossa) vitória será acertada, na democracia real, mesmo que alguns tombem pelo caminho. Talvez de derrota em derrota até à vitória final.
Recordemos agora e sempre Frei João Domingos quando afirmou que os políticos e governantes angolanos só estão preocupados com os seus interesses, das suas famílias e dos seus mais próximos.
“Não nos podemos calar mesmo que nos custe a vida”, disse Frei João Domingos, acrescentando “que muitos governantes que têm grandes carros, numerosas amantes, muita riqueza roubada ao povo, são aparentemente reluzentes mas estão podres por dentro”.
Por tudo isso, Frei João Domingos sempre chamou a atenção dos angolanos, de todos os angolanos, para não se calarem, para “que continuem a falar e a denunciar as injustiças, para que este país seja diferente”.
Tendo em conta a crise de valores em que o país se encontra, Frei João Domingos sempre recomendou aos angolanos sem excepção para que pratiquem os valores que Jesus Cristo recomenda: solidariedade, justiça, amor, honestidade, dedicação ao outro, seriedade, paz, a vida, etc.
“O Povo sofre e passa fome. Os países valem pelas pessoas e não pelos diamantes, petróleo e outras riquezas”, dizia também Frei João Domingos.
O nosso país continua a ser palco de violações dos direitos humanos, nomeadamente contra todos aqueles que se atrevem a pensar de forma diferente do que está estabelecido pelo regime.
São muitos os relatos de violência, intimidação, assédio e detenções por agentes do Estado de indivíduos alegadamente envolvidos em crimes contra a segurança do Estado, ou seja, que pensam de forma diferente.