Analistas angolanos dizem que o escalar do conflito no leste da República Democrática do Congo (RD Congo) pode desencadear uma onda de emigração forçada e de refugiados congoleses para Angola e “sobrecarregar” economicamente o reino do MPLA, já de si tão pobre que até dói…
Angola e a RD Congo partilham uma vasta fronteira terrestre, marítima e fluvial, como recordaram os analistas Tiago Armando e David Sambongo, alertando ainda para implicações do ponto de vista sanitário com a possível mobilidade de cidadãos congoleses.
“Toda a guerra tem consequências e uma delas é a mobilidade das pessoas, os deslocados e ao mesmo tempo os refugiados, e como nós partilhamos esta extensa fronteira, a probabilidade que temos de lidar com fluxo de refugiados da RD Congo é maior”, diz Tiago Armando, com uma (pre)visão – reconheça-se – digna de ser equipara à descoberta da roda.
De acordo com este especialista em relações internacionais, com o agravar das tensões no leste da RD Congo, Angola poderá ser obrigada a cumprir as normas do direito internacional e acolher eventuais refugiados. O que, traduzindo, significa que se não for obrigada… marimba-se. É isso, não é?
“Teremos de os acolher e, de certa forma, exigiria também custos com a criação de condições de recepção, alojamento e assistência”, frisou. Isto, é claro, dando-lhes o que o Governo não dá aos seus próprios autóctones.
Para Tiago Armando, do ponto de vista social, poderá ainda haver consequências no capítulo sanitário para Angola, que por esta altura enfrenta um surto de cólera, dadas as várias epidemias que assolam igualmente a RD Congo.
“Então, obrigaria, do ponto de vista de políticas públicas ou de medidas sanitárias, redobrar os esforços da parte de Angola”, indicou sem, contudo, referir que também neste campo o governo do MPLA (há 50 anos no Poder) nem sequer o básico do básico conseguiu implementar duranta as décadas de poder.
O analista destacou (como não poderia deixar de ser) ainda os esforços do Governo angolano, sobretudo do Presidente angolano, general João Lourenço, o mundialmente conhecido “campeão da paz”, indicado pela União Africana como mediador do conflito que opõe a RD Congo e o Ruanda – alegado financiador e apoiante do grupo rebelde M23, realçando que Angola defende “soluções pacíficas”.
Por sua vez o politólogo David Sambongo recordou a extensa fronteira que Angola partilha com a RD Congo, referindo que esta deverá ser o escape de milhares de cidadãos congoleses com o agravar dos conflitos naquela região.
“E sempre que há conflito armado ou instabilidade na RD Congo a tendência é de os cidadãos congoleses virem para o nosso território [angolano] para pedirem refúgio ou mesmo invadirem do ponto de vista da emigração forçada por via desse conflito”, disse. Para David Sambongo, fugir de uma guerra é… invadir. Não está mal.
Sambongo considerou, por outro lado e à revelia das ordens superiores do general Presidente, que a possível presença de refugiados congoleses em Angola deve ainda sobrecarregar economicamente o reino do MPLA, que se mostra “incapaz” de responder às necessidades dos cidadãos nacionais.
Salientando que as condições das famílias angolanas estão “cada vez mais a deteriorar-se”, o analista advertiu que o “conflito no leste da RD Congo pode desencadear numa onda de emigração para Angola muito forte e que pode sobrecarregar economicamente o (…) país”, rematou.
A Comunidade da África Oriental (EAC, na sigla inglesa) e a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) convocaram uma reunião conjunta para abordar o conflito prevalecente no leste da RD Congo.
O encontro ao mais alto nível vai decorrer num contexto de fortes tensões entre Kinshasa e Kigali, depois de o grupo armado M23 e os seus aliados das forças ruandesas terem tomado Goma, a principal cidade do leste da RD Congo, e continuado a avançar na região.
A cimeira, que decorrerá em Dar es Salaam, na Tanzânia, e é organizada pela EAC e pela SADC, juntará vários chefes de estado e de Governo, e, sobretudo, os Presidentes dos dois países envolvidos no conflito: Félix Tshisekedi (RD Congo) e Paul Kagame (Ruanda).
O conflito, que se arrasta há mais de três anos apesar de numerosas intervenções diplomáticas, regista nova ofensiva e mais violenta desde final de Janeiro e chegou à província do Kivu do Sul, que está agora na mira do M23 e dos soldados ruandeses.