E ENTÃO O CHEIRO TORNOU-SE NAUSEABUNDO

O MPLA, partido no poder em Angola há 48 anos, assegurou hoje que não tem problemas com filhos de ninguém, quando questionado sobre a reconciliação com as filhas de José Eduardo dos Santos, e mostrou-se confiante na vitória (certamente arrasadora) nas eleições em 2027.

Por Orlando Castro (*)

O MPLA poderá “eventualmente, ter problemas em relação ao comportamento de alguns militantes ou ex-militantes seus. Todos nós no MPLA somos militantes iguais perante os estatutos e todos nós temos regras iguais para cumprir”, disse o secretário para a Informação do Bureau Político do partido, Rui Falcão, questionado sobre as filhas do ex-presidente angolano, José Eduardo dos Santos.

Aliás, a prova de que o MPLA não tem problemas com os filhos dos outros está – por exemplo – no facto de o próprio Rui Falcão mantém os filhos no exterior do país, desde tenra idade, em zonas residenciais de luxo e colégios de elite. É claro que, em Angola, cerca de cinco milhões de crianças (filhos e filhas de angolanos de segunda) estão fora do sistema nacional de ensino.

“Se somos filhos destes ou daquele aqui não há escudo, aqui cada um vale por si e só o comportamento é que determina o maior ou menor engajamento seu com os demais militantes, não temos esse tipo de problema e nunca analisamos isso”, frisou o responsável do MPLA numa erudita dissertação analítica sobre o achatamento polar das batatas. Isto, é claro, depois de se ter descalçado para contar até… 12.

Isabel dos Santos, envolvida em vários processos judiciais, e Welwítschia “Tchizé” dos Santos, filhas do antigo líder do partido e ex-presidente e presidente emérito, José Eduardo dos Santos, dizem-se perseguidas pela actual liderança do país e têm expressado descontentamento público face às acções do Governo e do partido, sobretudo no âmbito do suposto (e enquanto tal selectivo) combate à corrupção.

Falando aos jornalistas, no âmbito das celebrações dos 67 anos de fundação do MPLA, assinalados em 10 de Dezembro, Rui Falcão disse que o MPLA é um partido unido (sobretudo quando este é o epicentro da corrupção), que convive com opiniões diferentes, desconhecendo a existência interna de “abelhas ou marimbondos”, imagem associada pelo próprio e actual presidente do MPLA, general João Lourenço, aos políticos envolvidos em corrupção.

Recorde-se que o próprio Presidente do MPLA, João Lourenço, bem como Presidente da República, João Lourenço, o Titular do Poder Executivo, João Lourenço, e o Comandante-em-Chefe das Forças Armadas, João Lourenço, afirmaram que viram roubar, ajudaram a roubar, beneficiaram do roubo mas que – tal como Rui Falcão – não são (quem diria?) ladrões.

“Somos um partido unido, um partido democrático, onde as pessoas têm a liberdade de ter opiniões diferentes e nós já estamos habituados a conviver com isso e não há nenhum laivo hoje de falta de unidade ou de coesão no seio do partido”, assegurou Rui Falcão. Bem que o secretário para a Informação do Bureau Político do MPLA poderia, deveria mesmo, ter citado o único herói nacional que o MPLA permite, o assassino e genocida António Agostinho Neto, quando mandou assassinar milhares e milhares de angolanos do MPLA, nos massacres de 27 de Maio de 1977.

Sobre o alegado desgaste do partido para a resolução dos problemas do país, argumento de vários círculos da sociedade civil e de partidos na oposição, Rui Falcão disse já estarem habituados a esta “retórica”, que apenas “fortalece o MPLA”. Nesta fase da erudita dissertação já o odor começava a ser devastador. Nada de novo, aliás. É sempre assim quando os que têm o cérebro ligado aos intestinos abrem a boca.

“Ainda bem que há esta retórica de alguns, porque foi assim que perderam (as eleições) em 1992, perderam em 2008, em 2012, em 2017, perderam em 2022 e vão perder em 2027”, assegurou Rui Falcão referindo-se implicitamente à UNITA, maior partido na oposição. Esqueceu-se de falar da tentativa de decapitação da UNITA que, em 1992, levou mais uma vez o MPLA a massacrar milhares de angolanos em Luanda.

Em relação ao actual quadro socioeconómico das famílias angolanas (20 milhões de pobres), marcado pela subida galopante dos produtos da cesta básica (que não atinge, obviamente, os latos dirigentes do partido), o dirigente do MPLA disse que o partido está preocupado com a situação, referindo que as medidas do executivo, “a seu tempo” vão sentir-se, e que “não há nenhum país do mundo que viva no paraíso”. Até lá, é claro, os angolanos vão continuar a aprender a viver sem comer.

“Nos Estados Unidos da América vai encontrar cidadãos debaixo da ponte, agora mesmo foi dito que em Portugal há 10.000 famílias a viver na rua, portanto, cada país tem a sua idiossincrasia, seus problemas e realidade, mas ninguém vive no paraíso”, argumentou, renegando as teses do seu próprio “querido líder” que diz estarmos perto desse paraíso.

Rui Falcão apontou ainda a existência de jornais, rádios e televisões privadas em Angola para refutar a aludida inexistência de liberdade de imprensa e de expressão no país, considerando existirem casos que não devem ser generalizados. Nesta fase os alarmes contra o cheiro intestinal dispararam…

“Não podemos generalizar actos isolados de um agente qualquer, agora que nós temos coisas para corrigir enquanto sociedade, isso temos, mas aqui se um polícia tem uma atitude incorrecta lê-se de uma maneira, gostaria de ver os mesmos órgãos a falar do que acontece em França, na Inglaterra, em Espanha ou lá o cacete é diferente?”, questionou, referindo-se às liberdades de reunião e de manifestação.

Mas será mesmo verdade que Rui Falcão sabe ler?

(*) Com Lusa

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