A Procuradoria-Geral da República da Guiné-Bissau anunciou hoje, em comunicado, que emitiu um mandado de captura internacional contra Domingos Simões Pereira, líder do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
“O Ministério Público informa que já lançou um mandado de captura internacional contra o cidadão Domingos Simões Pereira, no âmbito de um processo-crime que segue os trâmites legais nesta instituição judiciária detentora da acção penal”, lê-se no comunicado.
Domingos Simões Pereira está há vários meses em Portugal, tendo viajado recentemente para participar na cerimónia de tomada de posse de Alpha Conde, Presidente da Guiné-Conacri, país vizinho da Guiné-Bissau, que se realizou na terça-feira.
Simões Pereira disputou as eleições presidenciais do final do ano passado com o actual Presidente, Umaro Sissoco Embaló, que assumiu o poder sem esperar pelo resultado do contencioso eleitoral que decorreu no Supremo Tribunal de Justiça.
Ontem, o Conselho de Estado recomendou ao Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, para não dissolver o Parlamento e continuar a procurar soluções através do diálogo inclusivo.
“Nós unanimemente aconselhamos o Presidente da República a continuar o esforço de busca de soluções através de um diálogo inclusivo”, afirmou no final da reunião o porta-voz indigitado do Conselho de Estado, Braima Camará.
O Presidente da República esteve ontem reunido quase três horas com o Conselho de Estado, depois de ter ouvido os partidos com representação parlamentar e o presidente da Assembleia Nacional Popular, Cipriano Cassamá, sobre uma eventual dissolução do Parlamento.
“Não há nada que ponha em causa o regular funcionamento das instituições da República, mas cabe ao Presidente decidir”, salientou Braima Camará, que é também o coordenador nacional do Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15). O Conselho de Estado é um órgão de consulta, não vinculativo.
A maioria dos partidos com representação no Parlamento da Guiné-Bissau também considerou que não há motivo para a dissolução da Assembleia Nacional Popular, depois de audiências em separado com o Presidente.
“Pensamos que a dissolução do Parlamento é uma prerrogativa do Presidente da República e achamos que neste momento não existe nenhuma crise no Parlamento”, afirmou Cipriano Cassamá, também primeiro vice-presidente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
O chefe de Estado admitiu na quarta-feira em Bissau ter convocado os partidos políticos e o Conselho de Estado para analisar a eventualidade da dissolução do Parlamento, depois de já ter feito críticas à actuação de alguns deputados.
O Parlamento da Guiné-Bissau aprovou o Orçamento do Estado para 2021, mas sem a presença da maior parte dos deputados do PAIGC, com excepção de cinco deputados que já tinham votado a favor do programa de Governo de Nuno Nabiam, de quatro deputados da Assembleia do Povo Unido-Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB) e do deputado da União para a Mudança.
No início de Dezembro, a representante do secretário-geral da ONU na Guiné-Bissau, Rosine Sori-Coulibaly, disse que as Nações Unidas iriam continuar a garantir a segurança do antigo primeiro-ministro guineense Aristides Gomes, refugiado na sede da missão política no país há vários meses.
“As Nações Unidas têm o papel de proteger as pessoas que se sentem ameaçadas no seu país ou no contexto em que vivem”, afirmou Rosine Sori-Coulibaly, em entrevista à Lusa por ocasião do encerramento do Gabinete Integrado para a Consolidação da Paz na Guiné-Bissau (Uniogbis), no próximo dia 31.
Segundo a responsável, Aristides Gomes era primeiro-ministro da Guiné-Bissau e estava sob a protecção da Ecomib, força de interposição da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que se retirou do país.
“Ele sentiu a sua segurança ameaçada e pediu a protecção das Nações Unidas. É o nosso papel e não é a primeira vez, na realidade, que na Guiné-Bissau e em outros lugares, damos protecção aos que pensam que há risco para a sua vida ou para os seus direitos”, afirmou Rosine Sorri-Coulibaly.
A representante do secretário-geral da ONU em Bissau afirmou também que dar protecção a Aristides Gomes faz parte da missão das Nações Unidas e “não é um problema”.
“A missão Uniogbis vai encerrar, mas as Nações Unidas permanecem. Se alguém está sob a protecção das Nações Unidas, as Nações Unidas ficam e a protecção vai continuar”, salientou.
“Esperamos que o problema se resolva de boa maneira, respeitando a lei do país, mas também os direitos daquela pessoa, e no âmbito do nosso programa de luta e protecção dos direitos humanos vamos continuar a trabalhar”, afirmou.
O antigo primeiro-ministro da Guiné-Bissau Aristides Gomes está refugiado na missão da Uniogbis há vários meses, na sequência da sua demissão do cargo pelo actual Presidente do país, Umaro Sissoco Embaló, e depois de a sua residência, em Bissau, ter estado cercada pelas forças de segurança, enquanto estava sob protecção da Ecomib.
A Procuradoria-Geral da República anunciou em Outubro que há dois processos no Ministério Público em que Aristides Gomes consta como suspeito e que quer ouvi-lo, tendo enviado notificações para a Uniogbis, sem ter recebido qualquer resposta.
Aristides Gomes está impedido de sair do país, depois de o Ministério Público ter imposto a medida de coacção de obrigação de permanência no território nacional.
Os advogados de Aristides Gomes afirmam que o Ministério Público não tem nada contra o antigo primeiro-ministro e acusam a Procuradoria-Geral da República de “perseguição política”.
Portugal poderá dar uma ajuda?
João Gomes Cravinho, ministro português da Defesa, perito de longa tradição socialista e certamente merecedor de um doutoramento “honoris causa” pelas causas africanas, caso do MPLA, foi quem – recorde-se – em Novembro de 2005, em entrevista ao Expresso, considerou que Jonas Savimbi (que tinha morrido três anos antes) foi igual a Hitler.
Em tempos, a Comissão de Negócios Estrangeiros do Parlamento português quis ouvir o então secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (João Gomes Cravinho) sobre a situação na Guiné-Bissau. Na altura, o caso do ex-chefe da Armada guineense, Bubo Na Tchuto, foi revelador do que Portugal (não) pensa sobre a Guiné-Bissau.
Em Janeiro de 2010, quando oficialmente Bubo Na Tchuto era procurado pela justiça e se tinha refugiado na sede da ONU em Bissau, João Gomes Cravinho disse que o caso veio “expor completamente a fragilidade das instituições” guineenses.
Basta ler (se alguém tiver paciência para isso) o que Gomes Cravinho disse uma vez, nem que seja há um par de anos, para se saber que sempre que fala da Guiné-Bissau usa as mesmas ideias, os mesmos argumentos, a mesma teoria e, é claro, a mesma passividade.
O então secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal só altera os nomes dos protagonistas. Na altura foi Bubo Na Tchuto, tal como já foram, entre outros, Hélder Proença, Baciro Dabó, Tagmé Na Waié e João Bernardo Nino Vieira.
E por falar em Gomes Cravinho, recordam-se que ele afirmou no dia 4 de Dezembro de 2007 que a União Europeia devia libertar-se da “bagagem colonial” na relação com África, reconhecendo que o continente “é hoje um igual” com “progressos notáveis” nos últimos anos?
E por falar em Gomes Cravinho, recordam-se que ele comparou em Novembro de 2005, numa entrevista ao Expresso, Jonas Savimbi (que tinha morrido três anos antes) a Hitler?
E por falar em Gomes Cravinho, é de crer que um dia destes irá dizer que “Nino” Vieira foi outro Hitler africano. Isto porque o então secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal, hoje ministro da Defesa, tem coragem suficiente para fazer destas afirmações sobre pessoas depois de eles terem morrido.
Sobre os vivos, por muito mais que eles se assemelhem a Hitler, Cravinho apenas sabe estar calado.
No dia 18 de Janeiro de 2010, João Gomes Cravinho afirmou que o Governo português acompanhava com a «atenção normal» a situação na província angolana de Cabinda, defendendo que o importante é a detenção de responsáveis de ataques criminosos.
Não está nada mal. Até parece que, para os donos do reino lusitano, falar de Cabinda ou de Zoundwéogo é exactamente a mesma coisa. Lisboa esqueceu-se, continua a esquecer-se, que os cabindas, tal como os angolanos, não têm culpa que as autoridades portugueses (grande parte delas do Partido Socialista) tenham, em 1975, varrido a porcaria para debaixo do tapete.
Quando interrogado sobre se o Governo português considerava preocupantes as notícias de detenções de figuras alegadamente ligadas ao movimento independentista na província de Cabinda, João Gomes Cravinho – hoje, corrobore-se, ministro da Defesa -afirmou que «preocupante é quando há instabilidade e violência, como aconteceu com o ataque ao autocarro da equipa do Togo» a 8 de Janeiro de 2010.
Sim, é isso aí. Portanto, o MPLA pode prender quem muito bem quiser (e quer, continua a querer, todos aqueles que pensam de maneira diferente) que terá, como é óbvio, o apoio e a solidariedade das autoridades portuguesas.
Tal como fez em relação a Jonas Savimbi depois de este ter morrido, Gomes Cravinho não tardará (provavelmente só está à espera que eles morram) a chamar Hitler, entre outros, a Raul Tati, Francisco Luemba, Belchior Lanso Tati, Jorge Casimiro Congo, Agostinho Chicaia, Martinho Nombo, Marcos Mavungo ou Raul Danda.
João Gomes Cravinho explicou na altura que, «em relação ao mais» Lisboa acompanha o que se passa «pelas vias normais», isto é, pela comunicação social e pelos relatos feitos pela embaixada portuguesa.
Ou seja, Portugal está-se nas tintas. E quando Cravinho diz que Lisboa acompanha o que se passa pelos relatos feitos pela embaixada portuguesa estava a esquecer-se que a embaixada lusa se limitava, como se limita hoje, a ampliar a versão oficial do regime angolano.
Como se já não bastasse a bajulação de Lisboa ao regime angolano, ainda temos de assistir à constante passagem de atestados de menoridade e estupidez aos portugueses por parte de alguém que, depois do desastroso papel como secretário de Estado, chega a ministro da Defesa.
Folha 8 com Lusa