MÉDICOS PORTUGUESES DÃO FORMAÇÃO EM LUANDA

Quatro especialistas portugueses da Iniciativa Médica 3M (IM3M) vão dar formação em Luanda, em Angola, nas áreas da medicina da dor e dos cuidados paliativos, entre 22 de Fevereiro e 1 de Março, foi hoje anunciado.

A iniciativa surgiu a convite do Instituto Angolano de Controlo do Câncer e do Ministério da Saúde de Angola, vai abranger mais de 200 profissionais de saúde, assinala-se no comunicado do IM3M que desde 2021 desenvolve acções de voluntariado nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).

A primeira decorreu em 2021, em Moçambique, seguindo-se Cabo Verde em 2023 e 2024, refere-se na nota de imprensa.

Para além da formação básica nestas áreas, o grupo tem ainda o objectivo de fortalecer pontes entre as academias de Coimbra, Porto, Cabo Verde, Moçambique e de Angola para o desenvolvimento de formação avançada em cuidados paliativos e investigação multicêntrica.

Com este propósito, para além do curso de 30 horas de duração, estão previstas reuniões e tertúlias em que se debaterão alguns desafios e se promoverá a cooperação futura para a sua resolução, lê-se ainda.

O grupo é liderado pelo professor das faculdades de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) e do Porto (FMUP) e médico paliativista, Hugo Ribeiro, e inclui também o professor da FMUP e cirurgião vascular, João Rocha Neves, o médico de família, Leonardo Napoleão, e o anestesiologista, Paulo Roberto Ferreira, assinala-se.

Esta iniciativa tem a coordenação científica da professora da FMUC, Marília Dourado, coordenadora do mestrado em cuidados continuados e paliativos e da pós-graduação em medicina da dor desta faculdade, e directora do centro de estudos e desenvolvimento dos cuidados continuados e paliativos.

A cooperação luso-angolana em matéria de medicina tem vários bons exemplos.

Em Junho do ano passado foi notícia que o Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto (Portugal) estava a desenvolver uma vacina que pode vir a tratar vários tipos de cancro. A equipa espera que seja um complemento às terapias actuais e que possa prevenir o reaparecimento da doença. Lúcio Lara Santos, médico angolano, é coordenador de patologia e terapêutica experimental do IPO do Porto.

A presença de açúcares, os chamados glicanos, nas células tumorais foi o ponto de partida da investigação do IPO do Porto, que começou há mais de uma década.

“Avançamos para perceber quais eram as proteínas às quais estes açúcares estavam ligados, isto para tornar o mais especifico possível o nosso alvo (…) e percebemos que estes açúcares tinham um papel funcional, não estavam só lá, não eram só marcadores, eles eram promotores da doença”, explicou José Alexandre Ferreira, investigador IPO Porto.

Depois, a equipa procurou formas de atacar estes alvos. Criou uma estrutura molecular capaz de estimular o sistema imunitário e identificar as células doentes.

“Verificámos que, quando nós apresentamos esta molécula aos nossos linfócitos, eles apreendem como não sendo do próprio organismo e criam mecanismos de luta contra as células que têm essas moléculas. Este aspecto, que é a resposta imunitária, parece ser muito interessante”, disse Lúcio Lara Santos, coordenador patologia e terapêutica experimental do IPO do Porto.

O estudo começou em tumores da bexiga, estômago e colorrectal, mas a equipa acredita que a aplicação poderá vir a ser mais abrangente. A vacina poderá complementar as terapias já existentes, mas também evitar que a doença reapareça, um dos maiores desafios atuais quando se trata um cancro.

Decorrem, há dois anos, testes em animais e vão continuar até que as conclusões sejam robustas a ponto de se avançar para um ensaio clínico.

“Nós vamos ter de estudar isto muito bem, ter prova que há uma eficácia, por um lado, e por outro há especificidade e efeitos adversos que possam criar ainda mais problemas ao doente”, explica Lúcio Lara Santos.

O protótipo da vacina já está patenteado. Dentro de 5 anos, havendo financiamento, poderá vir a ser testada em doentes oncológicos.

Recorde-se que o primeiro medicamento oncológico português mostrou resultados significativos no ensaio clínico de prova de conceito e foi assim dado um passo assinalável no tratamento dos cancros da cabeça e pescoço, revelou em 4 de Janeiro de 2017 o responsável pelo ensaio.

O médico angolano Lúcio Lara Santos, do IPO do Porto, responsável pelo ensaio clínico do primeiro medicamento oncológico português, explicou na altura que este passo assinalável no tratamento dos cancros da cabeça e pescoço abria a possibilidade de tratamento para outros tumores sólidos.

A primeira fase do ensaio decorreu no Porto, no IPO, e no Hospital da CUF, com um grupo de doentes voluntários e com o objectivo de avaliar a segurança (tolerância) e o efeito anti-tumoral (eficácia) da Redaporfin, um fármaco fotossensibilizador produzido em Portugal que tinha demonstrado já uma grande eficácia em ensaios não clínicos em modelos animais.

“Verificámos que o tratamento com este medicamento de tumores malignos da cabeça e pescoço (espinocelulares) revelou elevada segurança, uma vez que os efeitos colaterais e adversos foram raros, não foram severos e revelaram-se de fácil controlo”, sublinhou o oncologista cirúrgico Lúcio Lara Santos.

O primeiro medicamento oncológico português começou a ser desenvolvido em Coimbra, a partir de 2010, pela empresa Luzitin, que nasceu a partir da Bluepharma, farmacêutica que produz medicamentos para mais de 100 marcas, exportando 85% da sua produção para 40 territórios, entre os mais exigentes do mercado.

Os ensaios clínicos tiveram início em 2014 em doentes para os quais já “não existiam soluções terapêuticas”, explicou Sérgio Simões, presidente da Luzitin.

“O ensaio foi realizado num grupo restrito de doentes, nos quais se registaram resultados muitíssimo interessantes e que provam que o medicamento é seguro e não desencadeia efeitos secundários severos”, frisou.

O presidente da Luzitin salientou ainda, na altura, que no ensaio clínico foi possível mudar a vida de alguns doentes que estavam em cuidados paliativos, impossibilitados de comer e falar, devido às características do tumor, e que após a terapêutica já conseguiam comer e falar.

Antes de chegar ao mercado, o medicamento passa por uma nova fase de ensaios com um grupo de doentes maior e depois, segundo Sérgio Simões, é necessário encontrar parceiros para financiarem o investimento para a sua produção.

O responsável farmacêutico disse ainda que a Redaporfin pode ser usado como tratamento do cancro das vias biliares, tumor muito raro, mas extremamente severo e sem terapêutica. O medicamento vai também ser candidatado à Agência Europeia do Medicamento com o estatuto de “medicamento órfão”.

“Chama-se medicamento órfão porque vai dar resposta a uma necessidade que não está colmatada. É uma mais-valia e vamos investir nesta área e utilizar as ‘vias-verdes’ para as doenças raras para dar um salto importante e fazer o medicamento chegar o mais rapidamente ao mercado”, sublinhou.

Sérgio Simões previa que, em 2020, o medicamento pudesse chegar ao mercado como terapêutica para os tumores das vias biliares.

Lúcio Lara Santos, por outro lado, adiantou que o “efeito antitumoral observado foi muito rápido, destruiu a totalidade do tumor tratado e que este efeito parece ser sustentado ao longo do tempo”, salientando que “a sua associação a outros tipos de tratamentos sistémicos parece ser também promissor”.

“Adicionalmente, a aplicação deste tratamento em doentes com outro tipo de tumores com prognóstico muito desfavorável, como o colangiocarcinoma, poderá conduzir a ganhos muito significativos para os doentes em termos de qualidade de vida e de sobrevivência”, acrescentou.

Perante os resultados obtidos, Lúcio Lara Santos considerou na altura que havia razões científicas para que a comunidade envolvida no estudo e tratamento destes tumores venha a integrar esta opção terapêutica no protocolo de tratamento destes tumores.

Segundo o especialista, posteriormente, seria conduzido um novo ensaio clínico num número de doentes mais alargado, “o que permitirá definitivamente demonstrar o valor e os benefícios da terapia fotodinâmica com Redaporfin em oncologia”.

Lúcio Lara Santos nasceu no Huambo a 01/09/1959. Fez o curso de Medicina em Angola. Desde cedo dedicou-se à cirurgia geral e em especial à oncologia. Dedica-se à investigação em oncologia e é docente de oncologia cirúrgica.

Recorde-se, entretanto, que o Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) português estava a apostar na criação de uma rede de telemedicina em Angola, abrangendo, para já sete hospitais, cinco deles provinciais, revelou no dia 13 de Abril de 2018 o coordenador do projecto.

Luís Velez Lapão, doutorado em Engenharia dos Sistemas de Saúde e especializado em Saúde Pública Internacional pela Universidade Nova de Lisboa, indicou que o “projecto-piloto” integrava, para já, hospitais em Luanda (Américo Boavida e Pediátrico David Bernardino), e em Cabinda, Bengo, Malanje, Lunda-Sul e Bié.

Segundo Luís Lapão, havia a intenção de se estender progressivamente o projecto a toda a Angola, estando na altura a aguardar pela análise do Ministério da Saúde angolano, face às alterações e mudanças políticas no país (eleições gerais de Agosto de 2017), de modo a participar na municipalização do sector.

No entanto, o projecto, uma colaboração do IHMT com a Universidade de Medicina de Genebra, já avançara e permitiu formar 107 médicos angolanos daqueles sete hospitais, através de mais de 70 cursos de capacitação, disponibilizados numa plataforma na internet, acessível a todos os profissionais de saúde.

“A ideia é apoiar a estratégia de Angola de municipalizar a Saúde, dar maior capacidade aos hospitais municipais e provinciais, para que tenham mais informação sobre saúde e possam colaborar com médicos dos hospitais centrais. E isso está já numa plataforma tecnológica”, frisou o coordenador do projecto.

“Vamos suportar esta rede, tecnologicamente, com um portal que permite a comunicação vídeo entre hospitais em duas áreas fundamentais, como a da formação e o serviço de segunda opinião, que passa por permitir aos médicos que estão nas zonas mais rurais colocar questões”, acrescentou.

Luís Lapão referiu, por outro lado, que estava em estudo também adicionar novos serviços, como o relacionado com a área dos exames médicos e de diagnóstico, salientando que, financeiramente, utilizará tecnologias “low cost”.

Segundo o coordenador do projecto, a medicina interna e a pediatria foram “as mais trabalhadas e são o grande foco”, mas o projecto também se alarga a todas as restantes especialidades, tendo também em conta a medicina tropical.

“A telemedicina é um novo canal de acesso, permite que as pessoas possam aceder à saúde à distância. Num país vasto, como Angola, melhor ainda. E, se bem organizada, pode reduzir custos”, disse, exemplificando as poupanças com o facto de, em muitas zonas rurais, se conseguir evitar deslocações de doentes e acompanhantes.

Questionado sobre se haveria interesse em estender o projecto a outros países de expressão lusófona, Luís Lapão lembrou que o IHMT já estava também em Cabo Verde e que Moçambique deveria ser o país seguinte, sendo essa a vontade saída da I Reunião de Telemedicina e Telessaúde da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), realizada entre 13 e 15 de Fevereiro de 2017, na cidade da Praia.

Para tal, foi criado um grupo técnico coordenador da telemedicina na CPLP, de que o IHMT é assessor científico, aprovado, depois, em Outubro do mesmo ano, na conferência de chefes de Estado e de Governo, em Brasília.

“A ideia é começar a criar um movimento para que este tipo de acesso à tecnologia possa chegar a mais população [Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste]”, acrescentou, salientando a importância dos telemóveis e dos “smartphones” no mundo.

“A evolução tecnológica e a telemedicina está a ser cada vez mais potenciada por telemóveis ou smartphones. A rede em África é muito significativa e há aqui uma oportunidade que pode ser aproveitada. Só que têm de haver esforços conjuntos relevantes dos ministérios da Saúde, dos hospitais, médicos, profissionais de saúde, mas também das universidades. Estamos a falar de inovação, de reorganização dos serviços para conseguirem integrar todos os serviços”, concluiu.

Estarão a brincar com a nossa chipala?

No dia 23 de Setembro de…. 2014, o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Pinto de Sousa, considerou, em Luanda, a saúde como um dos pilares “verdadeiramente autênticos” na promoção do desenvolvimento social e económico do país.

Carlos de Sousa que falava num dos painéis das X Jornadas Técnico-científicas da Fundação Eduardo dos Santos (FESA), frisou que a saúde deve ser encarada como um recurso social e pessoal na vida diária.

O bastonário lembrou que faziam parte das preocupações do Executivo diversos aspectos programáticos, presentes no Plano Nacional de Desenvolvimento da Saúde (PNDS), que visam promover a saúde colectiva, em especial das mulheres e crianças, com o aperfeiçoamento da rede sanitária, prevenção e luta contra as doenças infecciosas, emergentes e reemergentes.

“O conceito e a prática da saúde é uma forte determinante da municipalização, bem como um aspecto que vem sendo enfatizado pelo Ministério da Saúde (MINSA), no sentido de tornar mais operativo e consequentemente mais próximo dos cidadãos e da comunidade”, frisou.

Para Carlos Sousa, para assimilar e interiorizar a ideia de saúde, de acordo com a sua evolução positiva e o conteúdo da actividade dos médicos, é necessária a dimensão ética da actividade dos técnicos de saúde, credibilidade dos actos, técnica e a ciência.

Por isso, acrescentou o médico, a credibilidade dos actos de saúde resulta, essencialmente, da serenidade que se coloca no relacionamento dos profissionais com os doentes e famílias, entre os técnicos e estes com as instituições onde exercem o seu trabalho.

As X Jornadas Técnico-científicas da FESA abordam, entre outros temas, “Saúde em África e os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio”, “Perfil Epidemiológico da Saúde em Angola” e “As Tecnologias de Informação e Comunicação ao Serviço da Saúde Telemedicina”.

Participam do encontro deputados à Assembleia Nacional, Membros do Executivo, Médicos, Técnicos de Saúde, entre outros.

Recorde-se também que, por exemplo, no dia 16 de Setembro de…. 2015, realizou-se no Instituto de Higiene e Medicina Tropical, o seminário de apresentação da Rede de Telemedicina Angola – Portugal – HUG. Já a funcionar em Angola desde 2014, a rede internacional de colaboração de profissionais de saúde encontrava-se em processo de expansão um pouco por todo o país e contava com o apoio de médicos de língua portuguesa, “promovendo a discussão, educação e troca de conhecimento em matéria de saúde e de cuidados primários”.

O objectivo era que profissionais locais “possam aceder a formação contínua certificada, a informação técnica e ainda à partilha com um colega de experiência e conhecimento, sempre que necessário”.

Na sessão que se realizou em Lisboa, os convidados abordaram a importância e a dinâmica da telemedicina nos cuidados de saúde primários e a telemedicina no contexto da Medicina Tropical. Foi ainda apresentado o projecto RAFT (Rede Africa Francófona de Telemedicina) e as suas funcionalidades.

A Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar é uma das entidades que está envolvida na dinamização desta iniciativa, que reúne, igualmente, os esforços do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Associação para o Desenvolvimento da Medicina Tropical (ADMT), Unidade de Saúde Pública Internacional e Bioestatística – Centro colaborador da OMS para Políticas e Planeamento da Força de Trabalho em Saúde, Ministério da Saúde de Angola e Hospitais Universitários de Genebra (Hôpitaux Universitaires Genève – HUG).

Folha 8 com Lusa

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