Abílio Kamalata Numa, um dos três candidatos à liderança da UNITA, acusa o MPLA, no poder em Angola desde a independência, de estar preocupado com a sua candidatura, por pretender, disse, a “subalternização” do maior partido da oposição angolana.
O também general e deputado da UNITA, fez estas declarações à Lusa na parte final de uma campanha eleitoral interna que o levou a percorrer todas as províncias do país, tentando obter o apoio necessário para a chegar à liderança do partido no XII congresso ordinário, a decorrer entre 3 e 5 de Dezembro.
Abílio Kamalata Numa, de 60 anos e na UNITA desde 1974, afirmou que o MPLA tem mostrado preocupação com a sua candidatura. Justifica dizendo que “essa preocupação que vem da parte do Governo, do MPLA, é de subalternização. O MPLA sempre quis lideranças que fossem subalternas, nós estamos a propor uma liderança que tenha competências para discutir os assuntos nacionais, sem se subjugar a nenhuma outra pressão”.
O candidato defende ainda uma postura de diálogo com o MPLA, mas que respeite a matriz dos dois partidos.
“Nós queremos ser angolanos sérios, não angolanos subalternos, isso não deve preocupar ninguém. Estamos a propor um compromisso nacional e o MPLA tem de aceitar que precisamos desse compromisso. O MPLA não consegue fazer a paz com subalternos, que não trazem nada de novo para a agenda política nacional”, disse.
O presidente da UNITA a eleger neste congresso, que vai decorrer em Luanda, disputará nas eleições gerais de agosto de 2017 o cargo de Presidente de Angola, com Abílio Kamalata Numa confiante para já em chegar à liderança do partido.
“Estou agora com esperança redobrada. Passei por todas as províncias, contactei com os militantes e os delegados e apresentámos uma análise do contexto que Angola vive e vai viver nos próximos tempos. E esta mensagem foi muito bem recebida”, sublinhou.
Ao nível externo, o candidato aponta a necessidade de estabelecer um “compromisso nacional” que seja “feito por todos os angolanos” para ultrapassar “todas as sequelas” dos últimos anos, tendo em conta a paz alcançada em 2002.
“Estamos em paz de verdade, mas ainda continuamos a falar de ausência de reconciliação e de distribuição da renda nacional. Precisamos deste compromisso nacional para sossegar os militantes do MPLA e de outros partidos, também a sociedade civil”, disse o general Numa.
Do ponto de vista interno do partido, o candidato reconhece a necessidade de colocar a UNITA “novamente no centro da decisão política em Angola”.
“Um partido com capacidade para poder estabelecer equilíbrios internos, para aprofundar o processo democrático e de estado de direito”, concluiu.
Concorrem à liderança da UNITA ainda os deputados Lukamba Paulo “Gato” e Isaías Samakuva, este último presidente do partido há 12 anos. A campanha eleitoral interna termina na terça-feira.
… e Portugal?
No dia 28 de Abril de 2010, Abílio Kamalata Numa – na sua qualidade de secretário-geral da UNITA, avisou Portugal que não se deve concentrar apenas nas relações com o MPLA e o actual governo angolano relegando para segundo plano o relacionamento com aquele partido da oposição.
Esta cada vez mais legítima posição da UNITA revela, contudo, grande desconhecimento da metodologia seguida pelos governos de Portugal que, como é público, entende que Angola é o MPLA e o MPLA é Angola. Tudo o resto é paisagem.
“Os interesses de Portugal não acabam com o MPLA nem com o Governo de José Eduardo dos Santos”, disse então Numa no final de reuniões que manteve em Bruxelas com responsáveis do governo belga e deputados do Parlamento Europeu.
Kamalata Numa tinha razão. Esqueceu-se, contudo, que o que está em questão não são os interesses de Portugal e muito menos os dos portugueses. Os interesses dos governos portugueses, com a natural conivência do ainda presidente da República, Cavaco Silva, não têm a ver nem com os portugueses nem com os angolanos.
A única relação que interessa a Lisboa é a que resulta de quem está no poder, de quem manda no país, mas sobretudo no petróleo. Importa, ainda, não esquecer que uma importante e estratégica parte da economia de Portugal está nas mãos das empresas do regime, das empresas do MPLA.
“Portugal deve manter uma relação com Angola de futuro e nós fazemos parte desse futuro, e [os portugueses] não deviam olhar com negligência para aquilo que a UNITA poderá representar nos próximos tempos”, declarou Numa.
Kamalata Numa, talvez em função do que se passa em Angola, confundia os portugueses com os que governam Portugal. E até mesmo esses, os portugueses, estão mais preocupados m arranjar quem os ajude, admitindo mesmo que qualquer ajuda será bem-vinda, mesmo que enviada pelo MPLA.
Abílio Kamalata Numa, que foi general das ex-Forças Armadas de Libertação de Angola (FALA), antigo braço armado da UNITA, afirmou nessa altura que nos encontros que manteve em Bruxelas deu conta das suas preocupações sobre a situação em Angola, nomeadamente no que diz respeito à falta de liberdade de imprensa, de liberdades sociais e a situação de pobreza extrema da maior parte da população do país. Cinco anos depois tudo piorou.
Ou seja, Kamalata Numa limitou-se a dizer o que todo o mundo sabe. Sabe mas faz de conta que não sabe. E faz de conta porque, entre outras razões, o petróleo compra os silêncios e até mesmo a dignidade de muitos.