A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é para a Ucrânia uma “importante plataforma” com um peso crescente na cena internacional, uma das razões pelas quais o país apresentou oficialmente em Dezembro de 2023 o pedido para ser Observador Associado.
Por Orlando Castro
O ministro das Relações Exteriores ucraniano, Dmytro Kuleba, numa carta dirigida ao secretário executivo do elefante branco que fala (mais ou menos) português, Zacarias da Costa, com a manifestação formal de interesse daquele Estado em ser observador associado: “O aprofundamento das relações com os países de língua portuguesa, nomeadamente através do diálogo com a CPLP, é parte integrante da política externa ucraniana”.
Na missiva que cujo cópia foi enviada aos nove Estados-membros da organização, Kiev considera a organização lusófona uma “importante plataforma criada para unir países de língua portuguesa” com um “peso e autoridade” na cena internacional “em constante crescimento”.
No documento, o chefe da diplomacia ucraniana declara o interesse do país em estabelecer “uma cooperação permanente com a CPLP a fim de fortalecer as relações amigáveis e a cooperação mutuamente benéfica com os países membros da organização”, em diversos domínios como o político, socioeconómico, cultural, humanitário, da educação e da ciência.
Na missiva, Dmytro Kuleba realça o facto de que a Ucrânia, apesar de ser um país distante geograficamente, “mantém laços históricos com Estados de Língua Portuguesa”.
A propósito refere a forte comunidade emigrante ucraniana em Portugal e o número significativo de emigrantes ucranianos no Brasil, assim como a quantidade de estudantes de língua portuguesa que foi e continuará a ser formada nas universidades ucranianas.
A CPLP conta com 34 observadores associados, entre países e organizações, após a aprovação da candidatura do Paraguai, na 14.ª conferência de chefes de Estado e de Governo.
Na cimeira de São Tomé e Príncipe, em Agosto do ano passado, foi também aprovado o novo regulamento dos observadores associados, que os vincula a estabelecerem “uma parceria no âmbito dos objectivos gerais” da organização de língua portuguesa – a concertação política e diplomática em matéria de relações internacionais, a cooperação em todos os domínios e a difusão e promoção da língua portuguesa.
Assim, no processo de candidatura à atribuição de categoria de Observador Associado da CPLP, a entidade que pretende atingir aquela categoria “apresenta a sua manifestação de interesse e exposição dos motivos da candidatura, em carta redigida em língua portuguesa, dirigida ao secretário executivo da CPLP, que a submete ao comité de concertação permanente para apreciação preliminar”.
Caso o comité – que reúne os embaixadores dos nove Estados-membros – concorde com o pedido, “o secretariado executivo solicita à entidade candidata o plano de parceria (…), que deve dar entrada no secretariado executivo até três meses antes da data da realização da conferência de chefes de Estado e de Governo”, onde será aprovada a candidatura.
O Presidente da República (não eleito) de Angola, João Lourenço, conversou no dia 10 de Outubro de 2022 ao telefone com o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e o tema abordado foi o conflito militar na Ucrânia. Por sua vez o Presidente do MPLA, João Lourenço, tem também mantido contactos telefónicos com o seu homólogo, amigo e mentor russo, Vladimir Putin.
Segundo informação disponibilizada na altura na página oficial de João Lourenço na rede social Facebook, o tema então abordado foi “o conflito militar em que a Ucrânia se encontra envolvida”.
João Lourenço, que defendeu no seu discurso de tomada de posse, em 15 de Setembro de 2022, que Moscovo deve tomar a iniciativa para evitar a escalada do conflito, domina a língua russa, já que estudou na antiga União Soviética entre 1978 e 1982.
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que tem respondido com envio de armamento para a Ucrânia e a (suposta) imposição à Rússia de sanções políticas e económicas.
O máximo que o Governo MPLA, velho amigo dos soviéticos e, é claro, de Vladimir Putin, conseguiu foi, segundo o Ministério das Relações Exteriores, dizer que “a República de Angola exorta as partes a observarem um cessar-fogo, primando pela resolução pacífica do conflito, por via do diálogo político, em pleno respeito do Direito Internacional, conforme consagrado na Carta das Nações Unidas”.
No mesmo dia em que, o MPLA em nome de Angola, revelou esta posição, os embaixadores europeus em Angola condenaram (sem consultarem o MPLA…) a agressão militar russa contra a Ucrânia e visitaram o chefe de missão da embaixada ucraniana, Andrei Chornobyskyi, a quem expressaram “apoio inabalável”.
“Os Embaixadores da Delegação e dos Estados Membros da União Europeia representados em Angola condenam da forma mais veemente possível a agressão militar da Federação Russa contra a Ucrânia”, dizia o comunicado de imprensa da representação europeia em Angola.
Os embaixadores europeus consideraram que a Rússia viola “grosseiramente o direito internacional e os princípios da Carta da ONU”, com as suas acções militares ilegais, “minando a segurança e a estabilidade europeias e globais”.
Em solidariedade com a Ucrânia, os diplomatas visitaram o Chefe de Missão da Embaixada Ucraniana em Angola, Andrei Chornobyskyi, na sua embaixada, “onde expressaram o seu apoio inabalável à independência, soberania e integridade territorial da Ucrânia dentro das suas fronteiras internacionalmente reconhecidas”.
O Presidente russo, Vladimir Putin, disse – recorde-se – que a “operação militar especial” na Ucrânia visa “desmilitarizar e ‘desnazificar’” o seu vizinho e que era a única maneira de o país se defender, precisando o Kremlin que a ofensiva durará o tempo necessário, dependendo de seus “resultados” e “relevância”. Já lá vão dois anos.
A guerra foi condenada pela generalidade da comunidade internacional (o que não foi o caso de Angola/MPLA) e motivou reuniões de emergência de vários governos, incluindo o português, e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), União Europeia (UE) e Conselho de Segurança da ONU, tendo sido aprovadas sanções em massa contra a Rússia.
No dia 2 de Março de 2023, a UNITA apresentou (sem êxito) um requerimento ao Presidente da Assembleia Nacional sobre o voto de protesto contra a guerra na Ucrânia e condenação da potência invasora, a Rússia. Eis o teor desse requerimento:
«O Grupo Parlamentar da UNITA vem através deste solicitar a V. Excia. a alteração da proposta da ordem do dia, nos termos do nº 4, do artigo 115º e da alínea e) do nº 1 do artigo 128º do Regimento da Assembleia Nacional, para que seja introduzido no Período Antes da Ordem do Dia a apresentação de um voto de protesto.
No passado dia 25 de Fevereiro do corrente ano forças armadas da Federação Russa invadiram a República da Ucrânia, um Estado soberano e independente. A guerra tem provocado numerosas mortes de civis e sofrimento humano injustificados, destruição de património, deslocados e graves violações de direitos humanos.
Considerando que nos termos da Constituição a República de Angola é uma nação de vocação para a paz e progresso, sendo um dever do Estado e um direito e responsabilidade de todos garantir, com respeito pela Constituição e pela Lei, bem como pelas Convenções Internacionais, a paz e a segurança nacional e neste caso, a paz e a segurança internacionais;
Sendo o Estado angolano parte do sistema das Nações Unidas e, no quadro das relações internacionais a República de Angola respeita e aplica os princípios da Carta das Nações Unidas e da Carta da União Africana, e estabelece relações de amizade e cooperação com todos os Estados e povos na base de princípios e valores como respeito pela soberania e independência nacional, igualdade entre Estados, direito dos povos à autodeterminação e à independência, solução pacífica dos conflitos, respeito dos direitos humanos e cooperação com todos os povos para a paz, justiça e progresso da humanidade;
O Grupo Parlamentar da UNITA vem solicitar a discussão e votação de um voto de protesto contra a guerra imposta à República da Ucrânia e apelar à resolução urgente e pacífica das hostilidades que opõem a República da Rússia à República da Ucrânia, com o seguinte teor:
A Assembleia Nacional, órgão de soberania da República de Angola, representativo de todos os angolanos vem por intermédio deste voto manifestar o seguinte:
1. Repudiar e condenar a invasão da República da Ucrânia e as violações aos compromissos internacionais sobre a defesa, promoção da paz e segurança internacional.
2. Condenar a guerra como forma de resolução de divergências políticas, ideológicas e culturais.
3. Condenar a invasão à República da Ucrânia, estado soberano e independente pelas forças armadas da Federação Russa em violação à integridade territorial, ao direito à autodeterminação e livre escolha de alianças.
4. Apelar a cessação imediata e sem pré-condições das hostilidades.
5. Encorajar o diálogo franco, aberto e responsável entre os representantes dos governos da Federação Russa e da República da Ucrânia.»
Assim sendo, continuo e pensar que quem se abstém de condenar o agressor está a condenar o agredido.
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