Uma equipa de investigadores em Portugal descobriu que o parasita malária e a bactéria ‘E.coli’ evitam a sua destruição através da modulação de proteínas receptoras da célula hospedeira. Enquanto isso, em Angola a malária continua a ser a principal causa de morte e a incompetência dos governantes o principal problema.
Num artigo agora publicado na revista científica “Scientific Reports”, os investigadores explicam que até agora sabia-se que várias bactérias e parasitas se servem da maquinaria da célula hospedeira para seu proveito, evitando a sua própria destruição, ou fagocitose, sem que em muitos dos casos se saiba exactamente como e que agora foi descoberto o mecanismo pelo qual estes microrganismos subvertem a fagocitose da célula hospedeira.
“O sistema imunitário tem como função defender as células de agentes patogénicos externos ao organismo. A primeira linha de defesa é operada por células como os macrófagos, os neutrófilos e as células dendríticas, cuja função é fagocitar (“fagos” = comer e “citos” = célula), ou, por outras palavras, internalizar e destruir os agentes patogénicos” adiantam a equipa de investigadores do Centro de Estudos de Doenças Crónicas (CEDOC-NMS|FCM) da Universidade Nova de Lisboa e do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), liderada por Duarte Barral (CEDOC-NMS|FCM).
A fagocitose é o englobamento e digestão de partículas sólidas e micro-organismos por células, processo que nos humanos está ligado directamente ao processo imunológico.
Duarte Barral explica num comunicado que o estudo representa “um valioso contributo para o crescente conhecimento não só das estratégias usadas por estes microrganismos, mas também dos mecanismos de defesa das nossas células contra eles”.
“Futuramente, este conhecimento poderá ter importância no desenvolvimento de novas estratégias para combater infecções provocadas por este tipo de microrganismos”, adianta.
Num estudo anterior, os investigadores tinham já demonstrado que o parasita da malária ‘Plasmodium berghei’, e a bactéria ‘E. coli’, ao infectarem as células do hospedeiro levam ao aumento da expressão de proteínas da célula hospedeira, cuja consequência é a inibição da fagocitose e consequentemente da destruição dos parasitas.
Duarte Barral, salienta que “é interessante que uma bactéria e um parasita tenham evoluído independentemente estratégias semelhantes de escapar à sua destruição, provavelmente por ser a forma mais eficiente de o conseguir; isto revela um conhecimento profundo dos mecanismos celulares por parte dos microrganismos, resultado de milhões de anos de co-evolução”.
Nós por cá… malária que se farta!
Angola registou só no primeiro trimestre deste ano mais de 720 mil casos de malária, a principal causa de morte no país, que resultou em quase 2.100 óbitos, segundo dados das autoridades sanitárias.
De acordo com um relatório do Ministério da Saúde, no que diz respeito à situação epidemiológica do país sobre a malária foram registados de Janeiro até ao dia 2 de Abril, 720.086 casos, dos quais 2.096 pessoas morreram.
Os dados indicam como províncias mais afectadas Luanda, com 177.029 casos e 278 óbitos, Benguela (90.896 e 348 óbitos), Uíge (69.164 e 250 óbitos) e Bié (65.068 e 324 óbitos).
Já as províncias com os menores números de casos e óbitos são Cabinda (2.061 e cinco óbitos), Namibe (5.355 e cinco óbitos) e Cunene (5.926 e 28 óbitos).
A província do Huambo, apesar do reduzido índice de casos (24.757), comparativamente às restantes regiões apresenta um elevado número de mortes, com um total de 122 óbitos, igual situação à do Cuanza Sul, com um registo de 40.990 casos e 141 mortes.
A malária, além de constituir a principal causa de morte em Angola, é também o principal motivo de internamentos hospitalares e de abstenção escolar e laboral.
A malária segundo o Jornal de Angola
Em Abril de 2012, o Jornal de Angola (esse órgão de referência mundial) escrevia que as autoridades sanitárias angolanas previam iniciar, a partir de 2015, o processo de pré-eliminação da malária, a doença tropical que mais óbitos provoca no país. Em manchete escrevi: “Malária em Angola em vias de extinção”.
O coordenador do Programa de Luta contra a Malária explicou que a probabilidade de Angola iniciar o processo de pré-eliminação da doença reside na contínua redução de casos da doença. Notável.
Filomeno Fortes, que falava à margem da reunião extraordinária da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) sobre saúde, frisou que as autoridades angolanas e os seus parceiros estão empenhados em baixar, cada vez mais, o índice de mortalidade por malária no país.
“A manter-se este nível de redução, a partir de 2015 podemos pensar na possibilidade da pré-eliminação da doença no país”, sublinhou Filomeno Fortes.
O médico disse que, há dez anos, o país registava 20 mil óbitos por ano, mas actualmente o número baixou para uma média de seis mil, devido ao esforço desenvolvido pelo Executivo (como acontece desde 1975) no sector da saúde, que estabelece a redução de casos de paludismo entre as populações.
Filomeno Fortes disse acreditar que, em 2013, iria haver uma diminuição da mortalidade por malária, cuja cifra deve fixar-se em cerca de quatro mil óbitos por ano.
O médico revelou haver falsos diagnósticos de malária devido à existência de certos vírus que provocam sintomas semelhantes aos causados pelo paludismo.
“Realizámos estudos que comprovam a existência de alguns vírus que provocam quadros clínicos parecidos com os da malária, como febres, dores de cabeça e articulares”, acentuou Filomeno Fortes. Sobre este assunto, salientou que, por não haver capacidade para a realização de um diagnóstico diferencial, certos técnicos de saúde continuam a diagnosticar falsamente esses casos como malária.
O presidente da reunião de peritos da SADC, Augusto Rosa Neto, disse que foi aprovada a assinatura de um memorando de entendimento para a criação de laboratórios supranacionais de referência, em centros regionais de excelência.
“Neste momento, existem laboratórios na África do Sul, Zimbabwe e Botswana, que vão atender os casos de malária, tuberculose e VIH/Sida dos países membros da SADC”, informou.
Os laboratórios nacionais vão continuar a funcionar normalmente, mas os que não têm condições para realizar exames podem enviar para os países membros que dispõem de capacidade.
O Lesoto, as Ilhas Maurícias e as Seychelles são os três países da SADC que já não registam casos de malária, enquanto Moçambique é aquele que regista o maior índice de casos. Na altura, a directora nacional adjunta de Saúde Pública de Moçambique, Rosa Marlene, apontou como causas principais a situação epidemiológica e as questões ecológicas resultantes do clima.
“Moçambique é uma região que tem grandes rios e muita água na costa. Por essa razão, já tivemos dez milhões de pessoas infectadas com malária. Neste momento, estamos com três milhões de casos”, sublinhou a responsável moçambicana.
A doença é uma das principais causas de morte em Moçambique, razão pela qual tem sido prioridade do governo coordenar os métodos de prevenção e de cura.
“Este encontro tem vantagens porque, para conseguirmos eliminar a malária, as acções têm de ser concertadas e, com a troca de experiências e informação, podemos chegar a melhores soluções”, acrescentou Rosa Marlene.
Folha 8 com Lusa