MINISTRA DIZ (SÓ) O QUE O CHEFE MANDA

A ministra das Finanças angolana, Vera Daves de Sousa, disse hoje que o elevado índice de contratações simplificadas (ajustes directos, pessoais e “familiares”) se deve essencialmente às limitações financeiras do país e imposições por parte dos empreiteiros de recurso a financiamento externo. Então a culpa é desses malandros, marimbondos e arruaceiros dos empreiteiros? Ou será que João Lourenço “comprou” a mudança de pensamento da ministra?

Vera Daves de Sousa, que falou hoje com (alguns) jornalistas no “Pequeno-almoço com a Imprensa” promovido pelo Ministério das Finanças, referiu que é “grande defensora” da realização de concursos públicos, mas há circunstâncias (presume-se que seja sinónimo de “ordens superiores”) que limitam a escolha preferencial por procedimentos abertos.

“Uma delas está relacionada com a limitação de acesso a financiamento por fontes que não exijam que o empreiteiro seja do país da entidade que financia. Esse é um grande ‘handicap’ que temos, para projectos de grande dimensão não teríamos condições de financiar com receitas fiscais, nem é recomendável que assim seja”, referiu a ministra.

A titular da pasta das Finanças de Angola salientou que são precisas fontes de financiamento estáveis, “que permitam que os projectos sigam o seu caminho sem interrupções”. No campo da adivinhação, esse é um caminho que o MPLA ainda não descobriu, apesar de estar no Poder há 48 anos.

“Porque a história nos demonstra que todas as vezes que tentamos começar projectos com uma fonte de financiamento que não fosse estável, levaram três, quatro, cinco vezes mais tempo para serem construídos, com paralisações a meio, adendas intermináveis no meio de reequilíbrio financeiro e o projecto acabou por ter o triplo do valor”, disse Vera Daves de Sousa.

Segundo a ministra, quando se trata de financiamento local há margem para a realização de concurso público “porque os bancos locais não se importam quem seja o empreiteiro”.

“Para eles, se forem entidades residentes que tenham dinheiro no seu banco melhor, mas não colocam muitos condicionalismos com relação a isso. Mas o financiamento local ocorre na medida da capacidade da nossa banca local (…) e há projectos que têm dimensão que um banco sozinho não conseguiria, há uns que nem sequer um consórcio de bancos”, referiu.

Vera Daves de Sousa explicou que a “alternativa que tem sido explorada é o financiamento bilateral, montado numa perspectiva de os recursos nem sequer saírem do país que financia”.

“A entidade financia, o empreiteiro é daquele país, que tem uma conta naquele banco que está a financiar e quando desembolsa o financiamento para esse projecto, o desembolso é feito para a conta desse empreiteiro, que está no banco que financia. De modo que não bombeia recursos para o sistema financeiro nacional e, nalguns casos, fica pouco valor acrescentado localmente”, referiu.

A ministra disse que o Governo está a tentar encontrar soluções que permitam adicionar mais conteúdo local aos projectos e ver como os financiadores externos poderiam permitir que os recursos entrem no sistema financeiro angolano.

Seria “uma forma de indirectamente também financiarmos a nossa economia, porque essa liquidez passaria a estar disponível no sistema financeiro nacional e o banco, na gestão da sua liquidez, pode fazer esse dinheiro fluir para iniciativas do mercado local”, sublinhou. Não é a descoberta da pólvora, pois não senhora ministra?

Esta tentativa já foi feita com um financiador externo e um banco local, continuando “o diálogo com outros para ver se pega”, adiantou.

De acordo com Vera Daves de Sousa, outro constrangimento está relacionado com a urgência das empreitadas, “em alguns casos legítimas e outras nem tanto”.

“Uma ravina está prestes a engolir uma centralidade, um prédio está quase a desabar, concurso público leva o seu tempo, nesses casos justifica-se fazer uma contratação emergencial, uma contratação simplificada”, considerou a ministra.

“Noutros casos, evoca-se urgência, emergência, mas não é tão urgente, então aí tem que continuar a estratégia de diálogo e de persuasão a todos os gestores públicos para lançarem mão desse mecanismo apenas quando for estritamente necessário”, acrescentou.

MINISTRA COME E CALA

A ministra das Finanças de Angola, Vera Daves de Sousa, enviou em Dezembro de 2021 uma carta à Presidência da República (cujo Presidente, João Lourenço, também é Titular do Poder Executivo) para alertar os governantes sobre a necessidade de seguirem as regras da contratação pública e evitar os ajustes directos. Também foi dado conhecimento ao Presidente do MPLA, João Lourenço.

“Reportamo-nos a um conjunto de procedimentos de Contratação Simplificada, pelo critério material, e de Contratação Emergencial, superiormente autorizados pelo Presidente da República”, afirmou Vera Daves de Sousa, na missiva enviada ao secretário do Presidente da República para os Assuntos Jurídicos.

“Muitos dos Procedimentos de Contratação Pública simplificada e emergencial aprovados por despacho de Sua Excelência Titular do Poder Executivo apresentam-se em desconformidade com a Lei de Contratação Pública (LPC), por não reunirem os pressupostos para a sua adopção”, avisou a ministra das Finanças.

Em causa estava, como continua a estar, acrescentou Vera Daves de Sousa, a falta de consulta prévia ao Ministério das Finanças relativamente à atribuição de contratos que são publicados no Diário da República, e que tornam nula qualquer posição das Finanças depois de terem sido publicados.

“O Ministério das Finanças não tem sido previamente consultado quanto aos mesmos, tomando apenas conhecimento da autorização do titular do poder executivo, ficando assim sem margem de intervenção através do Serviço Nacional de Contratação Pública (SNCP)”, referiu a ministra, acrescentando que, “por outro lado, em muitos casos, sobre os referidos despachos do Titular do Poder Executivo, recai o despacho do ministro de Estado e Chefe da Casa Civil, orientando à sua publicação”.

Na carta, Vera Daves de Sousa, que em vários momentos tem alertado publicamente para a necessidade de garantir que a contratação pública segue as regras e que tem cabimento orçamental prévio, recordou que “em anos anteriores (2018)”, antes de o Presidente da República assinar qualquer despacho relativo à contratação pública simplificada ou emergencial, ou seja, por ajuste directo, a Presidência remetia às Finanças, “para um parecer prévio sobre a conformidade, legalidade e regularidade do referido despacho, incluindo a existência de orçamento para a execução dos projectos”.

No documento, datado de 7 de Dezembro de 2021, a ministra das Finanças solicitou a intervenção do secretário dos Assuntos Jurídicos “para efeitos de alinhamento, antes de se submeter à assinatura do Titular do Poder Executivo os despachos referentes aos procedimentos, no sentido de se evitar a prática de actos ilegais e/ou irregulares aquando da tomada de decisão de contratar e subsequentes actos”.

A nova lei dos contratos públicos entrou em vigor em Janeiro (2021), apresentando várias novidades, como a criação de um procedimento de contratação emergencial e um procedimento dinâmico electrónico, permitindo agilizar a contratação de bens e serviços em época de pandemia.

O procedimento de contratação emergencial é um procedimento simplificado destinado a situações de emergência, com causa não imputável à respectiva entidade pública contratante, que apenas poderá a ele recorrer quando não possam ser comprovadamente cumpridos os prazos ou formalidades previstas para os restantes procedimentos de contratação pública, ao passo que o procedimento dinâmico electrónico simplifica a contratação realizada através de um leilão electrónico.

Entre as principais novidades elencadas estão, além dos novos procedimentos de contratação pública, a simplificação e a criação de um novo regime sancionatório, que vai de 550 a 3.300 dólares (454 a 2.724 euros) para pessoas singulares e de 2.750 a 16.500 dólares (2.270 a 13.622 euros) para empresas.

Transparência (quando existe) significa confiança

A transparência no processo de realização da despesa pública representa para o Estado angolano um compromisso de confiança para a sustentabilidade das finanças públicas, com vista à concretização dos ditames da equidade na redistribuição dos rendimentos nacionais, disse, em Luanda, o secretário de Estado do Tesouro, Leonel Silva. Isto em, em, em… 2014.

Ao intervir no lançamento do Portal de Contratação Pública, por ocasião da semana das finanças públicas, Leonel Silva disse que a igualdade e concorrência no fornecimento de bens e serviços ao Estado têm reflexos na promoção e dinamização do mercado da contratação pública que leva à realização da despesa pública a preços mais competitivos, garantindo maior eficiência e qualidade dos bens e serviços adquiridos.

Leonel Silva referiu que a modernização e actualização dos instrumentos de aquisição pública visam a criação de sistemas informáticos de acesso público, contribuindo para a reforma da administração pública e, consequentemente, o seu alinhamento e projecção aos níveis de exigência internacional, representando para os cidadãos a satisfação das suas necessidades.

Sublinhou, recorde-se que isto foi em… 2014, que o Portal de Contratação Pública contribui como um veículo de informação para a abertura nacional e internacional do mercado de contratação pública.

No mercado de contratação pública, a disponibilidade de informações simétricas permite aos fornecedores vender os seus produtos a um universo mais dilatado de entidades públicas contratantes e, a estas, adquirir bens e serviços a preços mais competitivos, frisou Leonel Silva.

Na ocasião, a directora da Contratação Pública, Rosária Filipe, sublinhou que o Portal da Contratação Pública juntava-se ao leque de instrumentos que vão sendo continuamente colocados à disposição dos intervenientes e do público, por forma a uniformizar boas práticas em matéria de contratação pública, através da disponibilização de informações pertinentes sobre o estado da contratação pública.

“É nosso entender, ver consolidada, cada vez mas, a ideia de que apenas com rigor e transparência na contratação pública se alcançará a sustentabilidade da mesma“, disse.

Informou ainda que a contratação pública visa promover a concorrência e competitividade entre os fornecedores do Estado, aumentar a transparência e conformidade com os requisitos ligados à contratação pública e também auxiliar na uniformização das políticas, processos e procedimentos da contratação pública.

Folha 8 com Lusa

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