O Observatório Político-Social de Angola (OPSA) lamentou hoje “a forma forçada e pouco humana” como as pessoas têm sido transportadas das aldeias, comunas e municípios “para encher comícios” eleitorais em muitas províncias. No tempo colonial chamavam-se “voluntários devidamente amarrados”. É uma designação que pode ser aplicada aos novos colonialistas do regime, o MPLA, que é useiro e vezeiro no uso da “razão” da força, assassinando a força da razão.
Num documento denominado Pronunciamento sobre as Primeiras Semanas de Campanha Eleitoral, o OPSA, organização dedicada à promoção de debates, produção de documentos de reflexão ou posicionamento para fundamentar tomadas de decisão, enumera uma série de aspectos positivos e outros a melhorar nas eleições gerais marcadas para 23 de Agosto.
Sem referir nomes (o que só por si é uma forma de beneficiar o infractor que a organização bem sabe quem é), o documento do OPSA critica ainda a colocação das pessoas trazidas de “forma forçada” em “quintais sem alojamento e alimentação condignas”.
A organização considera também um aspecto a melhorar a obrigação imposta aos funcionários públicos “a irem aos comícios e a fechar serviços comunitários, como chafarizes durante o período de comícios, o que constitui uma clara violação dos direitos fundamentais”. Já agora, quem manda nesses serviços públicos?
Considera também importante a correcção da diferença no tratamento da informação e tempo atribuído às diferentes candidaturas, por vários órgãos de comunicação social públicos e privados, em desrespeito à Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais, “sem que, apesar de várias denúncias públicas” ocorra, sanções por parte dos órgãos de fiscalização eleitoral. Já agora, quem é o principal beneficiário dessa prática?
Para o OPSA, a utilização “abusiva pelo partido no poder, o MPLA, de meios do Estado para a campanha eleitoral, a corrupção eleitoral, mediante a oferta de bens aos eleitores, autoridades tradicionais e entidades religiosas nesta fase de campanha são igualmente aspectos que devem ser melhorados.
Melhorados? Para que eleições? Para as próximas não será com certeza. Aliás, vir a meia dúzia de dias da votação constatar o óbvio é pura e simplesmente uma forma de branquear, e até legitimar, a criminosa actuação do regime/MPLA.
Como aspectos positivos, o OPSA ressalta o bom ambiente em geral como está a decorrer a campanha, classificando-o como “calmo e tolerante, salvo situações pontuais e isoladas”, que exigem esclarecimento.
O papel das forças de segurança para o bom ambiente da campanha, através do acompanhamento dos candidatos, da divulgação de alertas, do apelo ao respeito pela lei e à tolerância entre todos, integra a lista de dados positivos.
Também a postura cívica dos candidatos, apelando ao voto e ao respeito e à tolerância por outras opiniões, bem como a posição da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) – mesmo sendo, na prática, uma sucursal do regime – na sua interacção com as forças políticas concorrentes nas eleições para encontrar consensos são aspectos positivos realçados pelo OPSA.
Entre as recomendações, destaca-se o apelo aos órgãos de fiscalização eleitoral para que “actuem em tempo útil, de modo a prevenir situações de desrespeito pela lei e a averiguar e sancionar os infractores, repondo a legalidade e promovendo o cumprimento da lei por todos os agentes eleitorais”.
O OPSA recomenda ainda que as autoridades tradicionais e religiosas deixem de ser manipuladas e que “quando assim acontecer utilizem os mecanismos formais para denunciar”.
Recomenda ainda à CNE para que proceda atempadamente às correcções necessárias para que os eleitores que foram colocados em cadernos eleitorais longe das suas áreas de residência ou os que não tenham recebido os seus cartões de eleitores.
Como gado a caminho do matadouro
Em 9 de Maio de 2017 o Folha 8 publicou, entre outros textos relativos a este assunto, o que agora transcrevemos na íntegra:
“Os militantes do MPLA, funcionários públicos, desmobilizados de guerra e crianças de escolas públicas são obrigados, muitas vezes, a abandonar as suas zonas de residência e mesmo províncias, para seguir o cabeça-de-lista e candidato do MPLA, para onde este vá fazer comícios.
“Eles querem passar a imagem que têm muita afluência em todo sítio, mas não é verdade, pois eu sou do Bié e vim arrastado para o Moxico, num camião”, lamenta Queiroz Damião Nzumbu, acrescentando estar há mais de quatro dias fora da família e a dormir ao relento.
Na realidade, a Televisão Pública de Angola tem passado a imagem de grande moldura humana, em todas as praças onde João “Malandro” Lourenço se apresenta, mas afinal tudo não passa de uma montagem e coacção, da máquina do MPLA, aos cidadãos mais vulneráveis, como aliás se podem verificar nestas imagens, onde centenas de populares são transportados como se fossem gado.
Se fosse a oposição, que face aos parcos recursos financeiros de que dispõe, não pode recrutar autocarros, ainda se poderia justificar. Poderia, dizemos nós, haver mais tolerância, mas agora tratando-se do MPLA é quase um absurdo ou a clara manifestação de insensibilidade e desrespeito total, para com o cidadão eleitor, intoxicado com falsas promessas de melhorias de condição de vida há 42 anos e tem como troco o desprezo, principalmente, nos últimos anos, depois da adopção do multipartidarismo. Aqui o partido do regime, depois de conseguir os votos, honesta e desonestamente, chegado ao poder esquecesse das promessas e manda bugiar os eleitores.
Por esta razão, uma pergunta se impõe, depois de imagens de cidadãos enlatados em camiões; onde andam os 5 milhões de militantes, que o MPLA diz ter, se afinal é necessário forçar e coagir populares a deslocarem-se das suas zonas de origem, para encher os comícios de João “Malandro” Lourenço, cabeça-de-lista do MPLA e candidato à sucessão de José Eduardo dos Santos, na Presidência da República?
Fossem as eleições nominais, o grande temor do partido no poder, MPLA e o cabeça-de-lista, nesta altura, face à sua fraca retórica, imagem fria e trancada, baixa popularidade, falta de carisma e, seguramente, não conseguiria, votos suficientes, para se eleger, nem como autarca no Lobito, Alvalade ou Malanje.
Agora, para desgraça colectiva dos angolanos, tendo a rede da batota na mão, capitaneada por aquele que será seu adjunto, o MPLA não precisa sequer que votem nele, pois os votos para continuar a liderar a desgovernação, já estão quantificados no sistema eleitoral de duas empresas da União Europeia, a portuguesa SINFIC e a espanhola INDRA, ambas com fortes ligações ao poder presidencial e judicial (Tribunal Constitucional), segundo fontes do próprio partido do regime.”
Folha 8 com Lusa
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