QUEM NASCE CANIBAL… MORRE CANIBAL

Angola registou um “cenário alarmante” de prisões arbitrárias, repressão de manifestações pacíficas, violência física e psicológica contra cidadãos e activistas indefesos e expropriação de bens nos primeiros três meses de 2025, segundo um relatório de várias organizações.

Segundo o Relatório Trimestral sobre Violações dos Direitos Humanos em Angola, de Janeiro a Março de 2025, elaborado pelo Movimento Cívico Mudei, através das organizações Mizangala Tu Yenu Kupolo e Associação Cívica Handeka – Organizações Não-Governamentais (ONG) angolanas – o país que há 50 anos é (di)gerido pelo MPLA registou várias práticas lesivas dos direitos humanos.

Baseado em dados recolhidos nas províncias angolanas de Cabinda, Malanje, Uíje, Luanda, Bengo e Cuanza Sul, o relatório de 25 páginas “evidencia, de forma inequívoca, um padrão alarmante de violações dos direitos humanos em Angola, destacando-se pela gravidade de actos arbitrários”.

Angola, nos primeiros três meses de 2025, registou actos “repressivos e desprovidos de fundamento legal por parte de várias instituições públicas e agentes da autoridade”, refere-se no estudo, que congrega dados obtidos por via de inquéritos, entrevistas e análises de denúncias.

Na pesquisa descrevem-se casos de intimidação ostensiva e abuso de autoridade contra o activista José da Costa Lembe, em Cabinda, praticados alegadamente por efectivos da polícia e das Forças Armadas Angolanas, após denunciar alegadas irregularidades envolvendo a petrolífera Chevron e a “passividade” das autoridades locais.

Prisões arbitrárias foram igualmente registadas na província de Malange, onde foi detido, nesse período, o comerciante Marcos Simão após questionar a presença de efectivos da polícia no seu estabelecimento comercial, como relatam as ONG.

De acordo com o relatório, uma manifestação pública de mais de 300 alunos no bairro Candombe Velho, na província do Uíje, contra a transferência de uma instituição de ensino para uma localidade distante das suas zonas de residência foi reprimida pela polícia e deu azo a detenções arbitrárias, inclusive de activistas locais.

“A situação foi acompanhada por outros activistas e membros do Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA), que intervieram com denúncias e solidariedade”, refere-se na pesquisa.

Foram igualmente registados, entre Janeiro e Março deste ano, detenções e intimidações contra jornalistas, em Luanda, após denúncias de alegados esquemas evolvendo efectivos da segurança do Estado e do Serviço de Migração e Estrangeiros, e ainda repressões e detenções de agentes recenseadores que “exigiam” do INE do pagamento dos subsídios relativos ao Censo 2024.

As províncias do Cuanza Sul e do Bengo, salienta-se no relatório, registaram igualmente episódios de detenções, prisões e expropriação indevida de bens de cidadãos, que protestavam para exigir a reposição dos seus direitos, e repressão policial.

“Estas violações não apenas afrontam os direitos e liberdades fundamentais consagrados na Constituição da República de Angola, mas também comprometem os compromissos do país no âmbito dos tratados regionais e internacionais de direitos humanos”, observam as ONG.

As acções analisadas no relatório abrangem um vasto espectro de “práticas abusivas, incluindo prisões arbitrárias, repressão de manifestações pacíficas, violência física e psicológica contra cidadãos e activistas, detenção sem fundamentação legal e expropriação de bens sem justificativa plausível e violação de direitos de trabalhadores”, assinalam.

Concluem referindo que os actos descritos representam uma clara violação de direitos fundamentais, como o direito à liberdade e segurança pessoal, à dignidade humana, à manifestação e associação, bem como o direito a um tratamento justo e igual perante a lei.

A repressão e o fecho do espaço cívico “reflectem uma perigosa tendência de enfraquecimento dos princípios democráticos no país”, realça-se ainda no documento.

“CORRUPÇÃO GOVERNAMENTAL GRAVE”

Prisões arbitrárias, violência policial, impedimento de reuniões pacíficas e ameaças à liberdade de associação são as principais fragilidades de Angola no domínio dos direitos humanos, identificadas pela Amnistia Internacional (AI). Também os EUA consideram que a situação dos direitos humanos continua alarmante, com “relatos credíveis de assassínios arbitrários ou ilegais, tratamentos ou castigos cruéis, desumanos ou ilegais” por parte das autoridades angolanas.

A AI faz um retrato do estado dos Direitos Humanos em 155 países do mundo e alerta para as “consequências terríveis da escalada de conflitos e do quase colapso do direito internacional”.

A Amnistia Internacional sublinha que o colapso do Estado de direito irá provavelmente acelerar com o avanço da inteligência artificial (IA), que, juntamente com o domínio das ‘Big Tech’ (gigantes tecnológicas), arrisca causar uma “sobrecarga” de violações dos direitos humanos.

No caso de Angola “houve um progresso limitado na situação dos direitos humanos após a turbulência em torno das eleições gerais de 2022”.

A AI destaca, pela negativa, o uso de força excessiva ou desnecessária para travar “o direito de reunião pacífica”, que conduziu, na maioria dos casos, a prisões arbitrárias e, acrescentamos nós com conhecimento de causa, violência física e psicológica sobre os detidos.

“Pelo menos cinco manifestantes e um transeunte foram mortos ilegalmente, incluindo pelo menos duas crianças”, recorda a organização não-governamental (ONG), referindo-se aos protestos de moto-taxistas, no Huambo, devido à subida de preço da gasolina e que foram reprimidos com violência.

Angola é um dos países da região africana a par de Etiópia, Quénia, Mali, Moçambique, Senegal e Somália, onde a AI identificou repressão de dissidentes e uso de força excessiva para dispersar manifestantes.

O direito à liberdade de associação foi ameaçado, diz a Amnistia, citando o projecto de lei das ONG, aprovado no Parlamento (do MPLA), que, segundo estas organizações limita e visa aniquilar o direito à liberdade de associação e dar ao executivo poderes excessivos para interferir nas suas actividades.

A AI aponta também violações aos direitos económicos, sociais e culturais, focando a disputa dos professores com o executivo, reivindicando melhores salários.

A AI também não esquece (o Folha 8 também não esquece) as demolições e despejos forçados de centenas de pessoas, sendo visível a passividade das autoridades e a intervenção de alguns dos seus dirigentes em causa própria (interesses nos próprios despejos).

A ONG lembra ainda os efeitos devastadores da seca severa e prolongada no sul de Angola, sobre os direitos à alimentação e à saúde dos angolanos, especialmente para as crianças. O reino do MPLA, independente há 50 anos, tem mais de 20 milhões de pobres e cinco milhões de crianças fora do sistema de ensino.

No que diz respeito à discriminação e violência contra pessoas com albinismo, a AI destacou Angola pela positiva, já que o país adoptou o Plano de Acção Nacional para a Protecção e Promoção dos Direitos Humanos das Pessoas com Albinismo.

Entretanto, os EUA consideram que a situação dos direitos humanos em Angola continuou semelhante à de anos anteriores, com “relatos credíveis de assassínios arbitrários ou ilegais, tratamentos ou castigos cruéis, desumanos ou ilegais” por parte das autoridades angolanas.

Tudo isto consta dos relatórios do Departamento de Estado sobre a situação dos direitos humanos que, sintetiza: “Não se registaram alterações significativas na situação dos direitos humanos em Angola durante os últimos anos”.

Além dos maus-tratos por parte do Governo do general João Lourenço, o Departamento de Estado norte-americano identificou, “entre os problemas significativos”, a dureza das condições de detenção, que classifica como “potencialmente fatais”, a existência de presos políticos e “restrições graves à liberdade de expressão e à liberdade dos meios de comunicação social”.

Neste caso, a diplomacia norte-americana considera existirem “ameaças de violência contra jornalistas, detenções injustificadas ou perseguições de jornalistas, censura ou aplicação ou ameaça de aplicação de leis de difamação criminosa para limitar a expressão”.

No campo dos direitos e garantias previstos na Constituição de Angola, o Departamento de Estado refere “interferências substanciais na liberdade de reunião pacífica e na liberdade de associação, incluindo leis excessivamente restritivas sobre a organização, o financiamento ou o funcionamento de organizações não-governamentais e da sociedade civil”.

A “corrupção governamental grave; violência generalizada com base no género, incluindo violência doméstica ou contra parceiros íntimos, violência sexual e casamento infantil, precoce ou forçado; e proibição de sindicatos independentes ou restrições significativas ou sistemáticas à liberdade de associação dos trabalhadores” são outras situações que os relatórios do Departamento de Estado apontam.

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