O secretário de Estado da Comunicação Social disse hoje que Angola está aberta ao diálogo com a sociedade civil, que foram realizadas 838 manifestações desde 2018 e que não há registo de perseguições a jornalistas. Nuno Caldas Albino “Carnaval” acha que somos todos matumbos, mas está enganado.
Por Orlando Castro (*)
Nuno Caldas Albino falava em Genebra, Suíça, perante o Grupo de Trabalho do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas para apresentar o relatório de Angola na 4.ª revisão periódica universal. Talvez a audiência seja daquelas que não quer saber o que, de facto, se passa ou sabendo o que se passa… se cala. No entanto, para nós (Folha 8) quem não quer saber o que se passa é imbecil, e sabendo o que se passa e se cala é criminoso.
O governante salientou que a liberdade de expressão e de imprensa estão consagradas na Constituição (documento que se subordina à lei superior dos interesses do MPLA), indicando que existe uma entidade independente, a ERCA, de regulação dos ‘media’ e que faz relatório regulares sobre a actividade do sector, estando registados na Comissão de Carteira Ética 3.275 jornalistas. A verdade diz-nos que a ERCA é uma mera e acéfala sucursal do MPLA, pelo que Nuno Caldas Albino deveria estar calado, muito caladinho.
Angola, sublinhou, “não tem registos de detenção de jornalistas ou de serem perseguidos por causa de se terem expressado livremente, e nenhum jornalista morreu no decurso da sua actividade profissional”. Provavelmente estava, a título de exemplo, a prestar homenagem ao Jornalista Ricardo de Mello, assassinado em Luanda, fez no passado dia 18 trinta anos.
Nuno Caldas Albino “Carnaval” destacou também aumento de meios de comunicação entre 2017 e 2024, existindo actualmente 33 jornais em papel ou digitais, 37 revistas, 36 publicações, 16 ‘sites’ de notícias, 23 estações rádio e dois canais televisivos.
Salientou, por outro lado, que a liberdade de reunião e de manifestação estão também salvaguardadas na Constituição, mas não – é claro – na prática da actuação das forças de segurança que, por regra, prendem (ou matam) primeiro e perguntam depois.
“Os cidadãos podem manifestar-se livremente desde que não violem os direitos de outros e que as manifestações sejam pacíficas e respeitem a ordem pública”, vincou o carnavalesco Nuno Caldas Albino para gáudio do seu chefe, o Presidente do MPLA, general João Lourenço.
A título de exemplo, contabilizou entre 2018 e 2024 um total de 838 manifestações organizadas por cidadãos, nas quais expressaram as suas opiniões e que foram “pacificamente supervisionadas pela Policia Nacional e outras entidades competentes”, com destaque para a província de Luanda.
“Quando há uso excessivo de força os agentes policiais são responsabilizados”, acrescentou Nuno Caldas Albino, dizendo que se registam também actos de vandalismo e violência contra a polícia, cujos autores são alvo de processos e julgados em tribunal. Julgamentos em que primeiro se lavra a sentença e só depois se processa o julgamento propriamente dito.
O responsável disse que houve também um aumento das organizações não-governamentais legalizadas, que passaram de 620 em 2020 para 1.158.
“Os direitos humanos estão protegidos pela lei e temos aumentado o diálogo e cooperação com a sociedade civil (…). Isto mostra que Angola tem uma atitude aberta ao diálogo”, sublinhou “Carnaval”.
No ano passado, Angola foi o único país africano de língua portuguesa que subiu no ‘ranking’ de liberdade de imprensa dos Repórteres sem Fronteiras, mas organizações como a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch têm denunciado aumento de restrições à liberdade de expressão. Mas disso o Nuno Caldas Albino não fala. Pudera!
O ministro da Justiça, presente na mesma reunião, adiantou que a grande maioria das recomendações apresentadas anteriormente foram ou estão a ser implementadas e frisou que a luta contra corrupção é uma das prioridades do executivo, dizendo que entre 2017 (tomada de posse do novo dono do reino, João Lourenço) e Setembro de 2022 foram abertos mais de 2.500 processos crimes por branqueamento de capitais, peculato, corrupção e outros crimes económicos financeiros, envolvendo detentores de cargos públicos, dos quais mais de 2.000 estão em investigação preliminar, 474 casos avançaram para julgamento e 40 condenações foram obtidas.
A Revisão Periódica Universal (RPU) é um mecanismo do Conselho dos Direitos do Homem que exige que cada Estado-membro das Nações Unidas se submeta (isto é como quem diz) a um exame pelos seus pares em matéria de direitos humanos de quatro em quatro anos e meio.
Em Março do ano passado, o mesmo Nuno Caldas Albino, afirmou, no Huambo, que a abordagem da governação participativa, iniciada em 2024, estava dentro das estratégias do Executivo de humanização da comunicação.
O que será isso de ”humanização da comunicação”? Será o que o Folha 8 faz, ou seja, dar voz a quem a não tem – o Povo?
O responsável, ex-ministro da Comunicação Social, fez esta afirmação durante a apresentação do “O Plano Nacional de Comunicação Nacional do Executivo” aos participantes do II Conselho Consultivo do Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social (MINTTICS) que decorreu na cidade do Huambo.
Nuno Caldas Albino referiu que a postura de proximidade com o cidadão e a governação inclusiva são ferramentas fundamentais para a humanização da comunicação, focada no melhoramento da imagem positiva do país (mesmo que seja mentira), nos domínios nacionais e internacionais, na perspectiva de contribuir para a construção de uma crença social mais confiante.
O secretário de Estado explicou que o Plano Nacional de Comunicação do Executivo foi constituído para dinamizar a divulgação dos factos e projectos de desenvolvimento do Governo angolano, tanto os de interesse social, como económicos, em tempo real, para permitir a desconstrução de qualquer situação de “fake news” a respeito do país.
Nuno Caldas Albino disse ser preciso, também, a utilização dos veículos comunicacionais alternativos, como as redes sociais, para impor a imagem real angolana, mesmo – mais uma vez – que seja uma monumental mentira.
Neste esforço, acrescentou, constituiu o Portal Angola Hoje e a TV digitalizados, então em fase de experimentação para contribuir na transmissão de informações oficiais do país, em tempo real, das acções do Executivo, bem como os planos estratégicos de desenvolvimento social e económico.
Nuno Caldas Albino disse ser necessário trabalhar numa narrativa interna e externa que permita o esclarecimento dos conteúdos de programas de desenvolvimento implementados pelo Governo angolano e, ao mesmo tempo, nos valores patrióticos e culturais, para a unificação do pensamento dos cidadãos angolanos residentes no país e na diáspora.
Adiantou o reforço das parcerias com os veículos comunicacionais internacionais, designadamente a Euronews, Africanews e a CNN (o maior canal televisivo americano, que se negou a vender a sua imagem ao MPLA) para a dinamização da imagem angolana na diáspora.
O evento, sob o lema “Conectar e Comunicar para a Cidadania”, sob orientação do titular da pasta, Mário Oliveira, contou com os secretários de Estado do MINTTICS, conselhos de Administração das empresas do sector, dos directores nacionais e directores gerais de instituições tuteladas, consultores, directores dos gabinetes de Comunicação Institucional, adidos de imprensa, directores dos gabinetes provinciais da Comunicação Social e associações parceiras.
NÃO ADIANTARÁ MATAR O MENSAGEIRO
O Presidente da República de Angola, general João Lourenço, assim como os seus auxiliares directos (Titular do Poder Executivo, Presidente do MPLA e Comandante-em-Chefe das Forças Armadas) ordenaram, e assim acontece há 50 anos, que os órgãos de comunicação social públicos (pagos por todos mas propriedade do MPLA), de que – como lhes ensinou a PIDE – devem censurar tudo o que não for visado pela respectiva comissão de censura.
De facto, Angola (com ou sem beija-mão do escravo negro ao patrão branco, como fez João Lourenço a Joe Biden) vive tempos de verdadeiros escândalos, de censura e de falta de acesso igual à informação, tudo questões que a Constituição (feita por brancos para deleite do negros matumbos) garante de forma absoluta.
A abordagem aos graves, gravíssimos, problemas dos angolanos está a fazer-se com o enquadramento da Comissão de Censura do MPLA. Os que o não fizerem são (ou deverão ser) abatidos. E, de acordo com o MPLA, abater não significa apenas “deitar abaixo; fazer cair; Inclinar para baixo”. Significa mesmo “causar morte violenta”.
Tal como pretende o general João Lourenço, através das suas diversas sucursais que cobrem toda a sociedade (sobretudo da polícia e tribunais) a ideia já não é fazer dos Jornalistas uma classe em vias de extinção, mas sim – em força e rapidamente – acabar com ela.
Em tempos, o Conselho Directivo da Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA) manifestou-se preocupado pela forma sistemática como alguns órgãos de comunicação social e Jornalistas (não jornaleiros) destratam os actores políticos, violando – diz a sucursal do MPLA – gravemente os seus direitos de personalidade, ou seja, violando o “jornalismo” patriótico que o MPLA exige.
Perante a incapacidade da ERCA em decapitar (cortar a cabeça) os Jornalistas, o dono do reino deixou cair a ERCA e passou a usar os seus peões (sipaios em linguagem mais angolana) para proceder a essa decapitação de forma mais eficiente mas, ao mesmo tempo, mais… legal. Ou seja, exarar primeiro a sentença condenatória e depois fazer um julgamento que justifique a sentença previamente determinada.
Com as atenções viradas para o clima político actual entre as diversas forças, que se prevê venha a tornar-se cada vez mais crispado, nos limites permitidos pelo regime democrático que não existe, o MPLA recomenda que os diferentes órgãos “tenham a melhor consideração, na sua actuação diária, pelo princípio da responsabilidade editorial efectiva e as suas consequências em caso de violação das normas que estão plasmadas nos diferentes diplomas que fazem parte do pacote legislativo da comunicação social, com destaque para a Lei de Imprensa”.
Atirando a pedra assassina mas escondendo a pata, o MPLA diz que não tem competência para interferir directamente na gestão editorial de cada órgão, nem sendo sua intenção, remetendo a sua sentença condenatória para os tribunais, locais onde os seus autómatos tratarão de tudo.
Esclarecimento prévio a alguns dos membros do MPLA, desde logo ao seu próprio Presidente. Servilismo significa propensão a obedecer como escravo, falta de dignidade, baixeza, subserviência. Informar, por exemplo, significa mostrar os hotéis de luxo de Luanda. Jornalismo significa, por exemplo, mostrar os angolanos a procurar comida no lixo (que é coisa que não falta).
Não tenhamos medo das palavras e das verdades. Um jornalismo mais sério, baseado no patriotismo, na ética e na deontologia profissional, é o que o general João Lourenço pretende para Angola. É uma tese adaptada do tempo de partido único, nascida nas técnicas hitlerianas e exemplarmente praticada, por exemplo, por Agostinho Neto, o único herói nacional de João Lourenço, quando mandou assassinar milhares de angolanos nos massacres de 27 de Maio de 1977.
O Governo, ou os tribunais, quer formatar o que a comunicação social diz. Esse era e continua a ser o diapasão do MPLA. Mesmo maquilhado, o MPLA não consegue separar o Jornalismo do comércio jornalístico.
Quem é o MPLA/Governo, o MPLA/João Lourenço, para nos vir dar lições do que é um “jornalismo mais sério, baseado no patriotismo, na ética e na deontologia profissional”?
Mas afinal, para além dos leitores, ouvintes e telespectadores, bem como dos eventuais órgãos da classe, quem é que define o que é “jornalismo sério”, quem é que avalia o “patriotismo” dos jornalistas, ou a sua ética e deontologia? Com outros protagonistas e roupagens diferentes, continuamos no tempo em que patriotismo, ética e deontologia eram sinónimos exclusivos de bajulação total ao MPLA.
Esta peregrina ideia de João Manuel Gonçalves Lourenço e dos seus mais formatados muchachos foi, aliás, categoricamente manifestada no dia 27 de Fevereiro de 2018, também na cidade do Huambo, na abertura de um seminário dirigido aos jornalistas das províncias do Huambo, Bié, Benguela, Cuanza Sul e Cuando Cubango.
Para alcançar tal desiderato, João Lourenço incumbiu Celso Malavoloneke (então secretário de Estado do sector e, reconheça-se, com muito mais estofo do que Nuno Caldas Albino) que desde logo informou que o Ministério da Comunicação Social iria prestar uma atenção especial na formação e qualificação dos jornalistas, para que estes estivessem aptos para corresponder às expectativas do Governo.
Como se vê o gato escondeu o rabo mas deixou o corpo todo de fora. Então o MPLA queria, quer e quererá sempre qualificar os jornalistas para que eles, atente-se, “estejam aptos para corresponder às expectativas do Governo”? Ou seja, deveriam ser formatados para serem não jornalistas mas meros propagandistas ao serviço do Governo, não defraudando as encomendas e as “ordens superiores” que devem veicular.
Celso Malavoloneke lembrou – e muito bem (as palavras voam mas os escritos são eternos) – que o Presidente da República, João Lourenço, no seu primeiro discurso de tomada de posse, orientou para que se prestasse uma atenção especial à Comunicação Social e aos jornalistas, para que, no decurso da sua actividade, pautassem a sua actividade pela ética, deontologia, verdade e patriotismo. E fez bem em lembrar.
Aos servidores públicos, segundo Celso Malavoleneke, o Chefe de Estado recomendou para estarem abertos e preparados para a crítica veiculada pelos órgãos de Comunicação Social, estabelecendo, deste modo, um novo paradigma sobre a forma de fazer jornalismo em Angola.
Sejam implementadas as teses do MPLA de João Lourenço, que são um pouco piores do que as anteriores, e os servidores públicos podem estar descansados que não haverá lugar a críticas da Comunicação Social.
Dar voz a quem a não tem? Isso é que era bom! Não é para isso que temos um Departamento de Informação e Propaganda do MPLA ou, na sua versão “soft”, uma Entidade Reguladora da Comunicação Social e, na versão prisional, os tribunais.
Por muito que o MPLA queira que os jornalistas (e não só eles, obviamente) do Folha 8 (que este ano assinala 30 anos de resistência) aceitem amputar a coluna vertebral, “transferir” o cérebro da cabeça para o local mais patriótico que o MPLA conhece (o intestino grosso) e arquivar a memória, não vai conseguir. Pode prender o mensageiro. Pode matar o mensageiro. Mas não conseguirá extinguir a mensagem porque esta é eterna e não prescreve.
Por cá, consideramos que os Jornalista que não procuram saber o que se passa são imbecis, e que os que sabem o que se passa e se calam são criminosos. E é por isso que – com a coluna vertebral e o cérebro nos locais certos – combatemos os imbecis e criminosos, sejam jornalistas, sipaios ou outros…