POR MAIS INVESTIMENTO DIRECTO ESTRANGEIRO E MENOS FINANCIAMENTO

A verdadeira questão não é o montante disponível, mas como o utilizamos. Não compramos bens e serviços porque há dinheiro disponível, mas porque há uma necessidade real ou uma oportunidade que pode aumentar o nosso rendimento a longo prazo. A boa gestão de recursos, sejam eles próprios ou provenientes de financiamento externo, é fundamental para o crescimento sustentável.

Por Bernardo Vaz (*)

O dinheiro por si só não resolve os problemas. O que realmente faz a diferença é a forma como uma economia se organiza em relação à produção e distribuição de bens e serviços. Países com sistemas legais eficientes, vias de comunicação de qualidade, baixos níveis de corrupção e pouca burocracia são mais capazes de maximizar os benefícios dos financiamentos e, ainda mais importante, de atrair investimento directo estrangeiro (IDE)

Financiamento e Investimento Directo: uma diferença crucial

Há uma diferença fundamental entre financiamento externo e investimento directo estrangeiro. No financiamento, o país receptor obtém os recursos financeiros, mas a responsabilidade de gerir e operacionalizar os projectos recai sobre ele. Isto implica que, se houver ineficiência na gestão, os cidadãos acabam por pagar a factura através de impostos mais altos ou inflação, tornando o país e a sua população mais pobre. Este é um risco significativo, especialmente em países com um histórico de má gestão de recursos. No caso do investimento directo estrangeiro, o cenário é diferente: quem assume o risco é o investidor. O empresário ou a empresa que identifica uma oportunidade de negócio num país está disposto a correr os riscos financeiros e operacionais, investindo o seu próprio capital. Se o negócio fracassar, o impacto no país é minimizado, pois a dívida não recai directamente sobre os ombros do Estado e, em última instância, dos contribuintes.

Angola, após o alcance da paz em 2002, entrou numa fase de reconstrução onde o financiamento externo, especialmente da China, desempenhou um papel central. A necessidade de infra-estruturas básicas e a urgência em reconstruir o país justificaram o recurso a empréstimos chineses. Esses fundos, porém, foram geridos de maneira pouco transparente, resultando numa dívida que os angolanos continuam a pagar. O Estado construiu infra-estruturas, mas muitos projectos financiados tornaram-se passivos em vez de activos produtivos. Hoje, Angola ainda enfrenta o desafio de gerir eficazmente o seu endividamento, resultante em parte dessas decisões mal direccionadas.

Os Erros do passado e as lições para o futuro

O financiamento chinês, na época, parecia ser o único caminho possível para a reconstrução de Angola. O país necessitava de estradas, hospitais, escolas e energia para criar um ambiente minimamente propício ao investimento estrangeiro e ao desenvolvimento local. No entanto, hoje reconhecemos que muitos dos projectos financiados não foram geridos de forma sustentável. Projectos como perímetros irrigados, fábricas abandonadas e centralidades habitacionais desocupadas são exemplos de recursos mal utilizados. O resultado? O Estado angolano continua a pagar por investimentos que não geram retorno, enquanto a população enfrenta serviços públicos de qualidade duvidosa.

Agora, com novas oportunidades a surgir, como o financiamento norte-americano através do EXIM Bank, é essencial que Angola evite os erros do passado. A missão declarada deste banco é apoiar os exportadores dos EUA em negócios na África Subsariana. Isso significa que, embora os projectos possam beneficiar Angola, o verdadeiro objectivo é fortalecer a economia americana. Desta forma, é crucial que o país analise cuidadosamente os projectos oferecidos e que não se deixe deslumbrar por números elevados sem uma análise detalhada do custo-benefício a longo prazo.

Financiamento ou investimento?

A Prioridade deve ser o Desenvolvimento Sustentável Uma das questões mais prementes é a distinção entre vender-nos um projecto e comprarmos um projecto. Temos de aprender a avaliar a real utilidade de cada proposta e o custo de oportunidade envolvido. Recentemente, Angola negociou um financiamento de 1,3 mil milhões de dólares para três projectos de infra-estruturas no Corredor do Lobito. Entre os projectos, destaca-se o de 907 milhões de dólares destinados à construção de duas centrais solares pela empresa americana Sun Africa.

Nos últimos anos, Angola fez investimentos consideráveis no sector da energia, particularmente na construção de centrais hidroeléctricas. A capacidade de produção de energia do país aumentou significativamente, passando de 3.720 GWh em 2013 para 13.282 GWh em 2023. Apesar deste aumento impressionante na capacidade de produção, apenas cerca de 40% da população angolana tem acesso regular à electricidade. Grande parte do país, especialmente no Sul e no Leste, continua sem acesso à rede primária de transporte de electricidade., dependendo de centrais térmicas a gasóleo, que são caras e pouco eficientes.

Neste contexto, o verdadeiro problema de Angola no sector energético não é a capacidade de produção, mas sim o transporte e a distribuição de electricidade. Investir em mais centrais solares, quando já temos uma capacidade excedentária de produção, parece uma decisão equivocada. O foco deveria estar em melhorar a infra-estrutura de transporte de energia, ligando o Sul e o Leste à rede primária. Isso não só beneficiaria a população local, como também criaria oportunidades para exportar energia para países vizinhos, como a África do Sul, que enfrenta escassez de electricidade. Com a receita gerada pela exportação de energia, Angola poderia pagar os financiamentos necessários para melhorar a sua rede de distribuição

Um apelo ao Investimento Direito Estrangeiro

Angola precisa, sem dúvida, de investimentos. Mas a prioridade deve ser atrair mais investimento directo estrangeiro, em vez de continuar a acumular dívidas através de financiamentos. O investimento directo tem a vantagem de transferir o risco para os investidores, enquanto o país beneficia da criação de empregos, da transferência de conhecimento e tecnologia, e do desenvolvimento de sectores produtivos. Para que Angola se torne mais atractiva para o IDE, é essencial continuar a melhorar o ambiente de negócios, reduzir a burocracia, combater a corrupção e investir em infra-estruturas essenciais.

Em vez de depender exclusivamente de financiamentos externos que aumentam a nossa dívida, devemos focar-nos em criar condições para que investidores vejam Angola como uma oportunidade segura e lucrativa. O papel do governo deve ser o de facilitar esse processo, investindo estrategicamente em áreas que complementem o investimento privado, como o transporte, a energia e a segurança jurídica.

Conclusão

Angola precisa equilibrar as suas opções de financiamento e investimento. O financiamento pode ser necessário em algumas circunstâncias, mas não pode ser a única solução para o desenvolvimento. O investimento directo estrangeiro é uma oportunidade mais sustentável e menos arriscada para o país, pois o risco recai sobre os investidores e não sobre a população. O nosso foco deve ser criar um ambiente onde o investimento privado floresça, enquanto garantimos que o financiamento que recebemos é utilizado de forma estratégica e eficiente. Com as lições aprendidas do passado, Angola tem a oportunidade de seguir um caminho de crescimento mais sustentável e inclusivo.

(*) https://www.cinvestec.com

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