Mais de quatro milhões de angolanos entre os 15 e os 35 anos continuam sem saber ler nem escrever, sendo muitos os factores que justificam o elevado número, assumiu em 2018 a então ministra da Educação de Angola, Maria Cândida Teixeira. Se a estes se juntarem os que da leitura e da escrita apenas têm uma vaga ideia, ficamos com a perspectiva do enormíssimo analfabetismo funcional, onde se incluem os que sabem ler e escrever, mas não lêem nem escrevem, muitos dos quais são a reserva intelectual do Governo.
Maria Cândida Teixeira falava, em Luanda, após a assinatura de um protocolo de cooperação entre o Ministério da Educação (MED) e a Igreja Metodista Unida Angola (IMUA), que visava a criação de turmas de alfabetização nos seus templos da Conferência do Oeste de Angola, que abarcava 12 províncias do país.
A então governante reconheceu que muitos dos problemas vividos na sociedade angolana, como a violência doméstica, gravidez precoce, criminalidade, prostituição, “entre outros males” (incompetência governativa, por exemplo), estão ligados à falta ou à pouca instrução e educação das pessoas.
Por esse motivo, ressaltou, o sector da Educação pretendia implementar os programas contidos na Agenda 2030, que visa transformar a vida da população através da educação como principal impulsionadora para o desenvolvimento do país e bem-estar dos cidadãos.
Maria Cândida Teixeira referiu estar comprometida em estender e melhorar a rede de ensino pelo país, para que todos cidadãos possam ter acesso a formação académica. Estávamos, relembre-se, em 2018.
Por seu turno, o assistente do bispo da Igreja Metodista Unida, reverendo Manuel André, afirmou que o protocolo tinha o objectivo de “redimensionar o combate sem tréguas ao analfabetismo”.
Salientou também que a Igreja Metodista Unida tinha, doravante, o compromisso de transformar os templos em centros de escolaridade, para ajudar os cidadãos que necessitam de aprender a ler e a escrever.
Já o especialista de programas da UNESCO em Angola, Nicolau Bubuzi, lembrou que, actualmente, existem mais de 360 milhões de crianças e adolescentes em todos o mundo que estão fora do sistema de ensino. Por outro lado, acrescentou, seis em cada 10 crianças e adolescentes, o equivalente a 617 milhões de pessoas, não adquirem as competências mínimas em literacia.
Acrescentou ainda que 750 milhões de jovens e adultos ainda não sabem ler nem escrever, dos quais dois terços são mulheres, factores que estão na base da exclusão social, da desigualdade social e do género.
O memorando, então assinado pelo director nacional do Ensino de Adultos, Evaristo Pedro, e o reverendo Manuel, previa que a IMUA disponibilizaria as turmas e os professores, enquanto o MED ficaria responsável pela formação dos alfabetizadores voluntários e garantir o fornecimento do material didáctico e a certificação dos formandos.
“Vira” o ministro, toca o mesmo
Setembro de 2017. O então ministro da Educação, Pinda Simão, disse, em Luanda, que 25% da população angolana ainda é analfabeta, mas apesar da crise económica e financeira que o país enfrentava, 500.000 pessoas estavam a ser alfabetizadas em todo o país.
Apesar de pecar por defeito, esta percentagem de analfabetos é só por si um atestado de incompetência a quem nos desgoverna há 48 anos.
Pinda Simão, que falava em Luanda por ocasião do Dia Mundial do Analfabetismo, disse que Angola estava “comprometida com uma agenda de educação única e renovada, ousada e ambiciosa”.
Aqui foi (como continua a ser) altura para rir. Falar de “uma agenda de educação única e renovada, ousada e ambiciosa” é a expressão exacta de mais uma piada candidata ao anedotário nacional.
O então governante angolano referiu ainda que, porque 24,7% da população angolana não saber ler nem escrever, este é um desafio para toda a sociedade, “de garantir que o analfabetismo não constitui factor de exclusão” para esses cidadãos. O então ministro não sabia o que dizia e nem dizia o que sabia.
Segundo Pinda Simão, devido à crise económica (antes a desculpa era a guerra agora é a crise) que Angola enfrenta desde finais de 2014, com a baixa do preço do petróleo no mercado internacional, não tinham sido pagos os subsídios a alfabetizadores e facilitadores, bem como para a aquisição dos materiais didácticos.
O titular da pasta da Educação realçou que, apesar das “inúmeras dificuldades resultantes da crise económica, há uma demonstração clara do espírito de sacrifício, que caracteriza os alfabetizadores, facilitadores, formadores e todos os agentes envolvidos no processo”, aos quais reiterou os seus agradecimentos.
Para o então ministro, o desafio para o futuro “passa pela melhoria da qualidade do processo e a criação de condições, para que um maior número de alfabetizados possa dar continuidade aos seus estudos até à conclusão do ensino primário”.
Sobre o lema das celebrações da data, “Analfabetismo num Mundo Digital”, Pinda Simão disse que deviam ser objecto de reflexão questões como o tipo e níveis de alfabetização necessários, num mundo cada vez mais digital, bem como a adaptação dos programas, em termos de metodologias de ensino e aprendizagem.
O então ministro acrescentou que as tecnologias podem ser decisivas para um melhor acesso à educação, informação e conhecimento, tendo assegurado que o Governo adoptou iniciativas no sentido de acelerar o desenvolvimento com o uso das novas tecnologias.
“A governação electrónica, a expansão da rede digital no país e o aumento das condições para um maior acesso à internet são já uma realidade em pelo menos todas as sedes municipais do país. O projecto de construção de 25 mediatecas enquadra-se nos esforços para conferir mais cidadania e mais inclusão”, referiu.
Recorde-se, sobretudo a Pinda Simão, que Angola gastou menos de 2% do total das despesas públicas orçamentadas para o sector global da Educação, nos últimos doze anos, segundo um estudo divulgado no dia 29 de Junho de 2017, assinalando que nesse período o peso da dotação orçamental foi de até 1,72%.
Os dados, apresentados em Luanda, constavam do estudo governamental sobre os “Custos e o Financiamento do Ensino Superior em Angola”, realizado por uma consultora portuguesa, que compila o peso da dotação orçamental dos Ministérios da Educação e do Ensino Superior de Angola.
Este facto, salienta o documento, “pode dificultar a realização, pelos órgãos do governo, das acções necessárias ao crescimento do sistema educativo, em quantidade e em qualidade”.
De acordo com o estudo, no período em análise, 2004 a 2016, a dotação orçamental do Ministério da Educação registou um acentuado decréscimo, a partir de 2008, passando de 1,37% para 0,68% em 2016, enquanto para o Ministério do Ensino Superior assistiu-se a um crescimento muito acentuado.
“Todavia, o esforço despendido pelo país com os órgãos de Governo, que tutelam a educação superior e não superior, revela uma situação que se nos afigura bastante deficitária, quando se percebe que o total das despesas públicas orçamentadas para esses órgãos não chega aos 2% do Orçamento do Estado, na quase totalidade dos anos em análise”, observou.
O trabalho de investigação, realizado entre Julho de 2016 e Maio de 2017, sublinhava que em relação à taxa de alfabetização, o ritmo de crescimento quase que parou nos anos posteriores à década de 1990, contrariando os objectivos de desenvolvimento propostos pelas autoridades angolanas.
O gráfico sobre a taxa de alfabetização espelhava que em 1998 a taxa de alfabetização em Angola cifrava-se em 42% e que de 2001 a 2015 a cifra rondou entre 67,4% e 71,2%.
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