Vinte e seis anos após a abertura política, real e efectiva, em Cabo Verde, os protagonistas políticos reconhecem que ainda há muito caminho a percorrer para consolidar e qualificar ainda mais a democracia.
A ideia foi defendida hoje na sessão solene especial, que pela primeira vez acontece no Parlamento cabo-verdiano, para assinalar o 13 de Janeiro, dia da realização, em 1991, das primeiras eleições multipartidárias no país, após 15 anos em regime de partido único.
Na sua intervenção, o Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, assinalou os ganhos alcançados pelo país em matéria de liberdade de direitos, mas apontou “atrasos” na concretização dos direitos económicos, sociais e culturais.
“Os direitos económicos, sociais e culturais conhecem um atraso que traz consigo ameaças à coesão nacional. A demonstrá-lo, um desemprego ainda muito elevado e condições de vida das famílias abaixo daquilo a que os cabo-verdianos anseiam”, indicou Jorge Carlos Fonseca.
Politicamente, os avanços são inquestionáveis e as instituições funcionam normalmente”, referiu o chefe de Estado, reconhecendo que a nível social, os ganhos não são tão expressivos.
“As pessoas são mais livres, dispõem de instituições e leis democráticas, têm liberdade de expressão e de organização, tribunais que, apesar das limitações, são independentes, mas muitos continuam a viver em condições muito difíceis e a ver as desigualdades aumentar”, assinalou.
Por seu lado, o presidente da Assembleia Nacional, Jorge Santos, considerou que ainda há “um longo caminho a percorrer para consolidar o sistema democrático”, sublinhando que os sinais sobre a baixa participação dos cidadãos nas recentes três eleições no país exigem “maior vigilância e atitude proactiva” e “aproximação dos eleitos aos eleitores”.
O líder parlamentar do Movimento para a Democracia (MpD, no poder), Rui Figueiredo Soares, disse que a democracia cabo-verdiana “está no bom caminho”, mas salientou que todos os atores políticos devem comprometer-se na “ingente tarefa” de a consolidar.
“A consolidação da democracia exige de todos, responsáveis políticos, cidadãos, instituições públicas e organizações da sociedade civil, uma atitude consistente de defesa intransigente, dos valores que representam”, afirmou o responsável político do partido que suporta o governo.
A presidente e líder parlamentar do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição), Janira Hopffer Almada (foto), sustentou que todos os cabo-verdianos têm razões para se sentirem orgulhos do que conseguiram construir, mas considerou que “há sinais que não compatíveis com o nível de democracia reinante no país”.
A líder do maior partido da oposição cabo-verdiana apontou o que considera ser uma “violação clara” da lei e da Constituição da República, numa alusão à polémica sobre a substituição interina do Presidente da República quanto este se encontrava no estrangeiro.
Alegadas perseguições pós-eleitorais, despedimentos com motivações partidárias, silenciamento, instrumentalização e manipulação da comunicação social pública foram outros aspectos destacados por Janira Hopffer Almada.
A deputada da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID, terceira força política) Dora Oriana Pires disse que a democracia não se esgota na realização de eleições livres e democráticas.
“A democracia cabo-verdiana está consolidada no que diz respeito à organização das eleições bem como à aceitação dos resultados, mas, por outro lado, ainda temos um longo caminho a percorrer para que tenhamos uma democracia consolidada”, frisou.
“Não podemos dizer que a democracia está consolidada quando a maior parte dos eleitores, sobretudo a camada mais vulnerável, vota sob pressão dos partidos políticos”, apontou a deputada, pedindo união de todos, mas também mudança de atitudes e de comportamentos.
“Não se pode dizer que a democracia está consolidada, quando existe desigualdades sociais entre os cidadãos em termos económicos, diferença salarial, desemprego, partidarização da administração pública, incumprimento das empresas do Estado”, terminou Dora Pires.
Além da sessão solene pela primeira no Parlamento, o 13 de Janeiro, que é feriado nacional, está a ser assinalado no arquipélago com diversas actividades políticas, culturais, desportivas e recreativas.
F8 com Lusa