O presidente e cabeça-de-lista da UNITA às eleições gerais angolanas realizadas quarta-feira apelou à população para defender a “soberania expressa nas urnas” e para que se assuma como “procurador” de um eventual crime de manipulação de resultados eleitorais.
Isaías Samakuva, falava em Viana, arredores de Luanda, numa declaração ao país para abordar o processo eleitoral, depois de a Comissão Nacional Eleitoral (CNE – sucursal do MPLA) ter divulgado resultados provisórios – que o partido não reconhece – dando a vitória ao MPLA, com 61% dos votos e a eleição de João Lourenço para Presidente da República.
“Hoje, através desta comunicação, queremos apenas felicitar os angolanos por terem manifestado a sua soberania de forma exemplar e transmitir ao país os sete passos fundamentais que os angolanos todos devem dar para defender a nossa soberania expressa nas urnas”, exortou Isaías Samakuva.
Depois de concluídos estes passos, “conducentes a assegurar a legitimidade dos resultados eleitorais”, é que, disse, será feito o “reconhecimento por todos os angolanos dos resultados eleitorais”.
“O país precisa de determinar primeiro os resultados eleitorais com base na lei para depois reconhecê-los”, apontou, depois de não ter reconhecido validade aos resultados provisórios das eleições gerais avançados pelo MPLA e legitimados à pressa pela CNE, que colocam a UNITA no segundo lugar, com 26,72% dos votos, por serem diferentes dos dados já compilados pelo partido.
Para o líder da UNITA, o primeiro passo é reconhecer que a eleição “não é um simples jogo político entre forças concorrentes”, mas sim a “expressão mais profunda do exercício dos direitos humanos” e a “manifestação mais sublime do poder mais elevado da nação, o poder do povo.
“Porque não há poder nenhum acima do poder do povo”, afirmou. Deveria ser assim. Mas Samakuva sabe que, sobretudo depois de 2002, acima do povo está essa entidade divina que dá pelo nome de MPLA.
Nesse sentido, recordou que “todos devem respeitar escrupulosamente” o resultado das urnas e que “é crime manipular, alterar ou distorcer a vontade do povo”.
“É um crime contra a pátria, porque traduz um ataque à soberania nacional. Mesmo que seja cometido por agentes do Estado”, afirmou, numa alusão à desconfiança generalizada da oposição face à CNE.
Disse, por isso, que não se pode “contar apenas com os órgãos do Estado” e que as instituições “ainda são frágeis e facilmente podem ser controladas ou dominadas pela falta de lisura, por interesses mercantilistas e pela corrupção”.
“O povo deve assumir-se como o principal procurador deste crime, porque a soberania não pode ser subvertida por instituições que não respeitam a supremacia da Constituição e da legalidade democrática”, afirmou.
Outro dos passos apontados pela UNITA é “controlar os actos” da CNE: “A partir de agora e até ao dia da investidura dos nossos representantes, o povo eleitor deve fortalecer os mecanismos democráticos de vigilância dos actos da administração eleitoral”.
Assim, e sobre o processo de escrutínio dos votos de quarta-feira, Samakuva recordou que as comissões provinciais só hoje começaram a trabalhar – por isso não forneceram dados à CNE para avançar com resultados provisórios – pelo que os comissários eleitorais foram surpreendidos pelos anúncios de dados.
“Se as comissões provinciais eleitorais não forneceram os dados, então quem forneceu os resultados que a CNE divulgou? Os comissários eleitorais que estiveram no centro de escrutínio nacional acreditam que os resultados anunciados foram fornecidos por outra entidade qualquer e não aquela estabelecida na lei, o que é inaceitável”, afirmou o líder da UNITA.
Outro dos sete passos que Samakuva aponta para a defesa da soberania nacional expressa nas urnas é a “confirmação da integridade das actas escrutinadas nos centros de escrutínio e compará-las com as cópias das atas entregues aos delegados de lista”.
Passa ainda por “exigir que a CNE se mantenha nos marcos da lei”, explicando aos angolanos “o que fez mal e porque fez mal”.
Até segunda-feira, a UNITA garante que vai divulgar os dados do escrutínio que está a realizar com base nas actas das mesas de voto enviadas pelos delegados de lista nas 18 províncias.
A CNE só deverá anunciar a 6 de Setembro os resultados finais das eleições gerais que, além dos deputados ao parlamento, elege o Presidente e o vice-Presidente da República.
MPLA vira virgem ofendida
O MPLA, qual virgem de esquina de estrada ofendida, apelou hoje aos angolanos para desencorajarem e condenarem “as tentativas de provocar distúrbios e instabilidade”, por aqueles que têm “um historial de destruição e desordem no país”. Tradução: Fantasma de Savimbi volta a atacar.
Em comunicado, sem (cobardemente como é seu timbre) citar nomes, o MPLA atribui a intenção desses actos àqueles que “não foram capazes de captar a simpatia do eleitorado, tendo saído derrotados”.
Na quarta-feira, Angola realizou eleições gerais, tendo sido vencedor – segundo ordens de quem de facto está a mandar nisto tudo, o general Manuel Hélder Vieira Dias Júnior Kopelipa – o partido MPLA, de acordo com os dados provisórios que a CNE assumiu como sendo seus, com 61,70% dos votos, resultado que os partidos da oposição contestam por não corresponder à contagem feita com base nas actas-síntese.
Na sua mensagem, o MPLA sublinha que, na quarta-feira, “o povo angolano, os cidadãos eleitores, deram mais uma prova de civismo, ao participarem massivamente e de forma ordeira, no exercício do seu direito de voto”, restando apenas esperar pela declaração dos resultados dessa votação – que já encaminhou para a sua sucursal – a ser feita pela CNE.
“Na realidade, os resultados do escrutínio provisório apontam para a vitória, por maioria qualificada, do MPLA nestas eleições, correspondendo aos banhos de multidões, que a opinião pública nacional e internacional teve a oportunidade de constatar, durante a campanha eleitoral e, também, no período que a antecedeu”, refere a nota.
O documento lembra que, “assim, o próximo Presidente da República de Angola será o camarada João Manuel Gonçalves Lourenço, e o vice-Presidente, o camarada Bornito de Sousa Baltazar Diogo”.
O partido liderado, de facto, por Manuel Hélder Vieira Dias Júnior Kopelipa sob o manto diáfano de José Eduardo dos Santos, realça que a “história recente” angolana, demonstra que “nestas alturas, a oposição, derrotada, procura sempre confundir a opinião pública nacional e internacional, dizendo que ganhou as eleições, levando o espantalho da fraude, para, em vão, procurar travar a divulgação dos resultados definitivos pela entidade competente, a Comissão Nacional Eleitoral (CNE)”.
Apostando neologismos que começou a colocar no léxico eleitoral angolano em 2008 e 2012, a palavra verdade passou a ser substituída por “espantalho da fraude”.
O partido no poder em Angola, desde 1975, acrescenta que “a organização e a transparência de todo o processo eleitoral, nomeadamente no dia da votação, foram constatadas pelos eleitores e pelos observadores nacionais e estrangeiros que, por esse facto, não têm irregularidades de relevo a assinalar e tiveram a participação de delegados de lista de todos os partidos que concorreram”.
Os últimos dados provisórios do MPLA (via CNE), apontavam para a liderança do MPLA com 61,05% dos votos, atribuindo à UNITA 26,72% dos votos, à CASA-CE 9,49%, ao PRS 1,33% e à FNLA 0,91%.
Subserviência tuga à moda socialista
Por sua vez o Governo português saudou hoje o povo e o Governo de Angola pelas eleições gerais realizadas na quarta-feira, manifestando total empenho em trabalhar com a nova liderança política.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros afirma, em comunicado, que as eleições decorreram de forma cívica e tranquila, congratulando-se com a “muito expressiva” participação da população.
Dando (certamente segundo instruções do MPLA) como definitivos os dados que ainda são provisórios, “o Governo português saúda o novo Presidente eleito da República de Angola”, assim como todos os deputados da Assembleia Nacional, lê-se no documento, em que Lisboa manifesta “total empenho” em trabalhar com a nova liderança política, no sentido de “continuar o aprofundamento das estreitas relações que unem Portugal e Angola” e a cooperação entre os dois Estados.
Folha 8 com Lusa
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