O MPLA como partido, passou a coisificar os cidadãos, principalmente, os 25 milhões de pobres, arredados do centro do orçamento. As finanças públicas estão à mercê de uma casta, que subverte as contas do Estado a seu bel prazer. E, os que ousam sonhar e pensar numa Angola diferente e democrática têm, na maioria das vezes, uma única avenida: a guilhotina, como máxima expressão da banalização da ideologia, da vida, em nome da santa corrupção.
Por William Tonet
A actual liderança do MPLA, capitaneada por João Lourenço descredibiliza – se todos os dias, interna e externamente, em função dos escândalos financeiros e de corrupção, no interior do seu gabinete, contrariando as promessas de moralização e higienização da Função Pública.
Em oito anos, agravou-se a fome, a miséria, o desemprego, as prisões, os assassinatos, o genocídio, a discriminação, as injustiças e, pasme-se, a corrupção. Sim, a corrupção que foi bandeira de ascensão ao poder, esfumou-se… É um engodo, em todas as latitudes e longitudes.
Não foi combatida. Não é combatida. Pelo contrário, teve apenas uma pausa, para os actuais actores, adaptarem-se aos novos métodos de acção de rapina, delituosamente, protegidos por órgãos judiciais e judiciários, partidocratas, indiferentes à delapidação dos cofres públicos.
O presidente com esta política de prometer, aparece como mediador externo, sem ter experiência de resolução e reconciliação a nível interno, vem caindo, paulatinamente, no descrédito, na desvalorização, desconfiança, vulgarização e falta de reconhecimento, como interlocutor internacional para a resolução de conflitos em África. A recusa do Ruanda de o ter como mediador no conflito com a RDC, levou à sua renúncia no 08.02. Os gastos desta odisseia não foram poucos. Internamente, também, não o são, até com artigos pessoais, como relógios, são gastos 100 mil dólares…
São muitos milhões e milhões de dólares, todos os dias roubados, por agentes da mais alta corte, indiferentes ao sofrimento dos milhões de autóctones, que definham à fome.
Vamos a alguns factos:
a) Os 7, 9, 35 ou 80 biliões de kwanzas da AGT, não são considerados, pela auxiliar do Titular do Poder Executivo como fraude financeira ou, na linguagem popular, roubo, mas “irregularidades identificadas no sistema de pagamento de impostos da Administração Geral Tributária (AGT)” e que “o Ministério das Finanças (…) garante a total colaboração com os órgãos de investigação e aplicação da lei para o completo esclarecimento dos factos e a responsabilização de eventuais infractores”, lê-se no comunicado de Vera Daves.
Uma linguagem dúbia, estapafúrdia, indiciando a mais alta cumplicidade, com os “eventuais infractores”, como são carinhosamente tratados. Nesse andar, todos já poderão ter saído, depois da falsa detenção, exibida nas televisões do regime.
b) Furtos antigos. A compra inflacionada pelo ministro Ricardo de Abreu de dois imóveis de amigos, sendo um do seu parceiro musical, Ruca Van-Dúnem, com a chancela do Presidente da República: Despacho n.º 159/21, de 23 de Setembro, no valor de 114 milhões de dólares. Um de 45 passou a 91 milhões de dólares. Caricato é que os imóveis anunciados para o Ministério dos Transportes e da Agência Reguladora de Certificação de Carga e Logística de Angola, estão ao serviço do ministério da Família. Actos tipificados como crimes, ao abrigo do art.º 28.º da Lei da Probidade Pública, que proíbe que um alto agente do Estado (ministro) faça negócios com quem tenha interesses directo ou indirecto, acções enquadradas no tráfico de influências, peculato e corrupção.
O perfume de reformas económicas, boa gestão, mais liberdades, democracia, discursos conciliadores e homem mais aberto ao diálogo e respeito a rés pública, perderam, completamente, o aroma.
Recorde-se, ainda que aos 30 de Novembro de 2018, numa reunião do comité central do MPLA, João Lourenço condenava as empreitadas públicas entregues “aos nossos familiares, nossos filhos, se não obedecerem às regras e normas do concurso público, da contratação e da sã concorrência”.
Em 2025,o Presidente é o campeão da contratação simplificada, sendo uma das empresas mais beneficiadas a MCA, com valores a rondar os mais de 4 biliões de dólares e a Mota Engil com mais de 3 biliões. A MCA (Manuel Couto Alves) é a que terá comprado um Iate luxuoso avaliado em 25 milhões de dólares estacionado em Marbella (Espanha) que se diz ter oferecido ao casal presidencial. É ainda o principal financiador da fundação de Jéssica Lorena Dias Lourenço. A outra filha foi nomeada presidente da BODIVA… Assim fica como?
Mas João Lourenço dizia, que o MPLA “deve ser o primeiro a impedir a constituição de impérios económicos por parte de uma família ou de uma pessoa, sobretudo quando usamos fundos públicos ou investimentos públicos”, uma picada aos filhos de Eduardo dos Santos: Zenu e Isabel. E descodificou: “de forma pouco responsável, se confiou a um jovem inexperiente a gestão de biliões de dólares do país. O partido não pode ficar indiferente e tem de bater o pé perante tamanha afronta aos verdadeiros donos desses recursos, o povo angolano”.
Ficando agora indiferentes, os membros do bureau político e do comité central são cúmplices de todas estas engenharias, inclusive quando eufórico, dizia ser contra a evocação da figura “camarada ordens superiores que deve ser banido e ter nome e rosto”. Hoje, as ordens superiores suplantaram as da era JES.
E acenando para a outra margem assegurava termos uma “oposição mais combativa, uma imprensa mais livre e investigativa, uma sociedade civil mais interventiva e rigorosa na exigência ao estrito cumprimento da lei, do respeito pelo erário público e pelos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos”.
Nada verdadeiro. Existe, como nunca antes, um monopólio presidencial na imprensa pública. As licenças de rádio e TV só são atribuídas a membros do MPLA e afins. A perseguição e prisão de jornalistas, não para. Se antes os discursos “costurados”, “drogavam”, até opositores, hoje é o inverso. Nunca reuniu com o líder da oposição, internamente a contestação a sua liderança cresce exponencialmente, porque poucos o levam a sério. Veja-se o que ocorre com as promessas, em 2018, da realização das eleições autárquicas, para “2020 em todos os municípios do país”. Até agora, nada…
Verdade seja dita, as autarquias, para qualquer ditadura, são um verdadeiro empecilho a roubalheira e a vida dos corruptos, principescamente, instalados no poder.
Voltemos às palmadas…
Como entender que aquele que mais destruiu as finanças e a banca, seja, no consulado JLO, “condecorado” com a Medalha Destruição Total” e nomeado, antes, mais uma vez, governador do BNA e, depois, ministro de Estado da Coordenação Económica. O mérito assentou no mal, logo não se pode estranhar a denúncia de Rafael Marques de o homem ter sobre-facturado a empreitada do Museu da Moeda, que saiu de 10 milhões, para 64,7 e, finalmente, fixou-se em 81 milhões de dólares e mais despesas de manutenção anual de 6 milhões de euros.
Se isso, a ser provado, não é roubalheira grossa, passível de procedimento criminal imediato, então, outro nome, ainda não curou a língua portuguesa de criar…
No dia 10 de Fevereiro de 2025, o Presidente da República inaugurou o Terminal Oceânico da Barra do Dande (TOBD), projecto iniciado por Isabel dos Santos, que havia arranjado um consórcio para financiar a empreitada, que ficaria entre 200 a 250 milhões de dólares. Foi copiosamente “corrida”, sem direito a indemnização pelo Presidente. Na data da sua inauguração a obra atingiu o valor de 700 milhões de dólares, sem causar qualquer comoção a JLO. “É qualquer coisa que eu não compreendo. Portanto, é uma despesa que surge muito acima do valor real, em que dá impressão que houve partes que se beneficiaram das oportunidades. Nada justifica esse valor, é exagerado. Está fora de qualquer nível de aceitação”, disse António Vieira, antigo director da Cobalt Angola.
Carlos Matos, grande economista, preso pela ditadura de Augusto Pinochet escreveu na cadeia uma brilhante obra a contar as agruras do cárcere e tem uma célebre passagem que aqui se adapta: “ nem sempre o gesto revela a verdadeira intenção”. Este homem, felizmente sobreviveu e viu o fim da ditadura.
Os gestos muitas vezes escondem muitas coisas, principalmente, quando as intenções são outras e causam danos irreparáveis a milhões de terceiros de boa-fé.