O Ben voltou. Arlindo Chenda Pena “Ben Ben”. Vinte anos depois. General (à época do fatídico) chefe de Estado-Maior General Adjunto das FAA (hipoteticamente exército nacional e não do MPLA), logo distante, da guerrilha. Evacuado, por doença, para a África do Sul aí viria a falecer.
Por William Tonet
Sendo cidadão de pleno direito, a família pensou em trazer o corpo, como acontece com qualquer cidadão, mas, inesperadamente, o regime, vetou a pretensão.
Com este gesto, levou, também, à morte a mulher Vide. Aprisionar um corpo inerte, numa câmara fria, num país estrangeiro, não lembra o diabo, mas demónios que, boçalmente, não se coibiram de imputar despesas ao Estado face a essa bestialidade, quando Ben Ben não amedrontava nada, nem ninguém…
Quanto o país gastou? Quem será o responsável por esta monstruosa violência, só possível ser praticada por mentes subdesenvolvidas, demoníacas?
Não aceito a tese deste pensamento estar aliado aos pretos, aos africanos. Não! Sou preto, angolano e africano e não penso, nunca pensei, nunca pensarei de forma bastarda.
Quem aprisiona um morto e dele tem medo, não é um ser humano normal. É um demente, um subdesenvolvido, um bastardo, um desprezível na face da terra.
Não existem justificações, plausíveis, do MPLA para tamanha barbaridade, contra a mulher, filhos, mãe, irmãos e família do malogrado, impedindo a realização, de acordo com a cultura angolana dos povos Ovimbundus, o sagrado ritual, pós-morte.
Hoje, quando o Presidente da República, João Manuel Gonçalves Lourenço se engaja na reposição da justiça, trazendo de volta, a expensas do Estado, o meu amigo, general Arlindo Pena Ben Ben à terra que o pariu, mexeu com o meu subconsciente. Merece os meus aplausos.
Obrigado Presidente. O Senhor, neste quesito, agiu bem. Parabéns.
O Ben Ben é meu amigo de peito, lembrar-me-ei sempre dele, pois, na Jamba, quando em 1989 estive preso, acusado de espião da KGB (Polícia Política Russa) e da DISA (Polícia Política do MPLA), nenhum dos meus amigos, que na altura já estavam lá, teve algum gesto de solidariedade.
Ele, ao tomar conhecimento da situação, saiu de noite, do seu quartel-general, em Licua, para a Jamba e lá chegado, antes mesmo de se apresentar ao gabinete do então alto comando e presidente da UNITA, foi para o departamento onde a BRINDE (Polícia Política da UNITA) me estava a interrogar.
Cumprimentou, retirou-me da sala e disse: “Se tiver de acontecer alguma coisa, antes tens de tirar uma foto comogo” e chamou a esposa, a Vide, para postarmos os três. Memorável.
Foi um momento de desanuviamento de minha parte, e, na altura, dei, mais uma vez, dimensão ao conceito amizade, pois aquele acto ajudou a BRINDE e Savimbi, à reflexão, antes mesmo de ter chegado, três dias depois, a ordem expressa, do Secretario de Estado e Congresso americano, depois das diligentes intervenções, à época, do director da Voz da América, Greg Pirio, para a minha imediata libertação. O que viria a acontecer, 24 horas depois.
A partir daquela data, a minha amizade com o Ben Ben saiu mais reforçada e passei a cobrir todas as zonas de conflito, conquistadas pela UNITA sem restrições, até novo reencontro em 15 de Maio de 1991, por intermédio do general Mackenzi, nas matas do Moxico, onde viríamos a assinar os primeiros Acordos de Paz de Angola, para travar os sangrentos combates entre as tropas militares das FALA e das FAPLA, para a conquista de novas posições.
Aos 19 de Maio de 1991, foram assinados os primeiros acordos de paz, entre os militares da UNITA (FALA) e do MPLA (FAPLA), mediados por um angolano, William Tonet, antes dos Acordos de Bicesse.
Foi bonito ver Ben Ben e Higino Carneiro, rubricarem os Acordos do Alto Kauango (Luena-Moxico) de 19 pontos, que instituíram, pela primeira vez, o telefone vermelho entre os líderes: Dos Santos-Savimbi; patrulhas conjuntas, etc..
Por tudo isso, Ben Ben, tenho de te dizer, 20 anos depois de teres estado preso (1998-2018), na Africa do Sul, a mando do regime do MPLA/Dos Santos, mais um pouco igualarias Mandela, que ficou 27 anos, para perdoares aos teus algozes.
Parte em paz, na tua magnanimidade, e repousa o bastante, na terra onde foste parido e estão enterradas as tuas secundinas, sob o olhar silencioso de Deus-Pai e da tua vigorosa mãe, família, amigos e conterras.
Eu apenas te digo: Até breve Amigo!
Foto. O Jornalista William Tonet foi o mediador dos Acordos do Alto Kauango, subscritos pelos generais Higino Carneiro e “Ben Ben”.