PERGUNTE AO “MANO” ABEL

O Presidente da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, reagiu violentamente à opinião do jornalista Ricardo Costa, director de informação da SIC, que afirmou que o MPLA e a UNITA negociaram os resultados das eleições em 2022. Num total despropósito até meteu ao barulho João Soares e António Costa (este irmão do Ricardo Costa). Certo é que o jornalista da SIC disse em Janeiro de 2025 o que o Folha 8 disse em Junho de 2024, sem a UNITA tugir ou mugir.

Por Orlando Castro

Para vitaminar a memória de Adalberto da Costa Júnior que, aliás, desde sempre foi muito selectiva em benefício próprio, recordo aqui e agora o artigo de opinião que o Folha 8 publicou no dia 7 de Junho de 2024 sob o título «Quem elege o vencedor é a comunidade internacional”.

«A UNITA negociou mal as últimas eleições e no futuro devem aprender a resistir a todo tipo de pressão, opressão e repressão. Para quem não sabia fica desde já a saber que as eleições de 2022 foram negociadas, houve um pacto ou melhor um acordo entre o MPLA, UNITA e a comunidade internacional.

MPLA, UNITA e a comunidade internacional foram os grandes vencedores das últimas eleições e o maior derrotado foi o povo angolano. O MPLA saiu vitorioso ao continuar no poder, a UNITA recebeu garantias, promessas e outros benefícios enquanto a comunidade internacional continuou a solidificar os seus interesses económicos em Angola.

Abel Chivukuvuku disse, por outras palavras, que o voto do povo angolano não tem valor.

Abel Chivukuvuku concedeu uma entrevista polémica à RTP-África onde confirmou que a UNITA/FPU recebeu ordens superiores do Ocidente para aceitar os resultados eleitorais de 2022.

Abel Chivukuvuku tentou culpar a comunidade internacional e esqueceu-se reconhecer as falhas da própria UNITA que aceitou sem hesitar a primeira proposta que lhe foi apresentada pela comunidade internacional com o conhecimento e consentimento do MPLA. UNITA/FPU está comprometida até porque não há relatos de terem sido coagidos ou obrigados aceitar as condições do acordo em questão.

Abel Chivukuvuku deve explicar as coisas tal como aconteceram e não omitir factos. O que aconteceu foi um mau acordo mas Abel Chivukuvuku está a usar de forma inteligente a palavra pressão da comunidade internacional para camuflar a situação.

A declaração de Abel Chivukuvuku sugere que o mesmo cenário pode repetir-se nas próximas eleições. Se a pressão internacional foi um factor decisivo no passado, é razoável questionar se a UNITA enfrentará novamente essa mesma situação. A persistência de tais circunstâncias pode levar a um ciclo vicioso de desconfiança e descontentamento, onde as eleições são vistas não como uma expressão genuína da vontade do povo, mas como um teatro manipulado por interesses externos.

Para evitar que esse cenário se repita, é imperativo que sejam implementadas reformas que garantam a transparência e a credibilidade do processo eleitoral. Além disso, é essencial que a comunidade internacional respeite a soberania de Angola e apoie o fortalecimento das suas instituições democráticas, em vez de pressionar por resultados que sirvam a interesses externos.

A afirmação do líder do PRA-JA/SA é um grande exemplo das complexidades e desafios que cercam o processo eleitoral em Angola. É vital que todos os envolvidos, tanto a nível nacional quanto internacional, trabalhem juntos para assegurar que as futuras eleições sejam um reflexo fiel da vontade do povo angolano. Somente assim poderemos construir uma democracia sólida onde os resultados eleitorais são respeitados e a soberania nacional é preservada.

Quando a comunidade internacional exerce pressão significativa sobre os resultados eleitorais, a soberania de um país é posta em cheque. A ideia de que o povo angolano não tem a última palavra na eleição do seu presidente é profundamente perturbadora. A soberania nacional é um princípio fundamental que deve ser respeitado e protegido.

Angola é um país rico em recursos naturais, com vastas reservas de petróleo, diamantes e minerais, além de possuir uma posição estratégica no continente africano. Esses factores fazem de Angola um ponto de interesse para a comunidade internacional, que busca manter relações estáveis e lucrativas com o país. Nesse contexto, surge a preocupação de que a comunidade internacional possa preferir a estabilidade garantida pelo actual regime, mesmo que isso signifique comprometer os princípios democráticos.

Para muitas potências estrangeiras, a estabilidade política em Angola é vista como crucial para a protecção dos seus investimentos e interesses económicos. A incerteza política que pode vir com a mudança de governo é frequentemente percebida como um risco que eles preferem evitar. Como resultado, há uma tendência de apoiar o “status quo”, mesmo quando isso significa fechar os olhos para práticas antidemocráticas ou violação dos direitos humanos.

Empresas multinacionais e governos estrangeiros têm biliões de dólares investidos em Angola, particularmente no sector de petróleo e diamantes. A garantia de contratos lucrativos, a continuidade dos negócios e a segurança de seus investimentos são prioridades para esses actores. A ameaça de instabilidade política que poderia interromper essas operações é vista como um risco a ser evitado a qualquer custo.

Já agora, gostaria de informar que existem acordos bilaterais entre Angola e vários países ocidentais que incluem cláusulas que garantem a protecção dos seus investimentos e a continuidade dos projectos em andamento. Esses acordos criam uma relação de dependência mútua que muitas vezes privilegia a manutenção do regime actual, visto como um parceiro confiável que cumpre as suas promessas e mantém a estabilidade necessária para os negócios. O MPLA fez chantagem política contra os países ocidentais ao não querer assumir nenhuma responsabilidade caso tivéssemos distúrbios, conflitos ou manifestações de violentas logo a seguir as eleições.

Esse apoio explícito da comunidade internacional ao governo de Angola pode ser visto como uma forma de interferência na soberania do país. Quando os interesses estrangeiros se sobrepõem à vontade do povo angolano, a legitimidade do processo democrático é comprometida. Isso cria uma percepção de que as eleições são apenas um ritual, sem impacto real nas políticas do país.»

Ou seja, Ricardo Costa disse em Janeiro de 2025 o que o Folha 8 disse em Junho de 2024. A diferença está que agora dá mais jeito a Adalberto Costa Júnior, vitimizando-se e aproveitando para tentar desviar a atenção daqueles que, em número crescente, estão a finalmente entender que para o presidente (líder é outra coisa) da UNITA, em termos práticos, o Povo é residual e instrumental. Temendo, é claro, que os angolanos resolvam dizer que o Povo é quem manda e instrumentais são os políticos.

Recordo que Adalberto da Costa Júnior afirmou, no dia 16 de Setembro de 2022, que nunca falou em fraude a propósito das eleições, mas sim de desvio às leis, e acusou os tribunais angolanos de fugirem à justiça. Só faltou pedir desculpas públicas ao MPLA, não é Adalberto da Costa Júnior? A pergunta – que nunca teve resposta – foi feita na altura por mim num texto intitulado “Afinal não houve fraude, diz a UNITA”.

Eis o texto em questão: «Adalberto da Costa Júnior, que assumiu o lugar de deputado eleito pelo maior partido da oposição angolana, disse aos jornalistas à chegada à Assembleia Nacional que esperava que esta legislatura vá ao encontro daquilo que é a vontade dos angolanos. Ou seja, porque afinal não houve fraude, que o MPLA junte muito mais anos aos 47 que já leva de Poder. É obra!

“O que nós esperamos é que independentemente de quem seja – MPLA, UNITA ou outros partidos – tenham a coragem de devolver a soberania a quem a tem, o povo, que deixou uma mensagem muito clara sobre a sua vontade”, disse o dirigente político.

A UNITA saiu derrotada nas eleições gerais de 24 de Agosto, sem fraude – a fazer fé na confissão do seu presidente, mas conquistou o maior número de mandatos de sempre, elegendo 90 deputados, enquanto o MPLA, partido no poder desde a independência, em 1975, reduziu o número de assentos de 150 para 124.

“Os angolanos demonstraram nestas eleições que queriam fazer a mudança de regime, que querem reformas, que o desenvolvimento só se faz com liberdade e com justiça independente, com as autarquias e poder local”, comentou o presidente da UNITA, esperando “uma Angola menos partidária de mais integração e mais desenvolvimento”.

Insistiu, por outro lado, que a UNITA participou em eleições “que não foram correctas, não foram transparentes” o que, alegou, foi confirmando pelos “observadores internacionais que aqui estiveram presentes pela primeira vez, incluindo os africanos que […] não consideraram as eleições livres, justas e transparentes”. Mas sem fraude, segundo Adalberto da Costa Júnior.

“Desde o período da pré-campanha, até ao momento, nós falámos sempre de desvio às leis, desrespeito à Constituição, nunca falámos de fraude, falámos de provas. Infelizmente e os tribunais angolanos fogem da justiça e do direito”, disse ainda Adalberto da Costa Júnior.

Genericamente, fraude significa “acto ou dito com intenção de enganar ou prejudicar alguém, acção ilícita, punível por lei, que procura enganar alguém ou alguma entidade ou escapar a obrigações legais”. Como afinal nada disso se passou nas eleições de 24 de Agosto, só falta mesmo Adalberto da Costa Júnior pedir desculpas ao partido vencedor “sem fraude” (o MPLA) e ao presidente João Lourenço, eleito também “sem fraude”.

“É importante que os jornalistas angolanos saibam disto, que os relatórios dos observadores entenderam que estas eleições foram marcadas por violações à lei, nessa medida não podemos premiar o desvio ao direito”, acrescentou o líder do partido do “Galo Negro”

Adalberto da Costa Júnior justificou ainda que a tomada de posse dos deputados da UNITA – que não foi consensual no partido e entre os seus apoiantes da sociedade civil – se deve ao facto de terem a responsabilidade de “trazer o nosso contributo para trazer Angola à democracia plena e ao Estado de direito democrático”. Tem razão. Se afinal não houve fraude…

Quanto às prioridades da UNITA nesta legislatura é dar resposta aos desafios das reformas, o dirigente foi taxativo: “precisamos de rever a Constituição, precisamos de eleição directa do Presidente da República e de não retardar o poder local”.»

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