Angola tem até ao próximo ano para mostrar que está a seguir as recomendações do Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI) e evitar entrar na lista “cinzenta” com consequências no acesso a divisas e transacções financeiras.
Para Ludmila Dange é uma corrida contra o tempo. A administradora executiva da Comissão do Mercado de Capitais (CMC), órgão de regulação, apresentou hoje em Luanda as linhas gerais do relatório preliminar de avaliação do GAFI, concluído no passado mês de Junho, e o plano de acção de Angola para implementar as recomendações dos avaliadores.
Angola, actualmente em fase de avaliação, tem até Junho do próximo ano para evitar integrar novamente a chamada “lista cinzenta” do GAFI que integra países considerados não cooperantes em matéria de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, como aconteceu em 2010.
“Um dos grandes riscos, que acaba por ter impacto na economia toda, é a falta de acesso a divisas. Somos uma economia extremamente importadora, de modo que cortar o acesso a divisas cria constrangimentos até ao nível do que comemos”, explicou a responsável da CMC.
Outros constrangimentos prendem-se com o acesso a bancos correspondentes, que impedem determinadas transacções financeiras, prejudicando também a credibilidade, já de si depauperada, do país.
“Temos verificado um esforço do executivo no sentido de atrair o investimento estrangeiro e entrar para esta lista cinzenta iria tornar o processo ainda mais desafiante”, sublinhou Ludmila Dange.
Das 40 recomendações do GAFI, Angola está apostada em “ter a melhor avaliação possível”, mas existem prioridades definidas.
“Nós temos de ser estratégicos, temos um ano e naquilo que é a nossa estratégia de actuação e naquilo que é o apoio que temos recebido de instituições que já estiveram em situação semelhante à nossa, como, por exemplo, as Ilhas Maurícias, o que temos de fazer é atacar as recomendações que são fundamentais”, afirmou a administradora da CMC.
Para tal, o executivo angolano vai dar prioridade no seu plano de acção nacional a seis recomendações no campo do branqueamento de capitais e duas no âmbito do financiamento ao terrorismo, num “trabalho conjunto” que abrange desde o sector financeiro aos órgãos de aplicação das leis.
“Ainda que o sector financeiro esteja bem, se qualquer outro sector não estiver em condições vamos para a lista cinzenta e é o que nós queremos evitar”, prosseguiu a responsável.
Entre as prioridades inclui-se a diligência reforçada do cliente (‘customer due diligence’), crimes associados ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, registo de informações e comunicação de operações suspeitas e sanções específicas ligadas ao financiamento de terrorismo, uso indevido de organização não lucrativas e proliferação de armas de destruição em massa.
No que diz respeito ao financiamento ao terrorismo, uma das áreas em que foram identificadas mais insuficiências em Angola, há também recomendações prioritárias, disse Ludmila Dange, sublinhando que um dos aspectos que deve ser melhorado é a regulamentação, a par de um melhor entendimento sobre esta matéria.
“É importante formar as nossas equipas, no sentido de terem melhor conhecimento e entendimento maior sobre como identificar as fontes de financiamento do terrorismo e como tratar estas questões”, declarou aos jornalistas.
Enquanto regulador do sistema financeiro, a CMC é parte do sistema de avaliação e tem “responsabilidade acrescida no que respeita às entidades sujeitas à sua supervisão”, estando também a adoptar acções de adequação às recomendações.
Ludmila Dange vincou que as recomendações têm também impacto na legislação já que se está em fase de adequação da Lei de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais, Financiamento do Terrorismo e da Proliferação de Armas de Destruição em Massa (Lei 5/20).
O GAFI é uma entidade que elabora políticas de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo e da proliferação das armas de destruição em massa, procurando efectivar reformas legislativas e regulatórias nessas áreas.
Para cumprir os seus objectivos, o GAFI publicou 40 recomendações e periodicamente, avalia os países membros para verificar a implementação das medidas sugeridas.
MAIS DO MESMO E FÉ EM QUALQUER COISA
Há um ano (22 de Julho de 2022), o secretário de Estado para as Finanças e Tesouro, Ottoniel dos Santos, disse que o resultado da avaliação do GAFI seria determinante para a imagem de Angola e do sistema financeiro, em particular.
Ottoniel dos Santos falava na abertura do XII Fórum Banca de iniciativa do jornal Expansão que abordou o tema “O Impacto da Avaliação do GAFI no Sector Bancário – Transformações na Estrutura e Desafios Futuros”.
Segundo o secretário de Estado para as Finanças e Tesouro, que se manifestou confiante num resultado positivo, esta avaliação poderia servir também para consolidar e acelerar as reformas empreendidas pelo Governo para a melhoria do ambiente de negócios. Foi há um ano.
“O que a equipa do GAFI procurou foi evidências que sejam capazes de mostrar que as medidas legais e regulamentares aprovadas estão de facto a funcionar e a produzir os resultados desejáveis”, referiu Ottoniel dos Santos.
Ottoniel dos Santos afirmou que não havia razões para temer o resultado desta avaliação, “pois desde a última avaliação em 2019, foram desenvolvidos esforços efectivos com vista a estarem em conformidade com a regulamentação emanada por parte daquela instituição”. Tal, acrescente-se, conforme ordem baixada pelo Presidente do MPLA, João Lourenço. Afinal…
“Desde logo, através da modernização da Lei de Prevenção de Branqueamento de Capitais, Financiamento de Terrorismo e da Proliferação de Armas de Destruição em massa, a Lei 5/20, de 27 de Janeiro, e da sua transposição para os avisos e normativos do Banco Nacional de Angola, nomeadamente pelo Aviso 14/20. Tanto esta lei, como este aviso fazem o acolhimento da recomendação 12 do GAFI relativa a operações financeiras efectuadas por Pessoas Politicamente Expostas”, salientou.
Se Angola foi retirada, em 2018, da lista cinzenta do GAFI, facto que “embaraçava” a credibilidade do país internacionalmente e “tolhia” as operações financeiras com bancos correspondentes, actualmente, realçou Ottoniel dos Santos, “não há razões para antever, face aos avanços verificados, um regresso a esse indesejado estatuto, muito pelo contrário”. Afinal…
“Toda essa actividade, tanto do poder executivo e legislativo, como dos reguladores do sistema financeiro, BNA [Banco Nacional de Angola], CMC [Comissão de Mercados de Capitais] e ARSEG [Agência de Regulação e Supervisão de Seguros] está intimamente vinculada à firme aposta do executivo em criar todas as condições necessárias para a atracção de investimento privado como motor de diversificação da nossa economia”, enfatizou. Afinal…
O executivo, prosseguiu há um ano Ottoniel dos Santos, vai continuar focado na redução e manutenção em níveis compatíveis de sustentabilidade da dívida das necessidades médias anuais de financiamento.
Por sua vez, o administrador do BNA, Rui Miguéns, considerou que, apesar das boas indicações de um resultado positivo da avaliação da GAFI, “é apenas um passo mais dentro daquilo que é a conformidade do sistema financeiro do país, em particular com as normas internacionais, de governação, de gestão de risco e de prevenção e combate a práticas ilícitas”. Afinal…
Rui Miguéns salientou que havia ainda muita coisa para ser feita, sublinhando que as autoridades angolanas não podem interpretar um resultado positivo desta avaliação como fim de trabalho.
“A realidade económica financeira internacional está em constante mudança e isso significa que os requisitos e as exigências também vão evoluindo. Qualquer que seja o resultado – esperamos que seja positivo, trabalhamos para isso, merecemos isso -, mas não podemos considerar que o trabalho de casa está concluído, que está feito”, observou.
Em Outubro de 2021, o ministro de Estado para Coordenação Económica explicou com rara assertividade a razão pela qual Angola estava, em matéria de desenvolvimento económico (entre outras questões), em estado calamitoso. Manuel Nunes Júnior afirmou que a confiança, a segurança, a credibilidade e a reputação são elementos fundamentais para atracção de investimentos e financiamentos.
Confundindo o fundo do corredor com o corredor de fundo, o governante, que falava na sessão de abertura da Reunião do Comité de Supervisão da Unidade de Informação Financeira (UIF), disse que Angola tem registado progressos no combate às más práticas no sistema financeiro angolano. A bajulação fê-lo escarrapachar-se.
Nesta perspectiva, Manuel Nunes Júnior disse que o país precisava evidenciar mais, aos seus parceiros e aos organismos internacionais de supervisão financeira, o progresso que tem registado no combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. Afinal…
“Temos de ser capazes de demonstrar, neste processo de avaliação, o progresso que o país vem evidenciando na aérea de combate ao branqueamento de capitais, financiamento do terrorismo e a proliferação de armas de destruição em massa”, expressou o governante. Bem que poderia dar o exemplo daquele emérito militante do MPLA que “viu roubar, participou nos roubos, beneficiou dos roubos” e que hoje, sem devolver o que roubou, comanda a luta contra os ladrões.
Deste modo, prosseguiu Manuel Nunes Júnior, pretendia-se assegurar a confiança do resto do mundo, sobre o sistema financeiro nacional. E, é claro, por este andar já está a meio da ponte que atravessa o rio. Chato vai ser quando descobrir que não existe ponte…
Folha 8 com Lusa
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