A falta de vontade política e ética, um sistema de castas e acomodação ao fenómeno por parte dos cidadãos em geral são algumas das razões apontadas por economistas para o agravamento da corrupção em Angola, diz a Voz da América.
Por Orlando Castro
A situação parece ter tomado contornos alarmantes já que despertou a atenção da Transparency International, organização que avalia os níveis de corrupção em 175 países do mundo. No raking deste ano, Angola figura na posição 161º ou seja, piorou, perdendo quatro pontos.
Nada mau, convenhamos. Ainda há quem esteja pior. Aliás, Angola ainda pode perder mais uns lugares sem temer ser o pior. É, reconheça-se, mais uma medalha para o impoluto e honorável regime que nos governa desde 1975.
Especialistas ouvidos pela VOA, indicam que o fenómeno da corrupção em Angola é endémico e que falta vontade política para a combater. Será caso para se dizer que se a não podes vencer, junta-te a ela? Veremos.
O economista Filomeno Vieira Lopes recua na história económica e social de Angola para lembrar que a corrupção terá surgido antes mesmo da liberalização da economia, por isso defende a tomada de uma posição conjunta para fazer face ao fenómeno.
Em 1996 o chefe de Estado angolano preocupado com a corrupção, criou através de um decreto a Alta Autoridade Contra a Corrupção (dos outros). Fê-lo, contudo, na convicção de que a corrupção só é um mal, um perigo, quando beneficia gente que não é, como diz Filomeno Vieira Lopes, da sua casta.
O Director do Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola esclarece que os relatórios internacionais apresentam apenas um índice de percepção de corrupção e não exactamente a percentagem de pessoas corruptas. Alves da Rocha explica que, apesar de muitos não concordarem com a metodologia de avaliação, é importante que se tenha em conta os dados.
“Mas estas estatísticas existem e nós não podemos fazer como o avestruz que põe a cabeça debaixo da areia e faz de conta que não existe”, aclarou Alves da Rocha.
Mas a verdade é que o regime faz de conta que ela não existe. Aliás, se a corrupção deixasse de existir, como é que o regime sobreviveria, como é que financiaria as negociatas dos seus acólitos, como é que alimentaria os paraísos (fiscais ou não) de toda a corte de acéfalos seguidores?
Para Alves da Rocha, segundo a VOA, os níveis de corrupção em Angola estão a ganhar corpo devido ao desrespeito da legislação. O economista salienta, por outro lado, que o silêncio que se assiste deve-se em parte a uma alegada penalização que sofrem as pessoas que têm coragem de fazer denúncias.
Não é bem assim. Que se saiba, o regime até apoia todos aqueles que denunciem a eventual corrupção das zungueiras, bem como a que possa existir na oposição política e na dita sociedade civil que, apenas para chatear o “querido líder”, teima em dize que a corrupção existe e está de boa saúde.
Filomeno Vieira Lopes está convencido, naquela que é uma verdade de la Palice, que com a capacidade financeira que possui, se Angola adoptasse padrões de ética teria melhores resultados em termos de gestão do erário público.
Vieira Lopes salienta, por outro lado, que o país vive um factor estruturante de cumplicidade, no qual, todos aparentam concordar com o fenómeno, por isso considerou endémica a corrupção no território angolano.
“Há aqui um factor estruturante que é a chamada cumplicidade”, disse o analista que pensa, por outro lado, que o problema “é complexo”, porque, segundo defendeu “a corrupção é endémica, é sistémica. Todo nosso sistema hoje em dia está em torno da corrupção”.
De acordo com a VOA, Alves da Rocha entende que o antigo modelo económico de Angola também contribuiu para a instauração da corrupção. Isto quer dizer que, estando MPLA no poder desde a independência, foi ele que tornou a corrupção uma instituição do regime. Nada mais certo.
“Uma economia que não era propriamente uma economia socialista, uma economia administrativa centralizada, que vivia muito na base destes sistemas de lojas, dos preços fixados, preços que não tinham um reflexo da eficiência da economia”, recordou Alves da Rocha.
O volume de legislação angolana contra a corrupção é considerável. Aliás, quanto mais leis, apêndices, anexos e similares existirem, melhor medra a corrupção. Só falta, se é que já não existe na lei que está acima da própria Constituição e que resulta das conveniências do regime, uma lei que descriminalize a corrupção.
Para Alves da Rocha mais do que a legislação, “o que é preciso é que exista de facto vontade política para combater a corrupção”, uma questão em que o economista não acredita. Não acredita ele nem ninguém, até mesmo os que na Europa e nos EUA são contra a corrupção mas fazem dela um milionário sistema negocial.
Diz a VOA que a Procuradora Geral Adjunta da República, Pulquéria Van-Dúnem, entende por outro lado que com a vasta legislação “aparentemente enérgica” era suposto que os índices de corrupção no território angolano estivessem em situação mais moderada, porém, diz, a situação é mais grave em patamares mais elevados, chegando a influenciar a situação de pobreza que assiste no país.
“Ela vai a patamares muito mais elevados e é precisamente nestes patamares muito mais elevados onde a coisa é mais grave porque é ai onde há esta relação entre a corrupção e pobreza”, diz a Procuradora.
Pois é. E no patamar mais elevado quem é que está? Quem? O Presidente da República e o seu clã familiar? Não. Nada disso. Quem aí está, com o seu vasto clã de filhos famintos, é a dona Chica, a zungueira ali da esquina.
Filomeno Vieira Lopes acredita que ainda existam reservas morais no país, porém defende três elementos essenciais na luta contra corrupção: um sector judicial forte, o sistema de integridade e a abertura da sociedade. Como é bom sonhar. Como é bom ser idealista.
Pulquéria Van-Dúnem aponta também a acomodação dos cidadãos perante a situação, em face dos actos de corrupção. Para a Jurista o ensino dos valores éticos no seio familiar é fundamental.
“E nós próprios, não sei se temos tanto medo assim, vamos alimentando esta situação da qual todos nós depois vamos nos queixar, mas nós não podemos ficar de braços cruzados e esperar que as coisas mudem calmamente”, esclareceu.
É certo que em Portugal e França gestores de cargos públicos em Angola e pessoas singulares são acusados de lavagem e de transferência ilícita de dinheiro. Nomes como o do General Bento Kangamba, Secretário para Mobilização Periférica do MPLA em Luanda, o Procurador Geral da República, João Maria de Sousa, o Ministro de Estado e Chefe da Casa Militar da Presidência da República, Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa” estão na ribalta de processos que, sistematicamente, são arquivados.
Em síntese, há corrupção boa e má. A boa é a que enche os bolsos dos donos do poder. E é por isso que é preciso combater e derrotar a má…