Os casos de cólera em Angola dispararam nas últimas 24 horas, com 169 notificações e mais sete mortes, totalizando 952 casos e 42 óbitos desde o início do surto, agora cinco províncias segundo dados oficiais.
De acordo com o ultimo boletim do Ministério da Saúde, dos 169 novos casos, 129 ocorreram na província de Luanda, 26 na província do Icolo e Bengo, 12 no Bengo, um no Huambo e um na Huíla, até agora sem registos. O município do Cacucaco, em Luanda, é o epicentro do surto e concentra 115 dos novos casos notificados. Foram registados mais sete óbitos e estão internadas 122 pessoas com cólera.
Ocorreram desde o início do surto 42 óbitos, dos quais 30 na província de Luanda, de acordo com a mesma fonte.
O grupo etário mais afectado pela doença é o dos 2 aos 9 anos de idade com 244 casos e 14 óbitos, seguindo-se crianças e jovens dos 10 aos 19 anos de idade com 241 casos e cinco óbitos.
O ministério apela às pessoas com sintomas de diarreia líquida e vómitos que procurem imediatamente um centro de tratamento de cólera ou unidade de saúde próxima, bebam água fervida ou tratada com cinco gotas de lixívia e preparem soro caseiro (um litro de água fervida ou tratada com duas colheres de sopa de açúcar e uma colher de chá de sal).
A cólera é uma doença associada a deficientes condições de saneamento e abastecimento de água e más condições de higiene.
Em Janeiro do ano passado, falando à ONU News, de Luanda, o especialista de Emergências da OMS, Walter Firmino, apontou a colaboração de todos os intervenientes como uma razão para optimismo no combate à cólera. As zonas de alto risco incluíam na altura nas fronteiras com a Zâmbia e a República Democrática do Congo.
“Estamos expectantes de que, com a ajuda de todos, o país irá criar capacidades nas áreas críticas, especialmente nas zonas de fronteiras, em termos de preparar funcionários de saúde, pré-posicionamento dos kits essenciais e acesso à água potável, mobilização e engajamento das comunidades e outras capacidades. A meta é assegurar uma vigilância efectiva às medidas de prevenção e dar resposta adequada a uma possível ocorrência ou surto de cólera,” afirmou Walter Firmino.
Há um ano, as autoridades sanitárias aumentaram a presença de técnicos nessas áreas para que implementem as medidas prioritárias para garantir que unidades de saúde possam determinar os casos.
Entre as prioridades definidas estavam assegurar equipas de resposta rápida nos distritos e apoiar profissionais de saúde no tratamento da doença. Unidades de saúde das zonas fronteiriças distribuem sais de reidratação oral e fluidos intravenosos.
O novo plano previa identificar todas as fontes de água não tratada ou poluída, alargar a distribuição do cloro, tratar fontes de água potável e sensibilizar o público sobre a prevenção da cólera. As autoridades destacavam ainda a importância de procurar tratamento precoce, entre outras medidas preventivas.
A directora nacional de Saúde Pública de Angola, Helga Freitas, enfatizou a aposta de se garantir uma forte capacidade de prevenção e resposta à doença ao pedir a participação activa da população.
As acções também contaram com departamentos ministeriais, comunidades e parceiros envolvidos na preparação das operações em diferentes áreas, de acordo com o plano de contingência nacional.
O representante interino da OMS em Angola disse que decorria (Janeiro de 2024) uma investigação sobre o que “é crucial para determinar se um doente está ou não ligado a um surto”. Humphrey Karamagi afirmou que protocolos de tratamento estavam disponíveis em todas as unidades de saúde, bem como sessões de formação.
Karamagi expressou confiança nas medidas que o país tem adoptado e a expectativa de que Angola possa reforçar a capacidade em áreas críticas.
Pelo menos 28 peritos, incluindo oito da OMS, actuavam em 10 das 18 províncias angolanas. As áreas de maior atenção foram as províncias do Cuando Cubango e Moxico, perto da fronteira com a Zâmbia. Outra província onde o surto de cólera dura há vários meses é a do Lunda Norte, que faz fronteira com a República Democrática do Congo.
Angola teve surtos de cólera entre 1995 e 2000, tendo registado o mais mortal em 2011 com 2284 casos e 181 mortes. Entre 2016 e 2017 afectou as províncias de Cabinda, Luanda e Zaire, com 252 notificações e 11 óbitos.
Recorde-se que o Governo do MPLA (é o único que temos desde a independência) aprovou em Abril de 2016 legislação (e isso é coisa que faz sem grandes problemas) para enquadrar médicos no Serviço Nacional de Saúde, num processo “célere” e “menos burocrático” face à “necessidade de aumentar a cobertura médica urgente no país” e a assistência sanitária às comunidades.
A informação constava de um decreto presidencial que entrou em vigor no final de Abril de 2016, e que lembrava o investimento na formação e capacitação de médicos que já estão “disponíveis para trabalhar”, numa altura em que – recorde-se – só a capital angolana estava a braços com epidemias de febre-amarela e malária, com mais de 400.000 pessoas afectadas.
O mesmo decreto definia que o ingresso na categoria de interno “faz-se mediante concurso documental” para licenciados em medicina, à parte das normas sobre a entrada no funcionalismo público.
O Governo anunciou também que iria recrutar 2.000 médicos e paramédicos, angolanos, recentemente formados no país e no estrangeiro, para reforçar o combate às epidemias, que deixaram os hospitais de Luanda sobrelotados.
O ingresso como médico interno geral passou a ser feito por contrato individual de trabalho celebrado com o Ministério de Saúde, pelo período de um ano, renovável automaticamente.
“A renovação do contrato individual de trabalho fica condicionada ao bom desempenho profissional e comportamental”, lê-se no mesmo decreto, assinado pelo então Presidente José Eduardo dos Santos.
No início de Abril de 2016 foi noticiado que o Estado iria avançar com a admissão excepcional de novos funcionários públicos para a saúde, educação e ensino superior em 2016, segundo uma autorização presidencial.
A informação constava de um decreto assinado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, no qual foi “aprovada a abertura de crédito adicional” ao Orçamento Geral do Estado (OGE) de 2016, no montante de 31.445.389.464 kwanzas (166 milhões de euros), “para pagamento de despesas relacionadas com novas admissões”.
O médico angolano Maurílio Luyela considerou que o colapso do Serviço Nacional de Saúde em Angola é o resultado da má gestão dos recursos financeiros e humanos por parte do Ministério da Saúde.
O especialista em saúde pública disse à VOA (Maio de 2016) que o sector debatia-se com a falta de pessoal qualificado porque, por alegada falta de verbas, não abriu qualquer concurso público para a admissão de especialistas angolanos que se formam nas faculdades do país. Talvez agora, se se cumprir esta promessa, a situação melhore.
Maurílio Luyele acusava os gestores do Ministério da Saúde de acharem mais importante comprar carros de luxo para directores em detrimento de equipamentos hospitalares.
“É mais fácil comprar carros de luxo para directores ao invés de materiais hospitalares e não há técnicos suficientes para atender a demanda, mas temos médicos angolanos que saem das faculdades que não são admitidos na função pública porque não há como pagá-los”, acusou.
O Governo anunciou em 2018 (também é algo em que se tornou perito) o reforço das medidas de combate à malária, que naquele ano matou pelo menos 1.089 pessoas, e à cólera, que matou 12 pessoas, segundo um plano de emergência divulgado no dia 20 de Fevereiro de 2018.
O plano de combate a essas doenças foi analisado, na província de Benguela, numa reunião do Conselho de Governação Local, dirigida já pelo Presidente João Lourenço, e integrou medidas e recursos financeiros.
O plano previa igualmente uma abordagem multissectorial e acções de testagem, tratamento da malária e de casos suspeitos de cólera.