NEM TODOS OS JOVENS SÃO EUNUCOS

Líderes juvenis de partidos políticos e da sociedade civil do reino do MPLA acusam o Governo de criar “leis securitárias” para “controlar e intimidar” cidadãos angolanos contestatários, nomeadamente leis contra o vandalismo e sobre a disseminação de informações falsas na internet, sendo estas válidas apenas se paridas pelo partido do general de três estrelas, João Lourenço.

O posicionamento foi manifestado pelos líderes juvenis dos partidos FNLA, PRS, Bloco Democrático, todos na oposição, e do Movimento dos Estudantes de Angola (MEA), em conferência de imprensa, em Luanda.

As referidas organizações, em posição conjunta sobre o “estado real da juventude angolana – presente e futuro”, consideram que a educação e o ensino, emprego, formação profissional, saúde e habitação são os principais problemas que afectam hoje a juventude em Angola.

Apontam a existência de um número crescente de jovens em idade escolar sem possibilidade de prosseguir os estudos, escassez de novos postos de trabalho, “crise habitacional que prejudica a maioria dos jovens” e a criminalidade juvenil pedindo soluções governamentais.

Recordam que a população angolana é maioritariamente jovem e o seu crescimento deve continuar, apontando para a necessidade de se “contrariar a actual instrumentalização da juventude por parte do MPLA (partido no poder há 50 anos), bem como a ausência de políticas públicas para juventude”.

Para estas organizações juvenis, Angola é um dos países que mais produz leis, defendendo, no entanto, que a concepção de leis deve ser acompanhada de programas práticos com reflexos na vida da juventude.

Neste posicionamento colectivo, os jovens criticaram a “ineficácia” dos programas de desenvolvimento da juventude dos últimos 12 anos, considerando que o MPLA “fracassou” na sua implementação.

“O MPLA não conseguiu fazer a transição, [o programa de desenvolvimento da juventude] é um documento bonito, mas que não conseguiu sair do papel. Deixem de pensar pelos jovens, os jovens também têm pensamento. É preciso perguntar o que querem e quem tem missão de governar satisfazer as suas aspirações”, consideram.

Acusam igualmente o Governo de criar leis que visam “controlar os jovens que reivindicam e garantir a securitização contínua do Estado”, nomeadamente as leis do Vandalismo de Bens Públicos, de Regulação das ONG, da Segurança Nacional e sobre a Disseminação de Informações Falsas na Internet.

Manifestaram ainda preocupação com a actual degradação socioeconómica das famílias angolanas, com o crescimento exponencial de abusos contra as mulheres, a fome, pobreza e o aumento dos casos de cólera no país.

“A inexistência de saneamento básico como políticas públicas e a fraca capacidade do sistema nacional de saúde que nunca faz a transição de uma saúde curativa para uma saúde preventiva, agrava continuamente a situação sanitária no país (…)”, lamentam os jovens.

Garantem mesmo continuar a advogar para que o executivo liderado pelo Presidente do MPLA, João Lourenço, “consiga construir a ponte que permita a transição do discurso público para a efectividade do interesse da população e, em especial, da juventude”.

Em 2022, o MPLA aproveitou a celebração do Dia da sua Juventude (dizer que é da Juventude Angolana é uma ignomínia) para realizar uma “profunda reflexão e priorização” sobre as suas necessidades e preocupações, reconhecendo o seu papel “na edificação duma Angola mais desenvolvida, democrática e inclusiva”. Há 50 anos que o MPLA reflecte e há 50 anos que só piora a situação dos jovens… angolanos.

A declaração consta do comunicado final divulgado após a 3ª reunião extraordinária de uma coisa que se chama Secretariado do Bureau Político (BP) do Comité Central do MPLA (partido no poder há 50 anos) em que foram abordados assuntos da vida interna do partido e matérias da actualidade do país.

O Dia da Juventude Angola evoca a memória do nacionalista José Mendes de Carvalho “Hoji-ya-Henda”, jovem comandante do MPLA que morreu em combate em 1968, na aldeia de Caripande, província do Moxico, durante um assalto a uma base das tropas coloniais portuguesas.

A JMPLA enquanto mero instrumento canino do partido está, e tem razões para isso, preocupada com o comportamento que os jovens angolanos apresentam nos últimos tempos. Isto porque, ao contrário do que era habitual, a juventude começa a pensar pela própria cabeça, recusando a regra de ouro do regime que sempre visou formatá-la e domesticá-la.

Os meninos do regime ainda não atingiram a fase de pensarem livremente. Quando lá chegarem, se chegarem, só não vão zarpar do MPLA porque as balas e os jacarés estão prontos para satisfazer os ávidos apetites sanguinários dos que matam primeiro e perguntam depois. Quer os jovens autómatos do regime queiram ou não, nem todos os jovens concordam que o dia 14 de Abril, que consagra o dia da juventude do MPLA, em memória de Hoji Ya Henda, o patrono da JMPLA, seja igualmente considerado o Dia da Juventude angolana. É claro que o MPLA, tal como faz nos últimos 50 anos, continua a impor a lei de todas as leis e que estabelece que o MPLA é Angola e que Angola é do MPLA.

Será, com certeza, difícil ou até mesmo inexequível encontrar uma data que gere unanimidade. Em democracia o melhor que se consegue, quando se consegue, é um consenso. Encontrar, ou até mesmo criar de raiz, um dia que esteja equidistante das datas assinaladas pelos diferentes partidos seria, cremos, a melhor solução para homenagear todos os jovens angolanos que, de facto, merecem ter um dia que assinale o seu contributo em prol do país. O que é, pensamos, diferente de ser em prol do MPLA.

Desde a independência que Angola tem comemorado – com um enorme abuso de poder e unicidade só aceitável nos países de partido único – o 14 de Abril como o Dia da Juventude Angolana. Com a suposta, vacilante e morta à nascença abertura ao multipartidarismo teórico e académico, urge que se pense e actue com a abertura de espírito necessária para implantar um sistema político que albergue a diversidade de opiniões como uma mais-valia de incalculável valor patriótico.

Não é sério, muito menos legítimo e democrático, que se continue a subjugar toda a juventude, bem como todo o resto da população, às teses do partido reinante. De facto, a comemoração com toda a pompa e mordomias inerentes do 14 de Abril era (e poderá continuar a ser) aceitável como marco interno do MPLA e não como algo que possa representar toda a juventude de um país que, também nesta matéria, diz (não mais do que isso) pretender respeitar e enquadrar-se nas regras de um Estado de Direito, passada que tende a ser (mesmo perante a bélica posição do regime), embora à custa de prisões, torturas e assassinatos, a fase em que Angola é do MPLA e o MPLA é Angola.

Embora nem todos tenham consciência disso, o país é hoje outro, amanhã será ainda um outro, pelo que não pode haver receitas unilaterais feitas à medida, e por medida, de um regime que só conhece a razão da força.

Importa que o regime compreenda, embora a isso seja alérgico, que em democracia quem mais ordena é o Povo. E esse Povo não pode estar sujeito a regras que mais não são do que perpetuar o culto sabujo e bajulador a valores e pessoas que em vez de servirem o Povo se servem dele.

De facto, o Governo não tem tido vontade, embora tenha os meios, para resolver problemas do Povo, sejam eles da fome, da miséria, da água, da luz, do lixo, da saúde ou da educação da população em geral. No que tange à juventude, esta não tem casa, não tem educação (embora seja educada), não tem emprego e não tem futuro.

Por tudo isto, e não só, a juventude quer mais do que nunca ser ouvida e ter, para além de uma voz gritante e activa, possibilidade de dizer de sua justiça, de participar na vida do seu país. O regime ao obrigar os jovens a aceitar como única a lei do mais forte está a atirar a juventude para as margens da sociedade. E, muitas vezes, demasiadas vezes, quando se está na margem escorrega-se para a marginalidade como antecâmara da violência, da criminalidade ou até da guerra.

José Eduardo dos Santos disse a todos, mas sobretudo à juventude, que era preciso “honrar e declarar o nosso amor por Angola”. É verdade. João Lourenço está também de acordo. Mas isso não basta. E se os mais velhos fazem do silêncio a sua melhor arma, os jovens falam cada vez mais e, um pouco por todo o pais, vão dizendo que as crianças que mendigam e morrem à fome nas ruas de Luanda também amam Angola. Amam-na e declararam esse amor.

Rui Mingas dizia que, “nos antigamente”, os angolanos apenas tinham “peixe podre, fuba podre, 30 angolares e porrada se refilares”. E hoje, depois da independência e com mais de 20 anos de paz absoluta, o que dizem os jovens? Esses, que serão os líderes naturais de Angola, continuam a dizer que levam porrada, mesmo sem refilar, e nem peixe ou fuba podre têm.

É, por isso, urgente que o regime olhe a sério para a juventude no seu todo, não apenas para a JMPLA, mesmo para aquela que está fora do país, procurando potenciar os seus conhecimentos e corresponder aos seus anseios.

Ao contrário do que eventualmente podem pensar os dirigentes do regime, a juventude está atenta a tudo isto e é sobretudo isto que a preocupa. Nós temos jovens que, como nos ensinou Nelson Mandela, são heróis não porque não sintam medo, mas porque o vencem.

A propósito do Dia da Juventude Angolana (do MPLA), João Lourenço sustenta que este papel desempenhado pela juventude hoje constitui um “profundo orgulho pelas suas conquistas históricas e inabalável consciência nacional, cívica e patriótica”.

João Lourenço garante aos jovens que uma das bandeiras do Executivo que lidera é a liberdade e garantias fundamentais. “Entendemos, pois, que a liberdade gera oportunidades e, por via desta, são concretizados os sonhos mais sublimes da cada um de nós”, afirma o Presidente da Re(i)pública.

“Não sendo inteligente a eventual repetição dos erros do passado, é fundamental resgatar dos jovens de ontem a ideia de que a Pátria está acima de todos os interesses individuais e ANGOLA é centro de todas as nossas lutas”, diz o Presidente.

João Lourenço afirma que “a juventude angolana posiciona-se hoje como a legítima guardiã de todas as conquistas” por ter herdado a glória dos heróis nacionais.

“Por uma Angola exemplar, os nossos heróis internacionalizaram a luta pela liberdade e promoveram a solidariedade africana”, concluindo com um “Estamos juntos!!!.”

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