Victor Carvalho, director adjunto do Boletim Oficial do MPLA (também chamado “Jornal de Angola”) está a mostrar que saiu melhor do que a encomenda e que, em breve, baterá todos os seus concorrentes na bajulação ao seu patrão e patrono, sua majestade o rei José Eduardo dos Santos.
Por Orlando Castro
“E ste ano as comemorações de mais um aniversário da Independência Nacional, o 41º , ocorreram num momento especialmente marcante na vida do país por estar em curso todo um esforço conjunto no sentido de se ultrapassarem os constrangimentos que têm impedido o normal desenvolvimento da economia do país”, escreve Victor Carvalho, como se fosse um produtor de conteúdos sério.
Mas como não é, entra de imediato nas teses que sabe agradarem a quem, infelizmente, prefere ser assassinado pelo elogio do que salvo pela crítica. “Mais do que se falar em reconciliação nacional e do tempo passado numa guerra que deixou marcas ainda hoje bem visíveis em todo o país, sobretudo no seu tecido económico, é importante que empenhemos todos os nossos esforços e energias no trabalho comum de dar corpo aos projectos traçados para que possamos recuperar o tempo perdido em disputas políticas e partidárias que apenas serviram para nos dividir e assim servir os interesses de quem não se habitua ao funcionamento do sistema democrático”, escreve Victor Carvalho numa apologia, encapotada mas com o rabo de fora, das virtudes do partido único.
“Só com uma evidente má vontade ou cegueira partidária é que se poderão colocar em causa os ganhos que advêm do fim da guerra, que apenas chegaram tarde ao país devido à insensatez de quem desafiou a vontade que o povo expressou nas urnas em 1992”, escreve – ou reproduz – Victor Carvalho, retomando a máxima de que o MPLA é Angola é o MPLA e o MPLA é Angola, ou seja, que todos os outros é que são culpados, mandando às urtigas a afirmação de Agostinho Neto: o importante é resolver o problema do povo.
E chega então à premissa de que, “esse atraso, que impediu que o país estivesse melhor preparado para fazer frente aos desafios que agora se colocam em virtude de uma conjuntura internacional particularmente adversa para economias ainda num inferior patamar de desenvolvimento, obrigou a que estejamos numa espécie de repetição daquilo que foram os esforços feitos após a proclamação da Independência Nacional, 41 anos atrás”.
Por outras palavras, importa que – para recuperar o atraso sempre provocado pelos outros – o MPLA esteja no poder aí mais uns 30 anos. Provavelmente será isso que vai acontecer. E para repetir “aquilo que foram os esforços feitos após a proclamação da Independência Nacional, 41 anos atrás”, certamente que iremos assistir a um novo 27 de Maio de 1977, não é Victor Carvalho?
Agora, tal como em 1975, diz o director adjunto do Pravda, “o povo dá mostras de conseguir ultrapassar a situação adversa resultando essa certeza dos sinais que já se percebem dos esforços que vêm sendo feitos nos últimos dois anos”. E que sinais são esses? Provavelmente Angola ser, continuar a ser, um dos países mais corruptos do mundo e ser o país do mundo com o maior índice de mortalidade infantil.
“Aos poucos, na verdade, vão-se registando acentuadas melhorias no funcionamento da economia resultantes de uma estratégia conscientemente traçada e rigorosamente cumprida, não obstante a adversidade dela ter sido projectada em circunstâncias particularmente difíceis”, elogia (condição sine qua non para manter o tacho) Victor Carvalho, esquecendo-se (pois claro!) de dizer que o que o seu patrono e patrão diz que está a fazer agora foi, há dezenas de anos, sugerido por muito boa gente, até mesmo do próprio MPLA.
Victor Carvalho continua: “Contrariamente ao que sucedia há uns meses atrás, o sistema bancário já está a disponibilizar divisas para viagens, apoio a famílias e a estudantes que residem no estrangeiro. Os preços dos principais produtos da cesta básica estão numa acentuada espiral de descida, ao mesmo tempo que aos principais portos do país chegam constantemente bens alimentares que satisfarão as necessidades das famílias na quadra festiva que se avizinha rapidamente”. Os angolanos que não pertencem à elite do regime (e são muitos milhões) interrogam-se sobre se esta Angola de que fala o director adjunto do Boletim Oficial é o mesmo país onde (sobre)vivem. Desde logo porque sabem que Victor Carvalho tem, ao contrário deles, pelo menos três refeições por dia.
Fazendo “copy paste” do que os dirigentes do MPLA escreveram para Victor Carvalho “escrever”, ele enumera:
“Os esforços que estão a ser feitos pelo sector da Energia e Águas abrem excelentes perspectivas para a redinamização da indústria nacional o que, paralelamente, vai servir para reduzir o desemprego e, consequentemente, aumentar a renda das famílias nacionais.
A chegada ao país de grandes quantidades de sementes e de fertilizantes deixa perceber que a produção nacional de bens agrícolas vai aumentar, o que significa dizer que as importações serão reduzidas, podendo as divisas que para isso seriam necessárias ser usadas para a satisfação de outras necessidades igualmente urgentes.”
Talvez assim, dizemos nós, com o MPLA a juntar mais uns tantos anos aos 41 que já leva no Poder, Angola poderá um dia em matéria de auto-suficiência (nomeadamente alimentar) chegar aos valores que tinha antes da independência.
E, é claro, não poderia faltar o elogio à actual electrotécnica gestão da petrolífera do regime, a Sonangol, “um dos grandes dínamos da economia nacional, está a apresentar resultados bastante positivos na sua nova administração que, absurdamente, está a ser contestada não pela sua competência técnica ou profissional mas por mesquinhas questões de ordem política e que dizem bem do modo como actuam quem as despoletou.”
O nanismo intelectual de Victor Carvalho atinge patamares que até a nós espantam. Se a competência electrotécnica, zoófila ou avícola de Isabel dos Santos se medisse pelo índice de bajulação do dito Jornal de Angola, ai sim, seria a grande, a maior gestora do mundo. Mas como não se mede, estamos todos desgraçados.
Veja-se: “Muitos outros resultados positivos que advêm das medidas atempadamente aplicadas pelo Executivo poderiam aqui ser reflectidas como factos capazes de consolidar o optimismo nacional num futuro imediato mais tranquilo”, diz o aspirante a chefe de posto, cargo hoje ocupado pelo sipaio-maior, José Ribeiro.
Victor Carvalho escreve ainda que “é importante sublinhar também que a menos de um ano da realização de eleições todo o processo que enquadra a ida às urnas está a decorrer com toda a tranquilidade e dentro daquilo que são as normas impostas pela legislação atempadamente aprovada no Parlamento”.
É um parágrafo prolixo na bajulação mas que, em síntese, apenas quer dizer que a máquina do regime já sabe quem vai ganhar e com que percentagem de votos. Simples.
“Por tudo isto, fica difícil entender algumas aves de mau agoiro que teimam em prosseguir uma campanha de intoxicação pública através de recurso a argumentos políticos que pecam por não terem sustentação prática”, diz o pasquineiro, olhando para o umbigo e afagando a sua medíocre capacidade camaleónica.
“É que, por muito que isso lhes custe, a realidade está aí, nua e crua, aos olhos de todos e dispensando mais qualquer comentário”, conclui Victor Carvalho, satisfeito pelo orgasmo que jula ter provocado no seu patrono e patão.