A coordenadora residente das Nações Unidas em Moçambique, Myrta Kaulard, classificou como “muito grave” a falta de recursos financeiros para acudir à crise humanitária no país, reflexo do impacto da Covid-19 nos principais países doadores. “O problema dos recursos financeiros é muito grave”, referiu hoje em declarações à Lusa, em Maputo.
O plano humanitário lançado em Dezembro em conjunto pelo Governo moçambicano e ONU, com um apelo à mobilização de 254,4 milhões de dólares (211 milhões de euros) e enfoque em Cabo Delgado, tem merecido “respostas muito positivas”, mas Myrta Kaulard modera as expectativas quanto à concretização das doações.
“Temos de ser realistas: este ano é muito difícil, porque a Covid-19 tem implicações negativas para a economia global”, ou seja, “países que normalmente estão entre os que mais contribuem, são os que têm menos recursos que o habitual”, referiu. “E temos muitas outras crises humanitárias no mundo”, acrescentou.
Fonte da ONU em Maputo detalhou que, salvo algumas contribuições iniciais, como uma no valor de 3,6 milhões de dólares (2,9 milhões de euros) do Japão, entregue na quarta-feira, o plano “está severamente subfinanciado”.
Aquela responsável considerou que apesar de este ser um momento de limitações para os doadores, é também o momento certo para apoiar Moçambique, sob pena de as necessidades serem muito maiores e mais graves no futuro.
“Agora vale a pena investir, vale a pena contribuir, porque podemos ter soluções rápidas e isso é essencial para poder orientar de novo o norte de Moçambique para o seu caminho de desenvolvimento”, realçou. “Não fazer isto vai causar muito mais problemas e o país vai precisar ainda de mais recursos” no futuro, assinalou.
O problema do terrorismo, como o que afecta a região nortenha de Moçambique, “é muito complicado e não há uma única solução”, frisou Myrta Kaulard.
“As Nações Unidas estão a aumentar a capacidade e presença [na região], por um lado com resposta humanitária, mas também na vertente de recuperação”, assinalando que “uma das causas mais importantes [para a actual crise] é o défice de desenvolvimento”, pelo que importa apostar em capacitação institucional, cooperação e infra-estruturas – assinalando Kaulard a vantagem de poder contar com a Agência de Desenvolvimento Integrado do Norte (ADIN), que “permite integrar ajuda humanitária com reconstrução e desenvolvimento”.
Aquela responsável considerou igualmente importante “o respeito pelos direitos humanos”, “essencial para a paz e desenvolvimento”, assim como uma maior “resiliência ao clima”.
Os ataques de grupos armados começaram em 2017 e o conflito com forças moçambicanas prossegue, sendo que a origem e motivações dos agressores continua por esclarecer – alguns ataques foram reivindicados pelo grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico, mas delimitados entre Junho de 2019 e Novembro de 2020, deixando o debate aberto.
A crise humanitária resultante inclui 670 mil deslocados e mais de dois mil mortos, numa região identificada há anos como parte de rotas do tráfico internacional de droga, pedras preciosas, madeira e outros recursos.
Cabo Delgado é também a região onde avança o maior investimento privado de África para extracção de gás natural.
Lusa