A classe jornalística conhece algumas façanhas da família Madaleno, e por isso as declarações do principal rosto desta família não deveriam surpreender tanto os jornalistas como temos visto.
Por Sedrick de Carvalho
Os Madaleno não são visados pelos órgãos de comunicação obviamente porque o controlo político que há sobre a esmagadora maioria dos órgãos, desde os estatais aos privados, nunca permitiu, e também, embora pouco perceptível, pela chamada “solidariedade profissional”, pois a família é dona de vários jornais.
Mas o Folha 8 e o Maka Angola sempre denunciaram as falcatruas de Álvaro Sobrinho e do irmão Emanuel Madaleno, sócio e PCA da Nova Vaga, e que fisicamente apresentava-se às redacções do grupo Score Media, este que reúne à sua volta um gigantesco conglomerado de empresas que servem essencialmente para encobrir os esquemas de corrupção.
Em 2013, enquanto José Eduardo dos Santos mostrava ao irmão que já não servia para os seus interesses de locupletação, um grupo de trabalhadores da Transdis descrevia-me o sofrimento que passavam por falta de salários atrasados. Esta empresa de transporte de cargas e passageiros, quer aéreo como terrestre, foi comprada por Emanuel Madaleno a Manuel Vaz Lopes e Joaquim dos Santos Gomes, tendo este passado a ser o administrador-gerente da mesma, ou seja, de dono para empregado de Emanuel Madaleno.
Publiquei a notícia no Folha 8, onde destaquei a participação de Silvestre Tulumba no incumprimento contratual, de tal forma que passei a ser indirectamente ameaçado, contaram-me os representantes dos trabalhadores que reuniam com Madaleno, dizendo “ele não pode voltar a escrever senão terá problemas, e vocês também”.
Simultaneamente estava nos primeiros dias dos seis meses de estágio no Novo Jornal, propriedade de Álvaro Sobrinho, e por isso o artigo foi assinado com um pseudónimo. Digamos que estava sentado com os dois irmãos à mesma mesa.
Esta longa introdução serve para chegar ao ponto principal deste artigo, que são as declarações de Álvaro Sobrinho à TPA no dia 3 de Setembro, referentes ao interrogatório a que foi submetido pelas autoridades das Ilhas Maurícias. A teia corrupta angolana chegou tão longe ao ponto de comprometer a presidenta daquele país africano que tem excelentes índices a nível mundial quanto ao desenvolvimento humano, democracia e boa governação, sendo o primeiro no índice Mo Ibrahim há cinco anos consecutivos.
A presidenta Gurib-Fakim voluntariamente demitiu-se por ter usado 25 mil dólares de um cartão bancário fornecido pela Planet Earth Institute, ONG financiada pelo nosso Sobrinho, mas este diz que o dinheiro foi dado pela fundação de Bill Gates e a esposa Melinda.
Ao longo das explicações, Álvaro Sobrinho deixou claro ter realmente oferecido carros, mas alegou ter dado “aos empregados, directores e quadros superiores da empresa”, e não aos altos funcionários do governo de Gurib-Fakim. Mas Sobrinho frisou que “os carros que eles dizem ser carros de luxo estão incluídos carros que aqui são carros absolutamente normais, que custam 30, 40 mil dólares”.
Pela serenidade como afirma que 30 a 40 mil dólares é o custo de carros normais em Angola , percebemos que Álvaro Sobrinho está completamente desfasado da realidade angolana, e estamos perante um caso concreto da visão que os poucos mas muito ricos têm do país ao generalizarem a redistribuição do saque.
Ao câmbio do BNA actual, 40 mil dólares são quase 12 milhões de Kwanzas. Com esse dinheiro algumas pessoas certamente cantariam melhor que o italiano Pavarotti. E lá fomos espreitar os preços de viaturas. Por 40 mil dólares compra-se um Kia Sportage fabricado em 2017, ou o Ssangyong Korando 4×4, passe a publicidade. O certo é que estes carros num país onde o salário mínimo ronda os 15 mil Kzs, 52 dólares ao câmbio oficial, não são carros “absolutamente normais”.
Porém, se 40 mil dólares em Angola são os milhões de Kzs que vimos, nas Ilhas Maurícias são um milhão e 332 mil rupias, num país onde o salário mínimo são 562 rupias. São quase 16 USD, mas o nível de bem-estar do país é tão elevado ao ponto deste salário servir para suprir as necessidades básicas mensal do cidadão. E por isso 40 mil dólares de oferta em carro alertam as autoridades financeiras. Em Angola também deveriam preocupar as autoridades, mas a corrupção está tão entranhada que não assusta quem tem a obrigação de investigar.
E este é mais um elemento para vermos o quanto Álvaro Sobrinho está habituado a manipular avultadas somas de dinheiro ao ponto de estar completamente alheio ao impacto que 40 mil dólares têm na vida do comum cidadão, este mesmo que ele diz ser possuidor de “carros absolutamente normais”.
Entretanto, não foi apenas um carro que ofereceu. Esse nosso Sobrinho!