É obrigatório que o regime não esqueça Kim Jong-il

O “querido líder” da Coreia do Norte, Kim Jong-il, morreu há quase quatro anos (17 de Dezembro de 2011), aos 69 anos, de ataque cardíaco. Esperemos que o regime do outro “querido líder” lhe preste a homenagem merecida.

Por Orlando Castro

A pesar da aparente calma dos donos de Angola, José Eduardo dos Santos faz contas à vida, até porque o seu regime compra tudo, mas até agora ainda não conseguiu adquirir a vida eterna. O fim natural (tem 73 anos) estará próximo. Fim que, do ponto de vista institucional e político, poderá passar por uma transição pacífica ou, como parecer ser vontade o MPLA para se perpetuar no poder, por pôr a razão da força acima de qualquer outra coisa.

Em Luanda, o presidente não eleito nominalmente e há 36 anos no poder, sabe, agora melhor do que nunca, que as democracias o vão passar de bestial a besta logo que ele deixe o poder. Se calhar hoje, mais do que ontem, Eduardo dos Santos sabe que já não há amigos como antigamente. E ainda por cima Kim Jing-il morreu e Kim Jong-un ainda tem muito para aprender.

Quando em Março de 2005 visitou Luanda, o vice-presidente da Coreia do Norte, Zeng Yang Hong, foi claro ao ressaltar a importância da cooperação bilateral, e ainda mais explícito quando disse tratar-se de algo histórico. Eduardo dos Santos agradeceu e eu ordens para que o sistema de vasos comunicantes entre Luanda e Pyongyang fosse transformado, rapidamente e em força, num sistema de caudais comunicantes.

É bom que os angolanos (a comunidade internacional passou uma esponja no assunto) saibam que a ditadura de Pyongyang tem relações históricas com a sua congénere de Luanda.

Para além dos laços históricos, nascidos na década de 70 com o apoio militar norte-coreano às FAPLA, é certo que Angola só tem a ganhar, agora mais do que nunca, com o reforço da cooperação com Pyongyang.

Então em matéria de democracia, direitos humanos, liberdades e garantias sociais, a Coreia do Norte parece continuar a ser (tal como a Guiné Equatorial e o Zimbabué) uma lapidar referência para o regime de Eduardo dos Santos.

Aliás, não é difícil constatar que a noção de democracia de Eduardo dos Santos se assemelha muito mais à vigente na Coreia do Norte do que à de qualquer outro país. E é natural. É que para além de uma longa convivência “democrática” entre ditadores, Luanda ainda tem de pagar a dívida, e os juros, da ajuda que Pyonyang deu ao MPLA. Amigos, amigos, contas à parte.

No que tange a direitos humanos, os princípios são os mesmos embora – reconheça-se – Luanda tenha sido obrigada a alargar o laço que estrangula os angolanos. Mas já está a apertá-lo novamente, desde logo porque os angolanos não podem ter as mesmas veleidades que os tunisinos, por exemplo.

De qualquer modo continuam os milhões que têm pouco, ou nada, a trabalhar para os poucos que têm milhões. É assim em todas as ditaduras. Foi por isso que algumas delas tombaram, e será por isso que também a de Eduardo dos Santos vai um dia destes cair do pedestal petrolífero, diamantífero, policial e militar.

É claro que o Governo do MPLA escuda-se nas relações Estado a Estado para estar de bem com Deus e com o Diabo. E faz bem. Segue, aliás, a regra praticada por Portugal em relação a Angola. Mas, tal como outros países, também Lisboa vai aplaudir um dia a queda do dono de Angola, como se nada tivesse a ver com a sua manutenção ao longo de dezenas de anos.

Lisboa nunca se importou com a ditadura, como nunca se importou com a sorte dos angolanos. Aliás, Eduardo dos Santos é elogiado por um vasto leque de políticos lusos, casos de Cavaco Silva, José Sócrates, Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, tal como Ben Ali o foi por Nicolas Sarkozy e Hosni Mubarak por Barack Obama, por exemplo.

A regra made in Portugal é simples. “Porque carga de chuva tenho de estar preocupado com os muitos angolanos que nem uma refeição têm por dia, se eu tenho pelo menos três?”

Eduardo dos Santos pensa o mesmo. Kim Jong-il também pensava. Mas não são só eles, acrescente-se. São também os dirigentes das democracias ocidentais, da ONU, da CPLP etc.. Para eles pouco importa que em Darfur tenham morrido em dois anos mais de 300 mil pessoas, ou que em Angola a grande maioria da população (perto de 70%) seja tratada abaixo de cão.

Foto: Kundi Paihama durante uma visita à Coreia do Norte

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