O ministro da Justiça angolano, Francisco Queiroz, destacou hoje, em Luanda, que o país está empenhado na prevenção, repressão e combate à corrupção, destacando a formação de 30 técnicos e oficiais de justiça, com apoio de Portugal e da União Europeia. Recorde-se que, em 12 de Dezembro de 2019, o mesmo ministro afirmou que a corrupção em Angola tem a sua génese no período colonial português.
Francisco Queiroz discursava hoje na abertura da primeira fase do curso que decorre no âmbito do PACED – Projecto de Apoio à Consolidação do Estado de Direito nos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa) e em Timor-Leste (PALOP-TL), que conta com apoio financeiro da União Europeia e co-financiamento e gestão do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua.
O governante sublinhou que a confirmação de que Angola pretende combater a corrupção, através de medidas preventivas de penalização e aplicação da lei e do reforço da cooperação internacional, está expresso num despacho presidencial que criou o grupo de trabalho para a realização de estudos e a elaboração de propostas e mecanismos de implementação da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção no Ordenamento Jurídico.
Para fazer face às restrições de circulação devido à pandemia de Covid-19, os formandos vão receber os conhecimentos de formadores em Lisboa, por formato digital, sendo beneficiários técnicos e oficiais de justiça das províncias de Luanda, Huambo, Huíla, Cuanza Norte e Benguela.
Segundo o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, a produção de um manual de formação, que será a base para a futura formação nacional, com tutoria dos formadores coordenadores, decorrerá em Angola, é a fase que se segue depois da avaliação e consolidação de conhecimentos, a desenvolver igualmente em território nacional.
Por sua vez, o embaixador de Portugal em Angola, Pedro Pessoa e Costa, frisou que a concretização desta actividade formativa só é possível graças à cooperação entre múltiplas entidades, nomeadamente o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos de Angola, através do Instituto Nacional de Estudos Judiciários, do Ministério da Justiça de Portugal, por via do Centro de Formação da Direcção-Geral da Administração da Justiça, bem como do Tribunal Supremo e da Procuradoria-Geral da República angolanos.
Pedro Pessoa e Costa realçou a importância desta formação numa altura em que Angola aprovou o seu novo Código Penal, em substituição do centenário documento de 1886, destacando a importância da produção conjunta dos materiais de formação que terá lugar na segunda fase deste curso e que será igualmente ministrado online.
“O PACED tem, na verdade, sabido consolidar-se como um parceiros presente, que muito embora faça um trabalho silencioso, às vezes silencioso demais, é reconhecido por todos os parceiros nos diferentes países e vem produzindo importantes resultados, designadamente em Angola, em linha com o esforço nacional de consolidação do Estado de Direito, através da adopção de medidas de prevenção e combate à corrupção, ao branqueamento de capitais e à criminalidade organizada”, disse.
Já a representante da União Europeia em Angola, Jeannette Seppen, referiu que o reforço da capacitação nestes domínios dos países beneficiários foi uma das tarefas que o PACED assumiu e que a equipa de gestão tem vindo a trabalhar com muita dedicação e competência.
Jeannette Seppen afirma que para Angola em particular, o PACED tem estado a envolver os principais atores-chaves nestas matérias, designadamente o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, os tribunais, o Ministério Público, o Banco Nacional de Angola e a Unidade de Informação Financeira, bem como os Serviços de Investigação Criminal do Ministério do Interior.
A representante da União Europeia em Angola salientou que num momento de plena actualidade destes temas, em especial a corrupção e o branqueamento de capitais, assumidos pelas entidades nacionais como prioridades políticas, espera-se que estas actividades contribuam para melhorar significativamente a situação nestes domínios.
Francisco Queiroz, Diogo Cão e um Bruce Lee qualquer
O ministro Francisco Queiroz é o mesmo que no dia 9 de Dezembro de 2019 disse, em Luanda, que a corrupção em Angola tem a sua génese no período colonial português, uma fase que causou mais prejuízos ao país do que após a independência. E se ele o disse, até porque na altura da independência já tinha 24 anos de idade e de convivência colonial, é porque é verdade.
Francisco Queiroz falava então na abertura das Jornadas sobre o Dia Internacional contra a Corrupção, comemorado sob o lema: “Combate à Corrupção, Nossa Responsabilidade”, uma matéria à qual – como se sabe – o MPLA está imune, mesmo sabendo-se que todos casos conhecidos envolvem personalidades do… MPLA.
O governante dividiu historicamente a corrupção em Angola como tendo dois momentos, o primeiro do período colonial português, até 1975 e cujas sementes devem ter sido largadas por cá às toneladas já nos tempos de Diogo Cão, e o pós-independência nacional (em que todos os governos foram do MPLA) até aos dias de hoje, caracterizada por uma corrupção em grande escala, sempre com o epicentro no MPLA.
Segundo Francisco Queiroz, a corrupção no período colonial confundia-se com o sistema daquela altura, “baseado numa lógica de corrupção violenta de dominação”. Acresce que, apesar de ser “violenta de dominação”, medrou exponencialmente no seio do partido, o MPLA, a quem o governo português entregou o país, reconhecendo que – afinal – era o mais bem preparado para continuar a dar guarida e incentivar a… corrupção.
Em declarações à comunicação social, o ministro sublinhou que naquela altura foram usados meios violentos, meios corruptivos de promessas de melhor civilização, de valores morais mais elevados, de cultura superior. E foi nessa escola, nessa cátedra, que se doutoraram os dirigentes do MPLA, acabando mesmo por se revelarem melhores do que os seus professores.
“Enganaram-nos para fazer a pilhagem dos nossos recursos, de maneira bastante imoral, do ponto de vista histórico e de todos os princípios”, disse Francisco Queiroz, acrescentando que não há dúvidas que foram causados “prejuízos enormes”, como certamente justifica o facto de que o ministro tenha tirado o Curso de Mestrado em Ciências Jurídico-Económicas, pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, Portugal, com a dissertação “Economia Informal, Perspectiva Jurídico-Económica”.
Comparando os dois momentos, frisou que, “claramente, o período da colonização” foi o que trouxe mais prejuízos, pois “a colonização em si mesmo é um processo de corrupção”. Patrioticamente, o MPLA reagiu e mostrou aos ex-colonizadores que, afinal, a independência foi o processo de os dirigentes do partido mostrarem que corrupção com corrupção se paga.
O titular da pasta da Justiça e dos Direitos Humanos realçou ainda que foram “500 anos de corrupção activa, de espoliação dos recursos, de quebra dos valores morais, de castração da própria personalidade”. E tem razão. É que, segundo os mesmos doutos especialistas que dizem que o MPLA venceu a Batalha do Cuito Cuanavale, é bem possível que até Diogo Cão fosse já militante do partido. Aliás, se não fosse o MPLA Angola não existiria (por alguma coisa dizem que o “O MPLA é Angola e Angola é o MPLA”).
“Os prejuízos foram enormes, ainda hoje nós estamos a pagar e vamos pagar por muito tempo os prejuízos causados, para não falarmos já daqueles períodos de sangria humana, através da escravatura”, afirmou o antigo Ministro da Geologia e Minas, nomeado por Decreto Presidencial nº 200/12 de 1 de Outubro, por aquele presidente que foi um paradigma da honorabilidade e transparência, de seu nome José Eduardo dos Santos.
De acordo com o ministro Francisco Manuel Monteiro de Queiroz, mesmo depois da independência, a corrupção continuou, facilitada pelo sistema de desenvolvimento adoptado, baseado na ideologia do comunismo pelo seu patrono José Eduardo dos Santos e na direcção centralizada da economia, que faliu, gerando um estado de pobreza monumental.
Francisco Queiroz sublinhou que o novo ambiente pós-colonial “facilitou muito que aqueles mesmos que antes faziam parte do sistema colonial viessem prolongar a sua presença” e “realizar acções junto das autoridades para terem benefícios económicos ou comerciais para seu interesse próprio”.
“Inicialmente, a corrupção era com televisores, caixas de coca-cola, com pequenas coisas, porque eles viram que era essa a grande fragilidade e depois evoluiu para contratos com o Estado para conseguirem negócios com o Estado”, referiu, não explicando (pudera!) onde andava e o que fez durante décadas para contrariar os esquemas do seu partido.
Segundo o governante do MPLA, os próprios agentes do Estado foram alinhando com isso, “atingindo um ponto tal que se perdeu o controlo”. E quem eram esses agentes? Têm nomes? Algum deles nasceu no Bié, em 1951, e chama-se Francisco Manuel Monteiro de Queiroz?
Depois da corrupção em grande escala, indicou o ministro, vem a pequena corrupção, “a gasosa, o cabritismo, o esquema (subornos)”, situações que perduram até hoje perante as medidas radicais dos governos do MPLA que continuam a tapar o Sol com uma peneira e… durante a noite.
“A corrupção em Angola acabou por ser sistémica, porque teve essa envolvência institucional” com “muitas figuras conhecidas, e outras nem tanto”, quer do lado dos agentes do Estado quer do lado dos agentes da economia, defendeu o ministro que, apesar de ter entrado para o MPLA em 1974, continua a ser uma “virgem” pura, puritana e incólume a todos esses males.
“Não podemos pensar que a corrupção é só do lado do Estado, não. O agente da corrupção normalmente é um agente privado, é aquele que recorre ao agente público para conseguir vantagens pessoais. Há sempre os corruptores nacionais e internacionais, a nossa corrupção é em grande medida importada”, destacou.
Na sua intervenção, Francisco Queiroz disse que Angola vive uma situação insustentável quanto aos índices de corrupção e seus efeitos na vida social, política, económica e moral e “alguém tinha de ter a coragem de encarar esse monstro e inverter a dinâmica deste cancro social que vem destruindo as células vivas do tecido social”.
Francisco Queiroz apelou à facilitação da comunidade internacional e dos parceiros da cooperação na recuperação de activos do Estado angolano, ilicitamente transferidos para outros países, aspecto que “reclama maior unidade de resposta internacional para o combate à corrupção em Angola”.
Folha 8 com Lusa