Aconteceu na cidade de Cabinda algo insólito no dia 13 de Setembro: uma senhora entendeu expressar o seu protesto público contra a governação do Presidente João Lourenço rasgando a imagem gigantesca do seu rosto afixada no centro da cidade. Dizia a senhora no vídeo que está a circular: “eu dei-te o poder, mas agora acabou!…”
Por Raul Tati
O acto foi assistido por um grupo de cidadãos que não só não a impediu de fazer aquilo como apoiou o acto a 100%. Se prestarmos atenção ao vídeo vemos que há uma exultação dos cidadãos presentes e não uma repulsa.
Ora, li o comunicado do governo da província sobre a ocorrência. Antes que se enverede por acções de intolerância ou qualquer perseguição contra a cidadã, deixo aqui algumas reflexões.
Qual é a utilidade da imagem do Presidente da República nos locais públicos?
Coloca-se aqui um antigo problema do culto de personalidade ou culto a personalidade do líder. A expressão retrata uma estratégia política de exacerbada exaltação dos líderes sobretudo em regimes autoritários ou totalitários. É uma forma de propaganda que cria no imaginário colectivo um endeusamento do chefe legitimando a sua dominação através da idolatria e do medo. Essa prática esteve muito presente no século XX com algumas figuras de destaque como Adolfo Hitler, Estaline, Benito Mussolini, Mao Tse Tung, Fidel Castro, Mobutu, Idi Amin Dada, etc..
Uma das formas do culto a personalidade do líder é a colocação de painéis gigantes com a sua imagem em locais públicos e a sua disseminação em versão reduzida nos gabinetes administrativos. O culto a personalidade é uma idolatria que habitualmente acaba por ser terreno fértil para o surgimento de ditadores. Estes gostam de ser idolatrados e temidos. Um povo que faz do culto a personalidade do chefe uma religião acaba por comer o seu próprio veneno.
Em ambientes democráticos, onde a soberania está no povo, o PR deve ser visto e tratado como primeiro servidor do Estado. O PR é nosso “empregado”, merece o nosso respeito mas não o nosso culto. Por isso a exibição pública de imagens do PR é dispensável porque inútil. A Constituição da República de Angola traz no seu anexo os seguintes símbolos: a bandeira, a insígnia e o hino. Não tem cara do Presidente!
Creio que o próprio senhor Presidente João Lourenço ao retirar o rosto do seu predecessor da moeda nacional sem substitui-lo pela sua imagem, fê-lo na lógica contra o culto de personalidade. A decisão foi apoiada pelo grupo parlamentar do MPLA.
Portanto, procuremos ser razoáveis. Não há aqui nenhum sacrilégio. E se se apurar que a cidadã sofre efectivamente de demência, como sugere o texto do comunicado, então não há que despoletar mais diligências judiciais para a respectiva responsabilização.
Dixit!
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